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Crónicas

O bom, o mau e os verdinhos

Nas eleições legislativas nacionais mais locais de sempre - os 3 maiores partidos têm cabeças de lista com carreira autárquica - os candidatos de PS e JPP arriscam-se a completar a santíssima trindade da política. Filipe Sousa e Emanuel Câmara preparam-se para, simultaneamente, estarem eleitos para três cargos diferentes. Presidentes de Câmara de manhã, deputados à Assembleia Legislativa da Madeira à tarde e, a repetir-se a última votação, deputados à Assembleia da República em part-time. Quem disse que não se pode estar em três lugares ao mesmo tempo?

O bom: Cristina Pedra

Passados quatro anos de governação do Funchal, há factos ocorridos no consulado socialista que o tempo ajudou a esquecer. Não se trata de um ajuste de contas político, mas apenas a leve lembrança do que mudou na gestão da cidade desde 2020. A esse propósito, a semana passada foi um bálsamo para a memória dos mais esquecidos. O Expresso apontou o Funchal como a única capital no país que devolve aos munícipes a totalidade do IRS recebido do Estado. Nos últimos 4 anos, fruto dessa opção municipal, os funchalenses receberam mais de 23 milhões de euros. Nem sempre foi assim. Aliás, basta recuar ao último ano da gestão socialista no Funchal, para recordar que a Câmara escolheu nada devolver aos seus munícipes. Também a semana passada, este Diário deu nota que a empresa municipal Frente Mar Funchal atingiu o seu melhor ano de sempre. Não só aumentou a faturação, como levou a cabo uma histórica distribuição de dividendos ao seu acionista - a Câmara do Funchal. Parece inacreditável que, em 2020, a mesma empresa municipal - que agora dá lucro - tenha sido condenada, pela vereação socialista, à insustentabilidade financeira e ao encerramento envergonhado. Se compararmos uma Câmara que hoje impõe a menor carga fiscal de sempre aos funchalenses, a uma Câmara cujo único recorde foi ter dois orçamentos chumbados por toda a oposição, percebemos que a diferença é evidente. Talvez seja nesse contraste que se vê o fio condutor da liderança de Cristina Pedra - pouco preocupada em proclamar grandezas, mas decidida a entregar, com eficácia discreta, resultados que falam por si.

O mau: José Sócrates

Esta crónica não é sobre José Sócrates. É sobre como, 11 anos após a sua queda, o príncipe negro do PS continua a ter lugar na política portuguesa. Curiosamente, isso diz mais sobre os atuais protagonistas do que sobre o antigo primeiro-ministro português. Enquanto Sócrates se transformou numa caricatura do animal político que foi, alguns partidos quiseram transformá-lo na figura central de uma campanha eleitoral que parece, cada vez mais, um exercício conjunto de enterro da cabeça na areia. O Chega, porventura inspirado no PS Madeira, juntou Montenegro e Sócrates num cartaz e acrescentou-lhe a frase “50 anos de corrupção”. O PSD, após indignar-se com a brejeirice de Ventura, juntou-se à tentativa de ressurreição de Sócrates. Com mais recato, é certo, mas é incompreensível que depois de se ter queixado do cartaz do Chega, Montenegro se tenha lembrado de comparar Pedro Nuno Santos a José Sócrates. Até porque, com essa comparação, validou a utilização de Sócrates como argumento político. Já o PS agradece, pois pode continuar a fazer de conta que Sócrates não existe. Ainda nem começou a campanha e a distância entre o país e a política parece já irrecuperável. Enquanto o devaneio tarifário de Trump faz adivinhar uma guerra comercial imprevisível e uma nova ordem mundial, nós, por cá, andamos entretidos a discutir José Sócrates e se os ovos e o arroz pagam IVA. Daqui a uns anos julgaremos esta campanha não pelo ruído produzido, mas pelo silêncio preocupante sobre o que realmente importa.

Os verdinhos: Juntos pelo Povo

Comecemos pelo óbvio: depois do PSD, o JPP foi o vencedor da última noite eleitoral. Fez crescer o seu grupo parlamentar, em Santa Cruz infligiu as únicas derrotas ao PSD, ultrapassou o PS como maior partido da oposição e, no Funchal, foi o segundo partido mais votado. Se, em 2023, o JPP tinha deixado de ser um fenómeno local, em 2025, assumiu-se como o principal adversário político do PSD. O voto apenas confirmou o que a atividade política e parlamentar há muito sugeria. De mansinho e com um discurso beato, o JPP ocupou o vazio deixado por Cafôfo e afundou o PS. Não é a primeira vez que isso acontece. Em 2011 e 2015, os socialistas já tinham sido ultrapassados pelo CDS, como segundo partido mais votado. No entanto, é a primeira vez que essa ultrapassagem acontece em ano de eleições autárquicas. Será nessa eleição, e nas respetivas coligações partidárias, que veremos as verdadeiras consequências da nova distribuição de forças entre os partidos. A começar pelo Funchal. Não é por acaso que Élvio Sousa já se posicionou como o próximo presidente da estrutura concelhia do JPP no Funchal. Até arriscando o ridículo de acumular, numa só pessoa, a liderança do partido, do grupo parlamentar e de uma concelhia. Fê-lo porque sabe que se o PS quiser disputar a Câmara Municipal, precisa do Juntos pelo Povo. E se, em 2017, no Funchal, o nó entre PS e JPP atou-se com um deputado municipal eleito, em 2025, será pago a peso de ouro. Resta saber se o JPP tem maturidade política suficiente para o seu novo estatuto ou se, apesar da cor que veste, ainda estará verdinho para o poder que ambiciona.