Dúvidas e receios
Como qualquer cidadão consciente do que se está a passar um pouco por todo o mundo, preocupo-me e tento compreender. Por mais que estude, leia, ouça especialistas, ausculte amigos e conhecidos, continuo com a sensação de que… não consigo chegar às razões últimas do que se está a passar nos EUA e que está a afectar todo o mundo.
Não gosto de exprimir opiniões sobre aquilo de que não estou seguro. Este artigo é um mero desfilar de algumas dúvidas que tenho, na esperança de que, ao exprimi-las, fique com as ideias mais claras.
Recuso-me a pensar, como tenho ouvido por aí, que Trump, Musk e muita gente nos EUA perderam o juízo. Não tenho informação privilegiada, mas posso arriscar algumas hipóteses baseadas em acontecimentos actuais e antigos.
Donald Trump está a aplicar (dia sim, dia sim) tarifas com o objetivo expresso de proteger a economia dos Estados Unidos e incentivar o consumo de produtos nacionais. A lógica parece-me ser a de que, ao tornar os produtos importados mais caros, os consumidores americanos optariam por bens produzidos internamente, fortalecendo a indústria local. Além disso, Trump afirma repetidamente que outros países estavam a aproveitar-se dos EUA e quer reduzir o défice comercial.
A tarifas parecem ter uma razão económica, no entanto, há quem veja essas medidas como uma forma de Trump afirmar a sua autoridade e “vingar-se” de países que ele considera terem-se aproveitado dos EUA.
Há mesmo quem recorde que, em 1988, Trump tentou comprar o piano que aparece no filme “Casablanca” e que acabou por ser adquirido por uma empresa japonesa. Trump, nas televisões pediu, nessa altura, tarifas de 15 a 20% sobre produtos importados do Japão…
Há quem sugira, também, que o que ele pretende é criar situações que permitam aplicar o International Emergency Economic Powers Act (IEEPA), publicado a 28 de Outubro de 1977, uma lei federal que autoriza o presidente a regular o comércio internacional, após declarada uma emergência nacional em resposta a uma inusual e extraordinária ameaça que tenha origem, no todo ou em parte, fora dos EUA (que veio aperfeiçoar o Trading with the Enemy Act – TWEA, de 1917).
O IEEPA autoriza o presidente a bloquear transações e a congelar bens, para lidar com a ameaça.
No entanto, o IEEPA não lhe concede a capacidade de regular ou proibir comunicações que “não envolvam uma transferência de nada de valor”, importações ou exportações de informações ou quaisquer materiais informativos, ou transações incidentais a viagens e doações destinadas a aliviar o sofrimento humano, como alimentos, vestuário ou medicamentos.
Após os ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001, o presidente George W. Bush emitiu a Ordem Executiva 13224 ao abrigo da IEEPA para bloquear os ativos de organizações terroristas.
A juntar a isto, há a necessidade que Trump sente de limitar a influência da China e de “castigar” a União Europeia, que ele considera ter-se aproveitado, durante anos, dos EUA.
Já em 2020, Trump usou extensivamente a IEEPA, sancionando mais de 3.700 entidades e invocando 11 declarações de emergência nacional (das 13 que declarou no total, durante o seu mandato 2017-21). Trump também usou ou ameaçou usar os seus poderes de maneiras não convencionais e sem precedentes (incluindo acções executivas, utilizando poderes ao abrigo da lei, o que provocou desafios legais – por exemplo: remoção das plataformas sociais TikTok e WeChat das lojas EUA).
Alguns analistas dizem que muitas das medidas que Trump tem tomado, e outras que pretende pôr na prática, atentam contra a Primeira Emenda da Carta dos Direitos dos Estados Unidos ou Declaração dos Direitos dos Cidadãos dos Estados Unidos (United States Bill of Rights), que são as dez primeiras emendas à Constituição dos Estados Unidos, adoptada em 15 de Dezembro de 1791, que impedem o Congresso de: proibir o livre exercício da religião; limitar a liberdade de expressão; limitar a liberdade de imprensa; limitar o direito de livre associação pacífica; limitar o direito de fazer petições ao governo com o intuito de reparar agravos e estabelecer uma religião oficial ou dar preferência a uma dada religião.
Dizem, também, que o que o presidente pretende é beneficiar os amigos e prejudicar os inimigos.
Sejam quais forem as razões, o facto é que a política de tarifas que está a ser utilizada, a expulsão de migrantes e a limitação da liberdade de exprimir opiniões contrárias ao poder, para além de outros efeitos negativos, tem feito tremer a economia americana com a queda dos principais indicadores dos movimentos do mercado americano como o índice Dow Jones Industrial Average (DJIA), o Nasdaq Composite e o S&P 500. Para não falar das manifestações de protesto nas ruas das principais cidades do país.