5 Sentidos

Paulo Sérgio BEJu ergue-se como árvore

‘opapeldasárvores’ inaugura amanhã na Galeria Marca de Água

Algumas imagens da exposição que inaugura amanhã na Rua da Carreira. Ver Galeria
Algumas imagens da exposição que inaugura amanhã na Rua da Carreira.

Há uma árvore na Galeria Marca de Água construída pelas mãos de Paulo Sérgio BEJu com troncos, galhos, folhas, pássaros, sementes e flores e o olhar, sempre o olhar do artista, incentivando à contemplação. Esta construção que é também a do seu corpo deu o nome de ‘opapeldasárvores’, é uma exposição individual com 61 trabalhos, incluindo cinco instalações, para ver a partir das 18h30 de amanhã, no número 119 da Rua da Carreira.

Como as restantes exposições de Paulo Sérgio BEJu, ‘opapeldasárvores’ tem muito de pessoal, o artista continua a trabalhar com questões do corpo e a explorar o desenho e a instalação. A exposição ‘opapeldasárvores’ é apresentada como uma árvore, com raízes na cave da galeria, tronco no rés-do-chão e copa no primeiro andar. “Existe uma familiaridade formal entre uma árvore e um corpo, penso que cada pessoa, também é uma árvore”, escreve no texto de apresentação o artista. “Somos árvores no desencadear de uma poética que procuro trazer para a exposição”.

É no meio, no tronco, que está o que de mais directamente relacionado com a árvore ali se encontra. “O que eu fiz foi transformar a ideia de árvore e tudo o que podia encontrar dentro de uma árvore, e sendo artista, transformar isso no campo da imaginação”, contou. No topo está o lado mais “teatral”, as interpretações que vão para além da árvore, mas que ainda assim associam-se a esta. E na cave, na zona das raízes, uma instalação que Paulo Sérgio BEJu estava hoje a terminar, feita de papel de aguarela pintado, a lembrar as folhas de ginkgo biloba, e sal.

Os trabalhos na sua maioria são desenhos realizados a esferográfica, azul, vermelha e verde, alguns acompanhados de bordado e um deles de iluminação, criando jogos de luz e de movimento em cada traço e no conjunto dos traços. Há também fotografia e instalação.

A viagem de influências é grande, vai do Egipto ao Japão, passando por Esmoriz e pela Camacha, tudo guiado pela questão afectiva e das sensações. Em termos de pessoas, BEJu tanto se inspirou no mestre Vincent van Gogh, que também pintou muitas árvores, botas e sapatos, e a quem dedica um dos seus quadros, como em Álvaro de Campos, de quem pediu emprestado um poema para dar asas ao seu trabalho; ou na senhora do café que frequenta, cujos brincos estão na origem de um pequeno formato dos 16 que compõe uma instalação em mesa, a que chamou ‘O Banquete’. Antes de lá chegar, no mesmo andar, está a instalação ‘VERde’, um jogo de círculos e espelhos, de olhos e de movimento. ‘VERde’ porque para ver o verde é preciso se aproximar, um verde que representa “o reflexo de nós próprios, reflexo na velocidade em que vivemos”, explicou BEJu.

Ao lado, seis trabalhos tem como nome seMENTE. “No fundo todos mentimos”, diz o artista, que com esferográfica e bordado tece formas que podem ser muitas coisas e são mundos.

Na mesa de jantar estão ‘A Sensual’, ‘A Seca’, ‘A Picante’, ‘A Sumarenta’, ‘A Delicada’, ‘A Pitanguinha’, ‘A Romântica’, ‘A Rubra’, ‘A Glandular’, ‘A Folhada’, ‘A Cardíaca’, a ‘Flor-Chama’, ‘A Tropical’, ‘A Frutada’, ‘A Aquática’ e ‘A Iluminada’. Cada peça foi inspirada em coisas que estava a viver no momento, revelou. Remetem para o quebrar das regras. “Todas estas peças são muito corpóreas, muito físicas, quase como se fossem coisas do corpo, dentro do corpo, ou então têm um lado erótico, e isso é de propósito, a provocação. ‘O Banquete’ no fundo é um prazer e é por isso que elas estão à mesa, para serem servidas, para serem devoradas e comidas pelos olhos”. Ao fundo, um mamilo, onde tudo começa, o primeiro alimento. Ao lado um pedaço de madeira esculpido e pintado a esferográfica vermelha e transformado num pedaço de corpo e que BEJu chamou de ‘Naco’, um naco de carne, preso a um olho, o do artista que o desenha sempre recorrendo a um espelho.

A técnica da esferográfica foi usada também para representar a quietude, um par de peças mais clássicas que ali coabitam com as restantes. “Esta exposição tem também qualquer coisa de morte, no fundo para as pessoas reflectirem sobre o que é que é a vida”. A morte é representada por desenhos de troncos caídos no chão.

Também nesta copa estão as aves, que ganharam asas a partir de ‘O Guardador de Rebanhos’, de Alberto Caeiro. O artista criou as ‘Guardadoras’, um conjunto de quatro aves que remetem para as pessoas. A copa, diz, “é aquela viagem ao céu, é onde se pode viajar, onde se pode voar, é a imaginação do artista levada ao máximo”.

Ainda em ‘opapeldasárvores’ Paulo Sérgio BEJu trabalhou vieuxchéne, usado para pintar o papel para as lapinhas ou para escurecer madeira. Foram obras feitas em segundos com o pincel da barba, a que deu o nome de ‘Envolvência’.

‘opapeldasárvores’ podia ser uma exposição de vários artistas, reconheceu. E a ideia foi essa. “Nós não somos sempre iguais, estamos sempre a transformarmo-nos e as árvores transformam-se todos os dias e nós não sentimos”.

A exposição inaugura hoje e fica patente ao público até ao dia 5 de Setembro, podendo ser vista nos dias úteis das 10h30 às 18h30. A entrada é livre.