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Fact Check Madeira

Será que já se fala há mais de 20 anos numa linha de Metro para o Funchal?

A criação de uma linha de Metro no Funchal é uma proposta que tem alguns anos, mas que só foi concretizada numa ilustração gráfica para o Dia das Petas de 2024, da autoria de David Sousa e publicada no Facebook.
A criação de uma linha de Metro no Funchal é uma proposta que tem alguns anos, mas que só foi concretizada numa ilustração gráfica para o Dia das Petas de 2024, da autoria de David Sousa e publicada no Facebook.

A engenheira Paula Teles defendeu, ontem, na conferência sobre "Território e Mobilidade Urbana", promovida pelas ordens dos Engenheiros e dos Arquitectos e pela ACIF, que “a Madeira tem que pensar rapidamente em unir o centro da cidade do Funchal aos principais aglomerados urbanos (…) com navetes ou com Metro”. A notícia foi destacada pela RTP-Madeira no Facebook e abriu um debate sobre o assunto, com dezenas de comentários sobre a viabilidade destas e de outras soluções. O ex-vereador da CMF Edgar Marques Silva (coligação ‘Mudança’) alertou que “estes especialistas de fora vêm para aqui com sugestões das quais já se fala há mais de 20 anos”. Será mesmo assim?

Vamos centrar a nossa verificação de factos na proposta que Paula Teles fez para a criação de uma linha de “metro de superfície” entre o centro do Funchal e os principais aglomerados populacionais dos seus arredores, solução que poderia resolver o problema das “filas de carros” que se formam “todos os dias”.

Em Março de 1996, em declarações ao DIÁRIO, o então vereador do Urbanismo na CMF, Ricardo Silva, admitia a hipótese de se construir uma linha de metro de superfície que acompanharia o traçado das ribeiras, numa estrutura montada por cima destas. A ideia estava já prevista no Plano Director Municipal (PDM) e o executivo camarário, que era presidido por Miguel Albuquerque, estava estudar uma candidatura do investimento aos fundos europeus do III Quadro Comunitário de Apoios. “"O Plano Director Municipal refere a necessidade de serem criados transportes alternativos, tipo funicular ou metro de superfície e os únicos espaços livres na cidade para esses transportes são as ribeiras de São João, João Gomes e Santa Luzia”, explicava o autarca, que fazia depender a concretização do projecto do resultado de negociações com o Governo. Aparentemente, tais conversações não chegaram a ‘bom porto’, pois a ideia não seguiu em frente.

Em Maio de 2000, essa mesma ideia viria a ser recuperada por um grupo de socialistas numa Convenção Regional de Autarcas do PS. Um movimento liderado por Victor Freitas, que incluía ainda Agostinho Soares, Miguel Fonseca e Manuel Faia, lançou a proposta de criação de uma Junta Metropolitana, que abrangeria as áreas do Funchal, Santa Cruz, Machico e Câmara de Lobos. E uma das sugestões relacionadas foi a realização de “um estudo sobre a viabilidade de um metro de superfície na capital da Madeira, que seria implementado junto às ribeiras radiais e à Estrada Monumental”.

No âmbito das eleições autárquicas de 2001, PS e CDS, então liderados por José António Cardoso e José Manuel Rodrigues, acertaram uma candidatura conjunta para a Câmara Municipal do Funchal. A 21 de Agosto, Dia da Cidade, a respectiva coligação anunciou a sua principal proposta para “procurar solucionar o grave problema de trânsito automóvel”: um Metro de superfície, ligando vários pontos da cidade do Funchal, associado ao fecho de várias artérias. A candidatura do PS e CDS referiu que dispunha de estudos preliminares para a instalação de um metro idêntico ao que naquela altura estava a ser instalado na cidade do Porto. A ideia passava pela ligação das zonas planas da cidade, nomeadamente o percurso Avenida do Mar-Mercado dos Lavradores-Avenida Arriaga e o percurso Campo da Barca- -final da Rua da Carreira. Era considerada essencial a ligação à zona hoteleira e à Nazaré, onde se encontrava o maior aglomerado populacional da cidade. Basicamente, a proposta de socialistas e populares traduzia-se numa nova filosofia de trânsito e estacionamento abaixo da Cota 40, onde meios de transporte alternativos seriam a solução central.

Esta proposta recebeu críticas de vários quadrantes. O presidente do Governo Regional, Alberto João Jardim, qualificou-a de “proposta surrealista” e a CDU de “devaneio megalómano”. A 24 de Agosto de 2001, Miguel Albuquerque garantia que o Metro de superfície “não é solução para a cidade do Funchal” devido ao elevado investimento que seria necessário fazer. Nessa altura, revelou que a própria CMF já tinha realizado um estudo preliminar sobre os custos e a previsão de utilizadores de um serviço de metro entre a Praia Formosa e o centro da cidade. Seria necessário gastar seis milhões de contos (o correspondente a cerca de 30 milhões de euros) e teria um número de utilizadores escasso, pelo que resultaria num “desastre financeiro”. Por isso, o seu executivo abandonou o projecto.

Nas eleições realizadas a 16 de Dezembro de 2001, o PSD venceu a Câmara do Funchal com 6 vereadores, sendo que a coligação PS/CDS só elegeu três, não dispondo esta de condições para implementar o seu plano de mobilidade.

Após o intenso debate das eleições autárquicas de 2001, a ideia do metro posta de parte e só esporadicamente foi colocada como uma hipótese. Por exemplo, em Março de 2011, no âmbito de um debate sobre mobilidade, o porta-voz regional da Quercus defendeu a avaliação deste meio alternativo de transporte urbano colectivo. Hélder Spínola recordou o exemplo de Barcelona (um metro que anda sobre rodas e funciona através de baterias, em vez de ser sobre carris), que é uma solução híbrida que prescinde de circuitos electrificados. Já em 2021, a candidata do PTP à Câmara do Funchal, Raquel Coelho, defendeu um estudo sobre a viabilidade de um metro de superfície.

Em suma, é verdade que há mais de duas décadas que se fala na possibilidade de criação de uma linha de metro na cidade do Funchal.

“Estes especialistas de fora vêm para aqui com sugestões [linha de Metro] das quais já se fala há mais de 20 anos” - Ex-vereador Edgar Marques Silva, no Facebook