Fragmentação
Os resultados das eleições autárquicas demonstram o exagero daqueles que declaram quotidianamente a morte do Partido Socialista. Contudo, se é certo que se demonstrou uma certa fanfarronice de alguns partidos populistas, torna-se também evidente um fenómeno de fragmentação, sobre o qual importa refletir.
Na região esse quadro é particularmente relevante, uma vez que neste ciclo eleitoral podemos verificar sucessivas alterações nas preferências dos eleitores em termos de segundo maior partido. Esta oscilação traduz diferentes assimilações do voto de protesto em partidos populistas. Contudo, mais importante, é realçar a forma como esse destino possui consequências sérias sobre a governabilidade e, mais importante ainda, sobre a capacidade de se instituir (finalmente) a alternância democrática na região.
Não se trata apenas de contabilidades eleitorais. É algo mais profundo, que trata de consistência programática e fiabilidade. Para evitar parecer demasiado críptico, passo a exemplos concretos. Começo pelo recente debate mensal dedicado ao tema da Habitação. Nele foi possível ver a diferença do JPP dentro e fora de campanha. É que se em campanha eleitoral foi fácil acenar com 500 casas, no quotidiano da legislatura isso rapidamente se esfuma. Ao invés, as deputadas Marta Freitas e Isabel Garcês do PS-M souberam demonstrar a paternidade do PRR, como ele se articula com políticas sociais bem estruturadas e deram ainda voz às angústias que os madeirenses nos têm transmitido, não só em termos dos valores do mercado habitacional, mas também da falta de transparência na atribuição dos apoios.
Os problemas de consistência e fiabilidade tornam-se ainda mais evidentes nas diversas geometrias de votação das assembleias de freguesia. Sendo que aqui o caso é agravado pelo claro oportunismo que é oferecido pelo populismo. É que uma coisa é um marco ideológico claro à esquerda ou à direita, que obriga a que as cedências do centro tenham de ser estabelecidas sobre contrapartidas ideologicamente claras (por exemplo, as condições laborais à esquerda, ou as políticas de nacionalidade à direita). Ao invés, quando se parte da invocação incerta do povo, tudo passa a valer, mais ainda quando tratamos de pessoas que ideologicamente são do PSD-M, mas que aproveitaram a oportunidade para saltar para um outro partido, para prosseguir o seu projeto pessoal por outros meios.
O tempo irá ajudar a demonstrar que não existem dois ou três caminhos para o projeto conservador-popular (que se refere a si próprio como autonomista). Ele parte e tem como destino o mesmo objetivo, que a Maria da Fonte ajuda a perceber muito bem. O problema maior é a forma como a fragmentação populista pode impedir a construção de uma verdadeira alternativa progressista-social-democrata.