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Natal

Na década dos anos 20 do Século XX uma família, habitante de um dos Estados integrantes dos Estados Unidos da América, o Oklahoma, dona de um terreno que já fora fértil o suficiente para prover o sustento para todo o agregado, fruto de secas e da ganância de umas companhias e de outros tantos bancos que tudo sugavam na voragem de um lucro rápido, viu-se na “obrigação” de emigrar para outro Estado que tudo prometia: trabalho, abundância, sossego, prosperidade e paz. Sendo pertencentes ao mesmo País, não seriam emigrantes do seu Oklahoma para serem imigrantes na Califórnia dos seus sonhos, mas seriam talvez só migrantes dentro do mesmo País comum, à procura de um lugar onde pudessem trabalhar sem que outros cobiçassem o que por direito lhes pertencia.

A sua viagem de um Estado para o outro foi uma jornada difícil pelas contingências próprias que a pobreza acarreta e mais difícil ficou quando chegaram ao Estado que tudo prometia mas que afinal nada dava. Foram tratados com sobranceria, às vezes com violência por quem os tinha aliciado com promessas de trabalho sério e seguro, mas que afinal tudo o que queriam era explorar, quase escravizar uns quantos coitados que a única coisa que queriam era paz e trabalho. Eram chamados, de uma forma depreciativa de “Okies”, olhados com desdém pelos californianos que acreditavam ser os “Okies” a fonte dos males que a sua própria inércia fomentava: os “okies” vêm para nos tirar o trabalho, o trabalho que desdenhavam fazer, diziam enquanto os maltratavam sem dó nem piedade. John Steinbeck escreveu a saga da Família Joad na sua atribulada viagem migrante de emigrantes do Oklahoma para imigrantes na Califórnia, afinal todos pertencentes ao mesmo país, mas como atitudes de revanchismo tal que pareciam originários de países distantes, no seu livro “As Vinhas da Ira”.

Passados cerca de 100 anos, os argumentos, a violência, a desinformação, a raiva, continuam vivas, sem trazerem nada de novo ao que já se sabia desde há séculos, nas mentes de tantos por esse mundo fora, muitos portugueses incluídos, que se deixam levar pelos argumentos fáceis e fúteis de pessoas com agendas pessoais muito próprias e que estão pouco ligando para o bem-estar dos que os seguem com a cegueira própria da demagogia a da falta de discernimento.

Falta pouco para celebrarmos o nascimento de Jesus, celebrado com pompa e circunstância por uns, com parcimónia de contenção por outros, tudo dependendo do local onde se pode celebrar, dependendo se estamos no nosso meio, familiar ou social, ou se pelo contrário estamos longe do nosso meio familiar ou social, por via das circunstâncias que a vida é pródiga.

Sendo uma época em que tradicionalmente se celebra também o amor, principalmente o amor pelo próximo, tal como ensinou depois Jesus, o amor familiar, o amor social que leva a que a entreajuda não seja uma palavra vã, o amor que leva ao perdão, sentimento tantas vezes apregoado mas não executado, o perdão das pequenas faltas, daquelas que diariamente fazemos, tantas vezes sem nos darmos conta que estamos a magoar um nosso semelhante através de uma atitude que poderia ter sido diferente se tivéssemos pensado antes que o impulso tomasse conta do acto, da palavra que acabou por sair de uma forma quiçá intempestiva, da falta de um bom dia com quem cruzamos diariamente mas que não reconhecemos porque olhamos ser ver e ouvimos sem escutar, ou da falta de um obrigado no fim da frase com que nos despedimos de quem nos atendeu tentando dar o seu melhor para que o nosso dia continue a ser um bom dia, igualmente, obrigado!

É um período que é particularmente difícil para quem está deslocado do seu meio familiar ou social, seja por que razão fôr, um período em que o sentimento de não pertença se agudiza quando a saudade dói e a esperança constrói uma espécie de halo que suavize a falta dos que nos sendo próximos estão distantes, tão distantes quanto possa ser a distância da Terra à Lua.

Independentemente da crença religiosa que se possa professar, ou mesmo sem qualquer crença, o Natal está presente no nosso dia-a-dia nem que seja com um simples “Boas Festas” ou um “Festas Felizes” quando nos cruzamos na rua com quem tantas vezes nem um bom dia sai tal a velocidade que os dias impõem ao nosso andamento diário.

Quem, seja por que motivo fôr se vê obrigado a sair do seu país, do seu recanto, das suas raízes, para procurar vida numa outra realidade completamente diferente, sente de uma forma particular a maldade apregoada durante o restante ano ser esponjada hipocritamente durante a época natalícia como se a violência com que uns destratam quem procura uma vida decente em outras paragens fosse lavada só com a propaganda que o amor ao próximo traz com a voragem da publicidade das grandes marcas que tudo vendem!

Só não vendem o Amor!