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(re) Visitar a Natureza

Tantos podem ser os caminhos e a tentação pode ser aceitar qualquer ou todas as propostas

As notícias recentes dos constrangimentos e sobrelotação em locais de acesso à natureza e de atividades turísticas em espaços naturais, na Madeira, ilustram de forma cabal, a importância estratégica da natureza enquanto ativo que suporta a mais importante atividade económica e social na Região Autónoma da Madeira. Não existem dados organizados e disponíveis para uma análise integrada e efectiva cobrindo todas as variáveis relevantes desta matéria, mas todos conhecemos o papel que a paisagem e biodiversidade assumem na singularidade da experiência turística que a Madeira e Porto Santo oferecem a quem nos visita.

Os “engarrafamentos” nas levadas e outros percursos e os “atascamentos” nos miradouros ao longo das estradas regionais e acessos a pontos de partida e chegada de percursos de interesse turístico são conhecidos de há muito. O que agora acontece é o indiciar do aumento desta situações a um ponto que levanta dúvidas sobre a qualidade da experiência que se oferece aos clientes para quem essas atividades são o principal motivo de visita às nossas ilhas. A continuar assim, rapidamente o tema levadas e percursos pedestres corre o risco de deixar de ser um ponto alto da experiência turística e, não o sendo, perderemos um boa parte daquilo que nos distingue e nos posiciona de forma competitiva num mercado cada vez mais vulnerável e competitivo.

Não espanta, por isso, as prontas sugestões vindas de todos os sectores, com vista a tentar abordar a situação. Desde taxas a limitações, sistemas de controlo, mais ou menos inovadores, tantos podem ser os caminhos e a tentação pode ser aceitar qualquer ou todas as propostas que se lancem com maior ou menor criatividade dada a urgência e relevância da coisa.

Mas talvez fosse também o momento para olhar de uma forma mais integrada e reunir condições e dados de suporte à tomada de decisão que a dialética imediata não tem evidenciado considerar. Qualquer que seja o caminho a seguir, não pode ignorar a natureza, o que ela é, o estado em que se encontra, a capacidade de carga, a aptidão e disponibilidade para acolher e suportar a diversidade de atividades que se confundem sob a capa de turismo ecológico ou de natureza. É imperioso que a tomada de decisão disponha de informação e orientação com base numa estratégia para a conservação e utilização sustentável da natureza na Região Autónoma da Madeira. Existem muitas e excelentes iniciativas, programas e mecanismos com resultados muito positivos mas falta alguma integração e consequente comunicação dirigida aos múltiplos interessados, desde a população no geral até aos restantes utilizadores específicos. Era talvez o tempo de promover uma Estratégia Regional de conservação e utilização sustentável da natureza e biodiversidade, congregando o conhecimento (e também o que não se sabe) e todos os atores relevantes, gerando uma visão consensual em torno de prioridades e linhas de ação claramente percebidas por todos. As linhas formais e operacionais com que se gere, globalmente bem, a natureza na Madeira necessitam de um alinhamento com a realidade e os desafios dos tempos actuais. A visão e planeamento vigentes não tem sido capaz de acompanhar e integrar dimensões e dinâmicas que hoje importa considerar de forma proactiva. O excelente trabalho sectorial e investimento que se tem vindo a promover em muito beneficiaria de um exercício desta natureza do qual sairiam soluções mais integradas e consistentes em detrimento de propostas avulsas inspiradas pelo momento mas nem sempre motivadas pelo essencial.