Educar é um ato político
Só uma geração criada com vínculos seguros e valores humanistas poderá travar o avanço das extremas e reconstruir a humanidade
“Peço-vos que confiem em mim.”
Princesa Leonor de Bourbon y Ortiz
Há frases que marcam uma geração. Esta, dita por uma jovem de 19 anos, ecoou como um pedido e, ao mesmo tempo, como um compromisso. Foi há um ano.
Agora, no palco dos Prémios Princesa das Astúrias, Leonor dirigiu-se não só aos seus compatriotas, mas a todos nós, adultos, muitas vezes céticos ou distraídos, que esquecemos como é poderosa e essencial a esperança quando somos jovens.
Com o humor que caracteriza a juventude, brincou com a sua idade e gerações, afirmando: “Ainda sendo da geração Z e filha de uma X e de um Boomer”. Falou de convivência, de esforço coletivo, de responsabilidade e de futuro.
“A educação é o que pode transformar sociedades, consolidar a democracia e promover o respeito pelos direitos humanos”, disse, com uma clareza que raramente se ouve em vozes tão jovens. E acrescentou: “Posso, porque penso que posso.”
Palavras que encerram uma revolução consciente e silenciosa, a de quem acredita que pensar e agir são atos inseparáveis.
Com leveza, cúmplice da irmã, a Infanta Sofia, mencionou também a importância da irmandade: “As irmãs cúmplices são nossas companheiras de viagem”, mostrando o que realmente importa: o poder, sem afeto, não cria raízes. Antes de se despedir lançou um desejo que ficou a ecoar no ar: “Oxalá todos encontremos motivos e oportunidades, e compremos bilhetes para o comboio da esperança.” Foi nesse instante que a princesa deixou de ser apenas símbolo e se tornou espelho: de juventude, de humanidade e de vínculo. Porque é isso que a torna diferente, a consciência de que representar não é exibir, é servir.
Recentemente, na Fnac Talk “Temos Voz”, Madalena Aleluia, uma menina de 12 anos, apelava aos adultos para escutarem as crianças. Há mais exemplos.
E enquanto estas jovens falam em palcos luminosos, há outros jovens, da mesma idade, a falar no escuro.
Não têm microfone, mas têm voz.
Não têm coroas, mas têm sonhos.
Estão nas periferias, nos bairros onde o talento se mistura com a sobrevivência. Acordam cedo para estudar, para trabalhar, para cuidar de irmãos mais novos. Assumem um lugar na família que sistemicamente não lhes pertence, mas que é o único garante de sobrevivência.
Carregam o mesmo desejo de futuro, só que sem rede, sem palco e, muitas vezes, sem quem os escute e acolha. É aí que nós, adultos, falhamos tantas vezes.
Queremos que os jovens sejam o futuro, e esquecemo-nos de ser o presente que eles precisam. Ensinamo-los a adaptar-se, a aguentar, a competir, quando o que devíamos era ensinar-lhes a confiar, a sentir, a acreditar que são amados por quem são, mesmo quando falham. Porque a esperança não se alimenta de aplausos, mas de vínculos. Seguros.
Recordo-me bem dos meus 16 anos. Com amigos, criamos a primeira associação ambientalista de Cascais. Éramos adolescentes inquietos, alunos de colégios católicos, sim, mas também jovens que conviviam, todos os dias, com realidades bem diferentes, sobretudo através do voluntariado. Íamos onde era preciso ir, com a vontade de ser e fazer a diferença e a coragem ingénua de quem ainda acredita que pode mudar definitivamente o mundo.
Conscientes de que o privilégio, do sítio onde nascemos, da nossa cor, da estabilidade familiar, dos vínculos seguros, da condição financeira da maioria, não era culpa, era responsabilidade. E isso vinha de casa, do exemplo dos nossos pais e dos nossos avós, que nos ensinaram a olhar para fora de nós e a agir desde o coração, alinhados com a razão.
Começámos também a trabalhar aos 16. Nos longos verões, éramos monitores de campos de férias, ajudávamos em recepções e em pequenos trabalhos. Fazíamo-lo não por necessidade, mas por escolha. Porque queríamos sentir-nos úteis, mais crescidos, mais competentes. Era a nossa forma de dizer: estamos prontos, participamos, contribuímos, aprendemos o valor real das coisas.
Esses valores são os mesmos que vejo refletidos hoje na jovem princesa que pede confiança e fala de convivência. Valores que não pertencem a uma linhagem, mas a uma consciência. E que também habitam os jovens que sem sobrenomes ilustres têm o mesmo brilho nos olhos.
A esperança, quando é verdadeira, nunca é exclusiva. Está no teatro de Oviedo, nas ruas de Chelas, na Cova da Moura, na Nazaré, em Santo Amaro… em qualquer canto onde um jovem escolha não desistir.
Está na rapariga que sonha ser astronauta, no rapaz que escreve versos, no adolescente que ajuda a mãe a criar os irmãos e ainda assim vai à escola, joga futebol e leva dinheiro para casa. A diferença entre eles e uma princesa não é o valor, é o contexto. E o contexto é a nossa responsabilidade.
Quando vemos Leonor serena e inspiradora, olhemos para além da coroa: que ela simbolize um mundo onde os jovens são preparados para ser e servir, e não apenas para aparecer. E saibamos reconhecer também os outros, os invisíveis, os sem palco, acolhendo-os com o mesmo respeito e dignidade, em vez de os rotular como difíceis, de os empurrar para as turmas da tarde e lhes retirar oportunidades.
O futuro não é deles apenas: é nosso, na medida em que os escutamos, apoiamos e acreditamos neles.
Se forem educados com presença, escuta, amor e empatia, crescerão menos vulneráveis e poderão, eles próprios, travar os ímpetos das extremas políticas. Porque quem cresce a sentir-se visto e amado dificilmente se deixará seduzir pelo discurso do ódio, da divisão e do medo.
É na raiz emocional que se previne o extremismo, não na retórica.
Hoje, a esperança tem 12 anos, tem 19 anos e convida-nos a caminhar com ela. Por um mundo melhor!