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Fact Check Madeira

Terá o ‘Monumento ao Trabalhador” sido edificado durante o Estado Novo como afirmou Paula Margarido?

Paula Margarido deposita flores em homenagem ao Trabalhador Madeirense
Paula Margarido deposita flores em homenagem ao Trabalhador Madeirense, Foto Governo Regional da Madeira

No dia 1 de Maio, Dia do Trabalhador, a nova secretária regional com a tutela da área do Trabalho cumpriu o ritual dos seus antecessores e foi até junto do Monumento do Trabalhador Madeirense, depositar flores. “Estamos aqui, hoje, novamente para homenagear aqueles que no seu local de trabalho dignificam a relação com o outro, para assim construírem uma Região mais justa e mais solidária para com todos”, afirmou Paula Margarido.

“Este monumento foi erigido em 1973 pela então Junta Geral como forma, já na altura, de homenagear os homens e as mulheres que trabalhavam nos poios e nas levadas.”

A afirmação suscitou algumas dúvidas junto dos leitores, por julgarem o monumento como obra da autonomia. Mas, afinal, quem tem razão? Paula Margarido, quando situa temporalmente o monumento no Estado Novo ou os leitores quando o colocam já no período autonómico?

A verificação dos factos vai ser feita com recurso a documentos oficiais e a notícias da imprensa regional sobre o monumento.

DIÁRIO e Jornal da Madeira, em outubro de 1979, noticiaram que o monumento ia ser inaugurado no dia 16 de Outubro. No dia seguinte, a inauguração do monumento encomendado a Anjos Teixeira foi notícia de primeira página nos dois. No Jornal da madeira teve continuação na página 5.

Desde logo, surge uma explicação que ajuda a esclarecer o que se passou. Mas, antes, o Jornal informa que o autor da escultura não compareceu à inauguração, que foi presidida por Alberto João Jardim, que já liderava o Governo Regional. “Para surpresa dos assistentes o autor não se fez representar nesta cerimónia”. O Jornal diz não serem conhecidas as razões, mas no paragráfico anterior deixa uma pista. “A estátua ‘do tralhador madeirense’ (é) de autoria do escultor Anjos Teixeira, candidato da APU (Partido Comunista) às eleições intercalares para a Assembleia da República.”

Na mesma ocasião, o Jornal permite-nos saber que o monumento não se encontrava “em realização recente”, pois a iniciativa advinha “da extinta Junta Geral do Distrito Autónomo do Funchal, o que em princípio, visava registar para a imortalidade a memória dos homens que morreram no exercício do seu labor, no decorrer das obras de aprofundamento do túnel (…) existente no Paul do Mar”.

“Seria, então, na vigência do eng.º Rui Vieira na presidência da Junta Geral (Fevereiro de 1971 / Setembro de 1974) que esta iniciativa assumiria a homenagem aos trabalhadores madeirenses, implacavelmente devotados à exploração da terra e de tudo quanto constituíram os meios de sua subserviência, desde a abertura de levadas às estradas.”

De facto, nos registos notariais da Junta Geral, consta, com data de 14 de Janeiro de 1972, o registo: “Obras literárias e de arte - Monumento ao Trabalhador Madeirense, de Pedro Anjos Teixeira - empreitada de fornecimento de estátua.” Outro, com data de 21 de Março de 1973, diz: “Obras literárias e de arte - Monumento ao Trabalhador Madeirense, de Pedro Anjos Teixeira - empreitada de fornecimento de cantarias.”

“Em 1973, o escultor Anjos Teixeira concluía o ‘Monumento ao Trabalhador’, escultura representando um operário em tronco nu, figura incrustada num baixo-relevo em pedra (cantaria rija)”, como se pode ler na tese de Mestrado de António Carlos Jardim Valente, ‘As Artes Plásticas na Madeira (1910 - 1990) - Conjunturas, Factos e Protagonistas do Panorama Artístico Regional no Século XX’, apresentada em 199 na Universidade da Madeira.

Por outro lado, no dia 3 de Novembro de 1978, o Jornal da Madeira informou que o Governo Regional havia deliberado “encarregar a Secretaria Regional do Trabalho da instalação do monumento ao Trabalhador Madeirense, em consonância com a Câmara Municipal do Funchal”.

No dia 1 de Maio de 1979, o secretário Regional Bazenga Marques disse “infelizmente” não ser “possível inaugurar como estava previsto o Monumento ao Trabalhado”. E era acrescentado: “De acordo com informações que possuímos, ficará localizado no Parque de Santa Catarina, nas imediações do restaurante a GRUTA”.

Depois o Jornal citava Bazenga Marques: “Os trabalhos da referida estátua já se iniciaram devendo-se deste modo a sua inauguração (ocorrer) muito em breve.” Como já se viu, essa inauguração aconteceu no dia 16 de Outubro do mesmo ano, 1979.

Como se constata, o Monumento ao Trabalhador Madeirenses foi uma decisão da Junta Geral, mas inicialmente teria outro objectivo. No entanto, foi ainda no período da Junta Geral que passou a ter como fim homenagear o trabalhador madeirense em geral. Apesar disso e de realizada pelo escultor em 1973, a obra foi concretizada depois e inaugurada em 1979. Apesar de tudo, não se pode considerar como falsa a afirmação de Paula Margarido, pois, o espírito do que afirmou está correcto.

Ponderados todos estes aspectos, avaliamos como imprecisa a afirmação da secretária regional da Inclusão, Trabalho e Juventude.

“Este monumento foi erigido em 1973 pela então Junta Geral como forma, já na altura, de homenagear os homens e as mulheres que trabalhavam nos poios e nas levadas” – Paula Margarido, secretária Regional da Inclusão, Trabalho e Juventude, no dia 1 de Maio