Análise

Desconsiderações políticas

As recentes desconsiderações políticas pelos eleitores, até pelos eleitos, merecem reparo. 1. Lemos António Costa a recordar aos mais distraídos que “vão ser quatro anos” de socialismo. E para que não restem dúvidas, ditou uma dispensável sentença: ”Habituem-se”. Não temos que tolerar tamanha arrogância que denota desconforto, mesmo após nove meses de passeio democrático, de braço dado com Marcelo Rebelo de Sousa, e já com várias remodelações acumuladas no seio do executivo. Não temos que ficar habituados a mecanismos de dissimulação do futuro cruel que nos espera e do contexto severo em que o BCE abranda o ritmo de subida das taxas de juro, mas avisa que vai continuar a subi-las "significativamente", mostrando-se determinado no combate à inflação, que continua "demasiado elevada". Não temos que ouvir e calar, mesmo que muitos beneficiem de prestações extraordinárias, depósitos caritativos ou cheques em branco. 2. Ouvimos Miguel Albuquerque na inauguração da nova ligação entre o Estreito da Calheta e o Jardim do Mar enaltecer o contributo do “melhor secretário do Equipamento Social” dos governos regionais que, por sinal, não é o que tem hoje a difícil tarefa de assumir uma pasta que tem tanto de vistosa como trabalhosa, e talvez por isso, sempre cobiçada. Os méritos de Santos Costa fazem parte da história que Pedro Fino tenta honrar, apesar de já não ser a primeira vez que é publicamente humilhado, sem justificação plausível. Admirem-se depois que, entre os actuais mais capazes, não haja gente disponível para aceitar cargos de poder que têm o enxovalho repentista como brinde.

3. Muitos constitucionalistas admitem que o Presidente da República vai enviar o decreto da despenalização da morte medicamente assistida para fiscalização preventiva. Uma convicção que resulta dos “conceitos indeterminados”, da lógica economicista subjacente e do poder abusivo do Estado na vida ou morte de quem quer que seja, a que acresce, conforme sublinhou ontem no DN Bacelar Gouveia, uma inconstitucionalidade formal, já que a região autónoma da Madeira não foi ouvida como deveria ter sido, uma vez colocada perante um novo processo legislativo. “O TC tem considerado inconstitucionais leis em relação às quais não houve a audição sobre matérias que dizem respeito às regiões autónomas, como é também o caso da eutanásia que terá de ser praticada no sistema de saúde regional”, refere. Estamos pois perante uma omissão grave de um sistema político, devidamente denunciada pelo presidente da Assembleia Legislativa da Madeira, que não zela pelos interesses de todos os que dão corpo a umPortugal que devia ser uno na diversidade, mas que padece de centralismo compulsivo, e que desconsidera as Autonomias. O que andam a fazer os representantes das ilhas em Lisboa?

4. Um orçamento de 2 mil milhões de euros não pode resumir-se aos tradicionais chavões “mais do mesmo”. Se termos como “clientela”, “empobrecimento”, “betão” dessem votos, um modelo de desenvolvimento alternativo estaria já em marcha. Mas não. Por alguma razão nesta Região, também refém do comentário fácil e da subserviência a rituais que comprometem a tese do “povo superior”, as mudanças anunciadas não passaram de boas intenções porque na hora de votar outros valores se agigantam.

5. O anúncio de que a dívida da Madeira Parques caiu 34% em 3 anos coincidiu com a auditoria do Tribunal de Contas que pede ao secretário da Economia que pondere a viabilidade económico-financeira da empresa, equacionando o modelo de negócio e que promova o autofinanciamento. A quem serve o ilusionismo oficial?