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Análise

Vendedores de ilusões?

Não basta querer uma maioria nem intuir que está iminente uma mudança

Esta campanha eleitoral faz lembrar uma feira popular. Há de tudo: promessas a granel, ideias mirabolantes e até momentos dignos de um verdadeiro circo.

O DIÁRIO tem dado palco às 14 candidaturas, permitindo-lhes apresentar propostas para 14 eixos fulcrais do futuro da Região. O objectivo é claro: esclarecer os eleitores, promover o debate e avaliar a viabilidade das medidas sugeridas. Vamos continuar a fazê-lo.

Se algumas das ideias apresentadas são bem fundamentadas, outras são autênticos brindes lançados ao ar para ver se colam. Mas, convenhamos, já ninguém se deixa enganar por discursos vazios e soluções mágicas. Os madeirenses querem propostas concretas, orçamentadas e exequíveis, não fantasias sem lógica.

Vejamos os desafios reais: o problema habitacional é hoje um dos maiores dramas da Madeira. Comprar casa tornou-se um luxo ao alcance de poucos. Em apenas dez anos, o preço das habitações mais do que duplicou, e encontrar, por exemplo, um T2 acessível é como ganhar o Euromilhões. Apesar disso, há candidaturas a prometer soluções que não resistem a uma análise séria – algumas falam em construir milhares de casas num ápice, como se o orçamento regional fosse inesgotável, os terrenos surgissem do nada e a mão-de-obra proliferasse. Sejam sérios e falem verdade.

Outro sector crítico é a Saúde. A carência de médicos em várias especialidades é evidente, mas há quem proponha soluções que ignoram a realidade. Falar em contratar profissionais em regime de exclusividade pode soar bem, mas onde estão esses médicos? A concorrência com o continente é feroz, e o que se oferece na Madeira nem sempre é suficiente para atrair especialistas. Pedopsiquiatria, dermatologia, cirurgia vascular… São apenas algumas das áreas onde os madeirenses enfrentam longas listas de espera e falta de respostas. Mas há profissionais disponíveis no mercado? Não. Nem aqui nem no continente.

Na folia de ver quem apresenta mais propostas, algumas parecem tiradas de um manual de ilusionismo: lançar novos serviços públicos em edifícios privados, prometer apoios que dependem de entidades externas ou anunciar investimentos faraónicos sem dizer de onde vem o dinheiro. Exemplo: a Região pode dispor a seu bel-prazer do Hospital dos Marmeleiros? E do Nélio Mendonça? Sejamos sérios! Ou acreditam que o sonho mirífico de ter uma região sem desempregados, com habitação plena, saúde sem listas de espera nem carestia de especialistas, um ferry diário para Lisboa, metro de superfície e quiçá comboio a ligar todos os concelhos, para além dos impostos mais baixos do País, vai embalar os incautos eleitores?

A Região precisa de líderes sérios, não de vendedores de logros. A política não pode ser um jogo de promessas vãs. Está na hora de exigir responsabilidade, transparência e, acima de tudo, credibilidade e respeito por quem vive e trabalha na Madeira.

Não basta querer uma maioria para governar, nem intuir que está iminente uma mudança, nem querer muito ser presidente do governo porque se julga ungido para o cargo. Infelizmente, os partidos ainda não conseguiram gerar dinâmicas que permitam alianças ou entendimentos pontuais que viabilizem os grandes dossiers e permitam uma governação estável. Os dois maiores partidos tinham de assumir essa responsabilidade, mas como é bom de ver, vence sempre a mesquinha contabilidade partidária que permita alcançar, manter o poder e alimentar a clientela. Exceptuando os extremos, o que difere assim tanto o PSD do PS e vice-versa?

P.S. A queda do governo liderado por Luís Montenegro registou momentos hilariantes e teatrais. A mais lastimável táctica política determinou o fim abrupto de uma legislatura que até não estava a correr assim tão mal. O primeiro-ministro fugiu às suas responsabilidades e usou um expediente perigoso para livrar-se do escrutínio. Fez mal. A diatribe poderá sair-lhe cara em Maio.