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Isto é violência?

O confronto entre géneros é um denominador comum entre gerações. Para analisarmos a maneira como interagimos com o sexo oposto, é necessário termos presente que cada geração é singular na maneira que se expressa por força de transformações sociais, económicas e tecnológicas características de cada faixa etária. Não podemos, porém, dar por garantido que esta mudança seja sempre progressiva. A maneira como nos relacionamos, independentemente do grau de intimidade, é conduzida pela nossa perceção do papel que o outro tem de ter connosco. Num mundo que, neste momento, é influenciado pelas redes sociais, os conflitos entre o masculino e o feminino estão longe de um comungar saudável, talvez por consequência de uma identidade de género cada vez mais (in)definida.

O lançamento da série Adolescência teve um impacto tão contundente que nos confrontou com o papel que (in)conscientemente cada um de nós desempenha, independentemente da sua posição na árvore genealógica e do seu efeito. A série ilustra como os progenitores contemporâneos precisam urgentemente de descodificar a maneira como os seus descendentes se expressam, uma vez que a putrefação do espaço digital é tão profunda que está a intoxicar toda a geração Alpha (2010-2024).

Como característico, a polarização do ciberespaço é de tal ordem que nascem culturas radicais, mesmo entre os mais novos, como é o caso dos mais recentes Incels que representam os jovens mais inexpressivos que se sentem punidos pelo sexo oposto. Seguindo uma teoria que somente 20% dos homens são suficientemente atraentes para 80% das mulheres.

Esta cultura é representada maioritariamente por heterossexuais brancos, que se identificam como celibatários involuntários. Consequência da privação da própria sexualidade por uma injustiça social, perpetuando assim uma frustração machista, misógina e vil.

É precisamente neste cenário que Adolescência, enquanto peça de arte cinematográfica baseada em fatos, mostra como estigmas e tabus em torno da sexualidade e da saúde mental podem deixar marcas profundas numa comunidade inteira. Se este retrato parece distante da realidade portuguesa, importa lembrar que, por cá, também há sinais preocupantes de que algo não está bem: grupos no Telegram com mais de 70 mil homens a partilhar livremente fotografias íntimas de mulheres — incluindo ex-parceiras, colegas de trabalho ou amigas — sem qualquer tipo de consentimento destas. É assustador! Ainda na Academia, este mês, foi exposta uma tradição hedionda entre dirigentes associativos, que envergonhou toda a comunidade estudantil ao praticarem upskirting (ato de fotografar ou filmar a roupa interior de mulheres sem o seu consentimento). Este comportamento, já é crime em alguns países como na Inglaterra.

Felizmente e também em Portugal, surgiu a inspiradora Associação Não Partilhes, que atua junto dos jovens através da promoção da literacia sexual, oferecendo informação clara e acessível sobre como agir em casos de importunação sexual no digital. E, nesse espírito, contribui para a reflexão, dando voz a quem atua diretamente sobre estas realidades. A equipa do Peço a Palavra promoveu uma conversa com duas dirigentes associativas — unindo a sensibilização feminista da Womaniza-te com o trabalho de desenvolvimento pessoal promovido pela Aware In. O encontro, enriquecido por um painel com formação sólida na área da Psicologia, proporcionou uma discussão de elevada qualidade, marcada pelo compromisso de jovens que pedem a palavra com convicção, consciência e responsabilidade social.

O encontro surge no seguimento do projeto Isto é Violência?, iniciado em 2024 com o apoio do PRINT - Programa de Transformação e Inovação Social, da Direção Regional de Juventude. As próximas iniciativas estão disponíveis no portal portoseguro.amadeira.pt.