Milho estraçoado
É o que se dá habitualmente como alimento às galinhas…
Estraçoado quer dizer desfeito, feito em pedaços, quebrado, feito num oito, estragado na beleza com que veio ao mundo em grandes campos a perder de vista e que serve também para fazer farinha
(fazer farinha é uma expressão muito utilizada quando nos queremos referir a uma qualquer situação que não ata nem desata porque alguém “faz farinha”, isto é, alguém preguiça naquilo que deve fazer com celeridade, como, por exemplo, na coisa pública!)
daquela que nós madeirenses bem conhecemos, mas que quando estraçoado serve para galinhas, aqueles simpáticos animais que têm aquela mania irritante de atravessar estradas quando não devem, a correr para uma lado e que, em chegando ao outro lado, voltam para trás só para ver se conseguem ser atropeladas; normalmente não o são ou porque a estrada tem pouco movimento ou porque os condutores são mais avisados do que elas galinhas pensam e passam ao lado sem chegarem às penas que vão esvoaçando ao sabor do vento que a viatura provocou “en passant”, assim em franciú para parecer um pouco mais internacional.
As galinhas, que como sabemos não primam por uma grande inteligência, contentam-se então com aqueles restos de milho já estraçoado.
Isto porque o primeiro milho foi para os pardais (abro aqui um parentese para referir que “o primeiro milho é para os pardais” refere-se a uma noção de que os mais inexperientes são os primeiros a aproveitar as vantagens iniciais, mesmo quando não sejam as melhores ou mais decisivas, deixando a sugestão de que no início as falhas são normais e que é necessária persistência para alcançar o sucesso fecho parentese), que, por se julgarem mais espertos, jogam-se àqueles bagos como gato a bofe. Uns bagos amarelos em forma de coração, suculentos e bons de sabor, que comemos ainda na espiga, nos arraiais mais tradicionais da nossa terrinha, cozidas ou assadas, lambuzando-nos na manteiga a escorrer queixo abaixo e braço acima deixando um rasto de gordura que perdura até bem ao fim do arraial, na altura de se meter a caminho para o vale dos lençóis (ou para a “pensão estrela”) quando as primeiras claridades do fim da madrugada e início da manhã fazem anunciar o Sol quase a despontar a dizer que o dia espera por nós, sorrindo à ressaca que o pouco juízo traz normalmente consigo para os heróis das noitadas, aqueles que se conhecem no dia seguinte e que não sendo os pardais do dito popular, apoiam-se num outro adágio que diz que mordidela de cão cura-se com pelo do mesmo cão e emborcam mais uma cervejola antes de caírem nos braços de Morfeu (quem não…)!
O primeiro milho dos pardais e o milho estraçoado das galinhas fazem-me lembrar o que se vai passando hoje, na sociedade de consumo de pretensos auto proclamados influençadores em que se transformou, qual moda que se propagou como fogo incontrolado sob a forma de publicações, sem qualquer tipo de controlo, que foram aparecendo nas famosas redes sociais primeiro publicadas por algumas pessoas ditas famosas que partilham as suas vidas com os pardais desta vida que avidamente comem e bebem essas aventuras e desventuras – mais desventuras do que aventuras porque o sórdido vende mais do que o agradável, deixando para as galinhas o que restava do milho, que entretanto foi sendo estraçoado e aproveitado por uma série de tansos (válido para os dois géneros principais) que sem terem mais nada que fazer se entretêm a contar tudo desde a vontade de fazer xixi a meio do dia até à procura que fazem de uma alma gémea que teimam em não querer encontrar porque quanto mais estraçoam o milho, mais podem espalhar para o exército de galináceos que desesperam por uma aventura qual galinha a atravessar estrada para a frente e para trás, mesmo que seja imaginária essa aventura, porque o cérebro que ocupa as suas caixas cranianas não é maior do que o grão que deu origem ao alimento que lhes deitam.
Não têm culpa, nem os pardais nem as galinhas, pois foi assim que a evolução de Darwin as desenhou (ia dizer que foi assim que Deus as criou, mas segui o politicamente correcto aceitável hoje em dia), mas têm culpa os humanos que têm involuído mentalmente ao nível de galinhas e pardais e que se deixam levar por uns quantos tansos que se aproveitam da ingenuidade natural (pardais e galinhas são tidos por serem animais ingénuos) de outros tantos, não para influenciar mas sim para ganhar largos trocos a troco de uma exposição pessoal da sordidez a que podem chegar sem se sentirem beliscados pela opinião das aves que os seguem.
O que há de gente hoje em dia a jogar milho para os pardais desta vida é coisa que não falta:
ele são os auto intitulados influençadores que primeiro experimentam com os pardais para depois virem os poderosos estraçoar o milho para jogar às galinhas seguidoras,
ele são os ditos poderosos do mundo que proclamam a razão (milho aos pardais) quando não a têm e que à força querem fazer valer a razão que não têm (milho estraçoado para as galinhas)
ele são, nesta época de eleições, agora locais, de todos os quadrantes políticos, os “players” (em inglês para ficar bonito) que prometem tudo e mais alguma coisa acerca de alguma coisa e de tudo – milho aos pardais, mas que depois de eleitos (os que o são), apressam-se a esquecer o que prometeram e passam a proclamar que só fazem o que a situação lhes deixa fazer (fossem honestos e não tivessem prometido) – milho estraçoado!
Seja estraçoado ou seja o que aproveitam os pardais, o que deveríamos fazer era ensinar a todos os acima referidos e a tantos outros seus iguais, que nós o milho comemo-lo cozido em papa a fumegar, com ou sem couve incluída, com bife de atum, com espada, sem mais nada ou, depois de frio, cortado em cubos e frito, para acompanhar entre outras coias uma boa espetada empurrados por um copo de bom vinho seco, e que não precisamos de ser influenciados por ninguém para apreciarmos o que é bem nosso!
Nota: está escrita acima a palavra influençadores para os diferenciar dos verdadeiros influenciadores, que são aquelas pessoas que por obras valerosas se vão da lei da morte libertando (Camões dixit), e porque não quis utilizar o termo estrangeiro com que esses tansos se gostam de auto intitular.