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A propósito do ferry

O Grupo Sousa paga mais impostos na Madeira do que os que resultam da sua atividade regional

Agora que a operação está em curso, entendi ser importante recordar alguns factos e dar conta de algumas ilações.

Antes, porém, devo dizer que ponderei muito no título deste artigo. Pensei, aliás, se o mais adequado não seria DAS VANTAGENS DA AUTONOMIA E DAS EMPRESAS REGIONAIS.

Mas vamos por partes.

Primeiro, relembre-se que tivemos a operar na Madeira, há uns anos atrás, a Naviera Armas. Esta empresa, por razões decorrentes da exploração deficitária da operação, entendeu abandonar a linha entre a Madeira e o Continente português. Referiu-se na altura que, para continuar, exigia indemnizações compensatórias na ordem dos 6 Milhões de Euros, valor que entendia como o ajustado para compensar o deficit específico da operação.

A polémica instalou-se (com muitos, mesmo os que agora dizem que a operação é cara, a dizer que era inadmissível que não se apoiasse esse direito) e considerado o princípio da continuidade territorial plasmado na lei portuguesa, a Região desafiou a República a assumir a sua responsabilidade no processo. Contudo, este governo nacional, em linha com o que fazem quase todos à Madeira há 6 séculos ... mandou os Madeirenses passear (neste caso, nadar). Um parêntesis para dar nota de que, agora, porém, com a operação já em curso e a expensas nossas, a Ministra do Mar já apareceu em Portimão para deixar-se fotografar e discursar ...sobre aquilo a que disse que não tínhamos direito.

Mas voltemos ao nosso exercício. Atenta a recusa nacional, encetou-se então, por ação exclusiva do Governo Autónomo da Madeira e após consulta às entidades Europeias, um processo de abertura de concurso que ficou, como se sabe, deserto. A este propósito e para quem não se recorda, tal significa que as empresas de toda a Europa (e arredores) que podiam concorrer, entenderam que as compensações não eram suficientes para avançar com uma candidatura para a operação, porque, tendo feito as suas contas, assumiram que o “custo-benefício” não era de molde a correr qualquer risco.

Neste contexto (e só neste, ou seja, porque ninguém concorreu nos termos fixados), o Governo Madeirense alterou as condições, não aumentando, contudo, o valor a disponibilizar. Reduziu o prazo da operação e, assumido que o período de maior procura era o de Verão, centrou o concurso nesses meses.

Desta feita, finalmente, e mau grado o levantamento do caderno de encargos ter sido feito por vários operadores, a verdade é que, no dia estabelecido como de final do prazo, só um apresentou proposta, proposta essa que seguiu os trâmites definidos na lei e que permitiu que em Julho as viagens começassem.

E quando se esperava satisfação (em especial dos que tanto parecem querer viajar de ferry ... já não tanto dos que esgrimiam o tema na luta político-partidária e que, com essa visão distorcida, se “esqueciam” de atacar o verdadeiro adversário) por finalmente ter havido luz verde...ouvem-se protestos e atiram-se pedras ! Algumas reveladoras de má-fé e/ou de ignorância total, como as inerentes aos preços de tabela da carga, já que estes são exatamente os de 2011, e sabendo-se que o operador estava liberto para praticar os preços que quisesse. Exceção feita, obviamente, aos respeitantes aos passageiros residentes, que foram fixados no cadernos de encargos do concurso (internacional relembra-se) e que são, por essa circunstância, substancialmente mais baixos do que os de 2011.

Mas pedras porquê, pergunta-se ? Porque o único concorrente (entre todos da Europa e arredores que poderiam candidatar-se e não o fizeram) era Madeirense ! Mais concretamente o Grupo Sousa. Grupo económico este que, por sinal, se analisarmos os seus resultados publicados, paga mais impostos na Madeira do que os que resultam da sua atividade regional. O mesmo é dizer, entenda-se, que paga, na Região, impostos sobre receitas que decorrem da sua atividade fora dela. Tal como outros, aliás, mas hoje estamos a falar deste em concreto. Mas isso parece ser de somenos para os que pensam que o dinheiro do Estado cai do céu (mesmo os que não acreditam nele).

Qual parêntesis e num à parte muito pessoal, confesso que nunca pensei que alguém se candidatasse. Porque o risco económico-financeiro da operação e o custo de oportunidade do investimento, apesar da limitação do período e da compensação financeira, me pareciam enormes. O que parece, aliás, estar a comprovar-se nos indicadores de procura (que teriam, julgo, que andar pelos 100% da lotação e com mais não residentes), pelo que acredito, sinceramente, que “a rota” venha a induzir prejuízos ao operador e, com isso, creio também, a levá-lo a sair da mesma logo que termine a sua responsabilidade.

Mas enfim ! Luís Miguel de Sousa e a sua equipa lá saberão, e, por isso, permitam-me que, à contrário de outros, lhes tire o chapéu, porque assim se permitiu que alguns Madeirenses ganhassem com a situação. Neste particular os que tanto ansiaram por esta circunstância (que não foi, nem é, confesso, o meu caso). Mas o facto de terem avançado mesmo com o risco económico-financeiro referido, traz uma MAIS VALIA, essa sim para todos. E DE MUITO RELEVO POLÍTICO, POIS A LINHA MARÍTIMA, COMO A AÉREA, ESTÁ LIBERALIZADA. É QUE, NESTE CASO, O RESIDENTE SÓ PAGA O QUE TEM DE PAGAR, AO CONTRÁRIO DO QUE SUCEDE NO TRANSPORTE AÉREO, O QUE PROVA QUE HÁ SOLUÇÕES, DESDE QUE HAJA VONTADE POLÍTICA. Que neste caso foi por via de concurso, mas que no caso concreto da mobilidade aérea e a exemplo do que sucede em Canárias, pode ser através de outro modelo. Só que o Governo do PS da República e a sua afilhada TAP não querem (como se comprovou na recente votação na Assembleia da República) e o Governo Autónomo da Madeira e um grupo empresarial Madeirense (neste caso o Sousa) evidenciaram, como sempre se disse, ser possível.

Dito isto, dois comentários finais. O primeiro, sobre as críticas a quem ganhou o concurso: fazem lembrar a velha máxima usada para caracterizar os que pediam cigarros aos amigos e que, quando viam o que fumávamos, diziam ... “ah! dessa marca não!”... Recordam-se ? O segundo, qual declaração de interesses: nunca trabalhei para o Grupo Sousa, nem nenhum dos meus familiares, ascendentes, descendentes ou com qualquer parentesco. Mas respeito todos e cada um(a) dos que, nas diversas empresas do Grupo e a todos os seus níveis, trabalham todos os dias em prol de um grupo económico cada vez mais robusto, com que a Região beneficia quer em termos de impostos como de emprego.