As viúvas dos antigos combatentes têm direito à comparticipação nos medicamentos?
Em vigor desde o dia 1 de Setembro de 2020, o Estatuto do Antigo Combatente consagra na lei o reconhecimento do Estado português relativamente aos serviços prestados pelos militares, assim como a dívida de gratidão que o país tem para com eles, mantendo ao mesmo tempo a janela aberta para as gerações presentes e futuras que passem mais tarde a essa condição.
Através deste estatuto estão estabelecidos um conjunto de direitos e deveres dirigidos tanto aos que serviram Portugal, assim como uma série de apoios extensíveis às respectivas famílias, nomeadamente as viúvas e/ou viúvos.
Entre os vários benefícios a que os antigos combatentes têm acesso, está a comparticipação nos medicamentos.
Carolina Rodrigues , 22 Janeiro 2025 - 16:40
Ao DIÁRIO, um ex-combatente entende que o aditamento ao artigo 16.º do Estatuto do Antigo Combatente, aprovado em anexo à Lei n.º 46/2020, de 20 de Agosto, onde são atribuídos os benefícios adicionais de saúde aos antigos combatentes, é “ambígua” porque não refere se as viúvas têm ou não acesso à comparticipação dos medicamentos.
Face esta situação diz ter questionado a Presidência da República, assim como diversos partidos nacionais sobre a necessidade de esclarecimentos.
Segundo o ex-combatente, o aditado (artigo 16.º -A) por Decreto-Lei n.º61/2024 de 30 de Setembro de 2024, deveria esclarecer sobre a abrangência das viúvas e/ou viúvos. Pois, no seu entender, o artigo 16.º, que aborda a isenção de taxas moderadoras, abrange os antigos combatentes e as viúvas ou viúvos dos antigos combatentes e, por consequente, no aditamento deveriam estar também incluídas.
O que diz a lei? Será que as viúvas dos antigos combatentes têm direito à comparticipação dos medicamentos?
Antes de seguirmos para o aditamento do artigo 16.º -A, é necessário entender que o Estatuto do Antigo Combatentes nasceu de uma iniciativa do XXII Governo, que teve como primeiro-ministro António Costa, colheu contributos de associações, dos vários partidos com assento parlamentar e acabou por reunir um amplo consenso na Assembleia da República, em torno da dignificação e valorização dos antigos combatentes, relevando também a dimensão solidária para com os veteranos.
O ‘Cartão de Antigo Combatente’ e o ‘Cartão de Viúva/o de Antigo Combatente’ garantem o acesso aos direitos previstos no então Estatuto do Antigo Combatente, aprovado pela Lei n.º 46/2020, de 20 de Agosto.
Os cartões são emitidos pela Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional (DGRDN), sob a tutela do Ministério da Defesa Nacional.
Na página on-line da República Portuguesa é explicado que estes cartões são “vitalícios, pessoais e intransmissíveis, mas não substituem o cartão de cidadão nem o bilhete de identidade civil ou militar, e são atribuídos aos Antigos Combatentes referidos no artigo 2.º do Estatuto do Antigo Combatente e ao cônjuge sobrevivo do Antigo Combatente ou à pessoa que residisse em união de facto, judicialmente reconhecida, com o Antigo Combatente à data da sua morte, atento o disposto no artigo 7.º do referido estatuto.”
Quem são considerados antigos combatentes?
O artigo 2.º da Lei n.º46/2020 entende que são considerados antigos combatentes para efeitos do Estatuto:
a) Os ex -militares mobilizados, entre 1961 e 1975, para os territórios de Angola, Guiné -Bissau e Moçambique;
b) Os ex -militares que se encontravam em Goa, Damão, Diu, bem como em Dadra e Nagar--Aveli, aquando da integração destes territórios na União Indiana;
c) Os ex -militares que se encontravam no território de Timor -Leste entre o dia 25 de abril de 1974 e a saída das Forças Armadas portuguesas desse território;
d) Os ex -militares oriundos do recrutamento local que se encontrem abrangidos pelo disposto nas alíneas anteriores;
e) Os militares dos quadros permanentes abrangidos por qualquer uma das situações previstas nas alíneas a) a c).
2 - São ainda considerados antigos combatentes os militares e ex-militares que tenham participado em missões humanitárias de apoio à paz ou à manutenção da ordem pública em teatros de operação classificados, nos termos da Portaria n.º 87/99, de 28 de janeiro, publicada no Diário da República, 2.ª série, n.º 23, de 28 de janeiro de 1999.
3 - O Estatuto aplica-se apenas aos deficientes das Forças Armadas que estejam incluídos no âmbito dos números anteriores.
4 - O Estatuto não prejudica a natureza e as necessidades específicas dos deficientes das Forças Armadas, nem exclui a possibilidade de adotarem um estatuto próprio, tendo em conta o regime legal específico que lhes é aplicável.
5 - As disposições previstas no presente Estatuto aplicam-se ainda às viúvas e viúvos dos antigos combatentes identificados no n.º 1 do presente artigo naquilo que, estritamente, lhes for aplicável.
Cartão de viúva ou viúvo de antigo combatente
Já o artigo 7.º, da mesma lei, refere que para o cartão de viúva ou viúvo de antigo combatente abrange:
1 — A todas as viúvas ou viúvos de antigos combatentes, identificados no artigo 2.º, é emitido um cartão de viúva ou viúvo de antigo combatente, que simplifica o relacionamento com a Administração Pública.
2 — Para efeitos do disposto no presente diploma, consideram -se viúvas ou viúvos as pessoas com quem a/o antigo combatente esteja casado ou viva em união de facto, judicialmente reconhecida nos termos da lei civil, no momento da sua morte.
3 — A DGRDN é a entidade competente para proceder à emissão dos cartões de viúva ou viúvo de antigo combatente.
4 — Para efeitos de simplificação administrativa no acto da emissão do cartão de viúva ou viúvo, as entidades processadoras das pensões comunicam a condição de cônjuge sobrevivo à DGRDN.
5 — O cartão de viúva ou viúvo de antigo combatente é pessoal e intransmissível e não substitui o cartão de cidadão.
6 — O cartão de viúva ou viúvo de antigo combatente é vitalício.
7 — O modelo de cartão de viúva ou viúvo de antigo combatente é aprovado por portaria do membro de Governo responsável pela área da defesa nacional.
O cônjuge do antigo combatente ou pessoa que consigo residisse em união de facto à data da sua morte tem direito ao ‘Cartão de Viúva/o’.
Assim como o cartão de Antigo Combatente, cabe à Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional a emissão do cartão de identificação de viúva ou viúvo de Antigo Combatente.
Portaria n.º 372-C/2024/1, de 31 de Dezembro
A Portaria n.º 372-C/2024/1, de 31 de Dezembro estabelece as condições de acesso dos antigos combatentes aos benefícios adicionais de saúde previstos no artigo 16.º-A do Estatuto do Antigo Combatente e define a operacionalização do respectivo procedimento.
Vejamos agora o que diz o aditamento 16.º -A:
Tento em conta que o artigo refere-se apenas aos antigos combatentes, sem qualquer menção às respectivas viúvas e tendo em atenção ao número 5 do artigo 2.º da Lei n.º46/2020, que esclarece que as disposições no Estatuto aplicam-se às viúvas(os) “naquilo que, estritamente, lhes for aplicável”, verifica-se que estas comparticipações estão destinadas apenas aos antigos combatentes.
O DIÁRIO contactou a Liga dos Combatentes a nível nacional, sobre esta situação que confirmou, igualmente, que a respectivo aditamento à lei destina-se “somente aos antigos combatentes e não às respectivas viúvas”.