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Constitucionalistas e Ourives

Claro que teremos sempre, a olho e a dente, como avaliar diamantes e jóias. Teremos sempre como empurrar a Autonomia da Madeira para a República, como se a ela não pertencêssemos

Nunca se viu tanta discussão sobre Justiça e Constituição da República Portuguesa como nos últimos quinze dias. A bem da Verdade a discussão, feita por pseudo especialistas em Direito Penal e Direito Constitucional, incide mais na fase de leitura de sentenças, porque saltou-se a fase de julgamento, do que no direito fundamental da presunção da inocência. Os mesmos que defendem uma pretensa forma de Estado de Direito são os mesmos que se predispõem a acender a fogueira ou a preparar a corda, garantindo que está bem atada de forma a não tropeçarem nela.

A presunção de inocência é um princípio fundamental do Direito Penal que estabelece que uma pessoa é considerada inocente até que a sua culpa seja comprovada além de qualquer dúvida razoável. Ou seja, uma pessoa é inocente até que seja provado o contrário por meio de um processo legal, justo e imparcial. Este princípio é uma pedra angular dos sistemas legais democráticos e está consagrado na Declaração Universal dos Direitos Humanos e em muitas Constituições por este mundo fora. É por aqui que se garante que os acusados tenham direito a um julgamento justo, no qual o ónus da prova recai sobre a acusação, e não sobre o acusado. Ou seja, deixem os Tribunais julgarem.Mas a justiça não é apenas um conceito legal ou ético. Ela é uma condição de equilíbrio, harmonia e realização tanto a nível individual quanto social. Por isso é que o sentimento de injustiça é fortemente despertado e o apelo à violência parece ser a única forma de restituir a justiça quando o indivíduo, ou uma comunidade se sentem injustiçados. A justiça popular, muitas vezes conhecida como “justiça das ruas” ou “justiça do povo”, refere-se a um sistema informal de aplicação da lei que opera fora das estruturas legais formais. Este tipo de justiça é frequentemente caracterizado pela intervenção direta da comunidade ou de grupos de pessoas para lidar com transgressões percebidas. Essa mesma justiça, a justiça popular, também pode ser motivada por vingança, falta de confiança nas autoridades ou falta de acesso à justiça. Mas há ainda aquele tipo de “justiça”, mesquinha, pequenina e oportunista, que nada mais é do que o reflexo das frustrações e derrotas de uns e de outros. O incitamento à justiça popular leva a abusos e arbitrariedades, precisamente porque prescinde da proteção dos direitos individuais.Estamos todos preocupados com o que se está a passar na Região. Mas isso devia nos levar a pensar como resgatar a confiança do cidadão naqueles que por nós decidem e governam. Claro que teremos sempre, a olho e a dente, como avaliar diamantes e jóias. Teremos sempre como empurrar a Autonomia da Madeira para a República, como se a ela não pertencêssemos. Mas a partir desse dia, a nossa dignidade de decidir sobre o nosso próprio futuro ficará inquinada. A todos, inclusive aos constitucionalistas e ourives, exige-se, nesta altura, que se honre a autonomia e os 50 anos de liberdade. Que sejamos melhores do que isto. Só há uma maneira de o fazer: oiçam a voz do povo quando for constitucionalmente possível.