A Guerra Mundo

Kiev ameaça Moscovo com mais ataques em território russo

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As autoridades ucranianas advertiram hoje que não necessitam de autorização para atacar objetivos em território russo, enquanto na Rússia surgem apelos para o reforço da defesa antiaérea na retaguarda profunda numa admissão dessa capacidade militar de Kiev.

"Atacaremos onde seja necessário, onde tenhamos de atacar o inimigo, porque o inimigo está ali, desde a fronteira até Vladivostoque", declarou na televisão ucraniana o secretário do Conselho nacional de Segurança e Defesa da Ucrânia (SNBO), Oleksiy Danilov.

"Não pediremos autorização a ninguém" quando estiveram em causa os interesses da Ucrânia, frisou o responsável ucraniano,

E acrescentou: "Não temos a intenção de perguntar onde e como devemos aniquilar o inimigo".

Na sequência dos ataques de 'drones' (aparelhos aéreos não tripulados) ucranianos a aeródromos russos situados a centenas de quilómetros da fronteira ucraniana, os 'media' norte-americanos têm referido que Washington autorizou Kiev a utilizar "da forma que entender" o armamento que tem fornecido, tendo apenas exigido o respeito "pelas leis da guerra e as convenções de Genebra".

De acordo com o analista miliar russo Mikhail Khodaryonok, que tem acompanhado as capacidades do Exército ucraniano em alcançar objetivos em território russo, trata-se de uma ameaça real.

"O complexo militar industrial da Ucrânia possui todas as possibilidade e qualidades necessárias para desenvolver mísseis e 'drones' de longo alcance", apontou o analista, citado pela agência noticiosa EFE, para recordar que a Ucrânia possui empresas em Pavlodar e em Kharkiv com capacidade para fabricar mísseis Grom, com alcance até 500 quilómetros.

Uma situação que se poderá tornar mais grave para a Rússia pelo facto de estas empresas terem capacidade para aumentar o raio de ação destes projéteis.

"Não existem dificuldades insuperáveis que obstaculizem a reconversão dos Grom em mísseis de alcance médio, capazes de atingir objetivos a 1.000-5.500 quilómetros", alertou em declarações ao diário digital Gazeta.ru, citadas pela EFE.

O especialista em assuntos militares assinalou ainda que a Ucrânia poderia alcançar objetivos em território russo com mísseis de cruzeiro de fabrico soviético do tipo X-55 e X-55SM.

Segundo o perito, a este cenário junta-se a ameaça do fabrico de 'drones' ucranianos, uma possibilidade a curto prazo.

"Na exposição 'Armas e segurança 2021' realizada em Kiev foram apresentados vídeos, fotos, e anunciadas as características técnicas e táticas de um 'drone' multifuncional de assalto ACEO ONE", com um alcance de 1.500 quilómetros, recordou.

Perante estas ameaças, Mikhail Khodaryonok frisou a necessidade de reforçar a defesa antiaérea nas principais bases aéreas da parte europeia da Rússia.

Nessa perspetiva, recomendou a instalação em todos os aeródromos da aviação estratégica russa de um conjunto de mísseis antiaéreos S-400 integrado por duas divisões, uma ou duas baterias antiaéreas Pantsir-S ou Tor-M2 e artilharia antiaérea de baixo calibre para combater os 'drones' de menor dimensão.

"O mais importante, o sistema de radares nas zonas de acesso aos objetivos devem abranger todas as altitudes, em particular as baixas e extremamente baixas, para garantir a ativação oportuna das defesas antiaéreas", assinalou.

Khodaryonok também defendeu que os bombardeiros estratégicos devem ser dispersos por diversas bases aéreas para evitar maiores danos caso um ataque ucraniano consiga atingir essas instalações.

No entanto, e apesar de considerar muito pouco provável que se tornem massivos os ataques em profundidade à Rússia anunciados por Kiev, "caso os 'drones', mísseis de cruzeiro ou balísticos do inimigo não sejam intercetados pela defesa antiaérea, os danos morais deste género de ataques será mais que considerável", concluiu.

No terreno, a situação na linha da frente parece manter-se estabilizada, com as duas partes a acusarem-se mutuamente de atacar objetivos civis.

Hoje, Yaroslav Yanushevych, chefe da administração militar da região de Kherson, parcialmente recuperada pela Ucrânia, indicou que "os ocupantes russos bombardearam 57 vezes o território de Kherson".

"Zonas pacíficas da região foram atacadas com lança-foguetes múltiplos, artilharia e morteiros (...). Uma pessoa ficou ferida", acrescentou o representante, antes de precisar que os bombardeamentos se centraram em instalações de infraestruturas, edifícios e apartamentos.

Por sua vez, as autoridades russófonas que controlam Donetsk acusaram hoje o Exército ucraniano de ter disparado 50 projéteis de artilharia de calibre 155 milímetros contra várias localidades, e cinco projéteis Grad contra a capital da região.

Perante esta situação, o líder interino de Donetsk, Denis Pushilin, insistiu hoje que os trabalhadores da região devem começar a aderir ao trabalho à distância, decretado no domingo, e manter abertas as portas dos edifícios para que a população possa proteger-se em caso de ataque.

A ofensiva militar lançada a 24 de fevereiro pela Rússia na Ucrânia causou já a fuga de mais de 14 milhões de pessoas -- 6,5 milhões de deslocados internos e mais de 7,8 milhões para países europeus --, de acordo com os mais recentes dados da ONU, que classifica esta crise de refugiados como a pior na Europa desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

Neste momento, 17,7 milhões de ucranianos precisam de ajuda humanitária e 9,3 milhões necessitam de ajuda alimentar e alojamento.

A invasão russa -- justificada pelo Presidente russo, Vladimir Putin, com a necessidade de "desnazificar" e desmilitarizar a Ucrânia para segurança da Rússia -- foi condenada pela generalidade da comunidade internacional, que tem respondido com envio de armamento para a Ucrânia e imposição à Rússia de sanções políticas e económicas.

A ONU apresentou como confirmados desde o início da guerra 6.755 civis mortos e 10.607 feridos, sublinhando que estes números estão muito aquém dos reais.