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Pelo aborto seguro e acessível

Parlamento Europeu votou a favor da criação de um mecanismo voluntário para ajudar quem não tem acesso a aborto seguro e legal

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Fonte: My Voice, My Choice

‘My Voice, My Choice’ (‘A minha voz, A minha escolha’, em português) é o nome da iniciativa cidadã que defende a criação de um mecanismo voluntário para ajudar quem não tem acesso a aborto seguro e legal, e que lhes permita abortar num país membro da União Europeia. Iniciativa que foi, esta quarta-feira, aprovada no Parlamento Europeu, e passa agora à Comissão Europeia, que se deverá pronunciar até Março de 2026.

A 17 de Dezembro, o Parlamento Europeu aprovou a criação deste mecanismo que pretende facilitar o aborto legal e seguro. O mecanismo financeiro aprovado permitiria a um país membro da União Europeia (UE) “oferecer acesso à interrupção segura da gravidez a qualquer pessoa que não possa receber esses cuidados de forma segura e legal”, em conformidade com a legislação de cada Estado-Membro.

A iniciativa ‘My Voice, My Choice: pelo aborto seguro e acessível’ foi apresentada à Comissão Europeia a 1 de Setembro de 2025, depois de obter mais de um milhão de declarações de apoio devidamente verificadas (1.124.513 assinaturas). Ultrapassou, assim, o mínimo exigido de um milhão de declarações de apoio válidas e atingiu limiares em 19 Estados-Membros, após o seu registo em Abril de 2024.

Em Portugal foram reunidas 17.824 assinaturas, mais 20,39% do mínimo exigido (14.805 assinaturas). Outros países triplicam o mínimo exigido, como França e Itália, com a Grécia e Roménia lá muito perto, mas o destaque vai para a Eslovénia com uma percentagem de apoio de 1.055,11%, também para a Croácia (779,70%) e Finlândia (674,42%).

Nos termos do artigo 15.º do Regulamento ICE, a 1 de Outubro de 2025, os organizadores da iniciativa apresentaram os seus objectivos numa reunião com a comissária Hadja Lahbib e vários funcionários da Comissão. Dois meses depois, a 2 de Dezembro, teve lugar a apresentação da iniciativa numa audição pública no Parlamento Europeu.

Iniciativa que acabou por ser, esta quarta-feira, aprovada, e festejada com aplausos de pé. Agora, a Comissão Europeia tem até 2 de Março de 2026 para apresentar a sua resposta oficial, indicando as medidas que tenciona tomar, se for caso disso. Com esta aprovação, o Parlamento Europeu insta a Comissão Europeia a criar um mecanismo financeiro de “adesão voluntária”, aberto a todos os 27, e apoiado por financiamento da UE.

Aquando da entrega da iniciativa, a 1 de Setembro, a Comissão Europeia sublinhou que qualquer eventual acção terá de respeitar os limites do artigo 168.º, n.º 7, do Tratado Sobre o Funcionamento da União Europeia, que estabelece as competências nacionais em matéria de saúde, e que esta iniciativa não confere um direito ao aborto a nível da UE.

‘My Voice, My Choice’

“Inúmeras vidas e meios de subsistência são destruídos, perturbados ou perdidos devido à falta de acesso a um aborto seguro. Há que pôr termo a esta situação”, lê-se no texto desta iniciativa de cidadania europeia, que pretende avançar “para uma política mais justa que expresse os valores europeus de forma mais construtiva e concreta”.

A falta de acesso ao aborto em muitas partes da Europa não só expõe as mulheres a um risco de danos físicos, como também coloca uma pressão económica e mental indevida sobre as mulheres e as famílias de comunidades marginalizadas que têm menos condições de aceder ao mesmo.

Escrevem os organizadores que “está suficientemente comprovado que o facto de considerar os cuidados reprodutivos como um luxo não reduz o número de abortos, antes leva as mulheres a praticarem o aborto em condições pouco seguras”. Daí este apelo a apoios para que se possam realizar interrupções de gravidez em condições de segurança, para qualquer pessoa na Europa.

Defende esta iniciativa que prevenir o aborto não seguro é uma questão de saúde pública. A UE consagrou a protecção da saúde humana no artigo 3.º da sua Carta dos Direitos Fundamentais, que dispõe que: “Todas as pessoas têm direito ao respeito pela sua integridade física e mental.”

Estas disposições constituem um fundamento para acções concretas, como o reconhecimento de um princípio de não discriminação em relação à nacionalidade dos doentes (Directiva n.º 2011/24), introduzindo, por conseguinte, a igualdade do acesso aos cuidados de saúde em qualquer Estado-Membro.

Recentemente, a UE adoptou o programa EU4Health, que criou um investimento de 5,3 mil milhões de euros para alcançar os objectivos de melhoria da saúde na Europa, nomeadamente o apoio a acções dos Estados-Membros destinadas a promover o acesso a cuidados de saúde sexual e reprodutiva (Regulamento n.º 282/2014). 

“Apesar de todas estas medidas, numerosas mulheres na Europa não têm acesso a um aborto seguro e legal e a sua saúde continua em risco”, afirmam os organizadores. Citando vários artigos do Tratado da União Europeia, no que concerne a direitos humanos, concluem que “as mulheres que não têm acesso a um aborto seguro e legal são privadas de muitos dos seus direitos fundamentais, sendo, por conseguinte, reduzidas ao estatuto de cidadãs de segunda classe”.