Responsabilidade
O acidente com o Elevador da Glória trouxe novamente ao debate a questão da responsabilidade que deve ser sempre abordada de uma forma muito séria, sensata e serena, para além de todo o imediatismo precipitado de protagonistas de ocasião que julgam sem factos e sem contraditório, movidos apenas por instintos acusatórios oportunistas, viciados e incoerentes. A questão, não sendo propriamente nova – pois outros trágicos acidentes, ocorridos numa esfera conexa com o exercício de funções públicas ou políticas, deram lugar à mesma discussão – obriga agora a uma reflexão com base em conceitos que não devem ser confundidos.
Não tenhamos ilusões, não existe responsabilidade sem um apuramento competente e rigoroso dos factos num determinado lapso temporal que deve ser cumprido sem grande ruído e perturbação. Só depois, perante a factualidade concreta, se poderá determinar a responsabilidade que não tem sempre a mesma natureza. Podemos falar de responsabilidade criminal, responsabilidade civil e de responsabilidade política ou até de responsabilidade ética ou moral, conscientes de que, embora se possam tocar ou cruzar, devem ser tratadas de forma diferente e em diferentes planos. Se se confundem conceitos e se o ruído e a ignorância cega imperam, então a sociedade fica mais pobre.
A responsabilidade criminal ou penal depende do preenchimento de pressupostos legais específicos relacionados com a prática de um crime, mesmo que por negligência. Não é uma responsabilidade instantânea e o seu apuramento ocorre num contexto processual que deve respeitar a presunção de inocência e assegurar todas as garantias de defesa. Só há responsabilidade criminal depois de cumprido todo o ritual processual e com uma decisão judicial definitiva, ou seja, em última instância, não suscetível de recurso. Pode dar lugar a responsabilidade civil e a responsabilidade política, mas é tratada apenas à luz do direito penal.
A responsabilidade civil não depende necessariamente da existência de responsabilidade criminal. São coisas distintas. Está relacionada com a obrigação de reparar determinados danos patrimoniais ou não patrimoniais, independentemente da existência de crime. É o caso da responsabilidade decorrente de acidente com obrigação de reparação dos danos, muitas vezes transferida para uma seguradora.
Depois temos a, talvez mais mediática, “responsabilidade política”. O Presidente da República disse recentemente, a propósito do acidente do Elevador da Glória, que “o juízo sobre a responsabilidade política, em cargos eletivos, é dos eleitores” dando, depois, o exemplo concreto da confiança eleitoral reafirmada a um Governo da República que “eu não exonerei”. “Portanto há posições diferentes sobre essa matéria, mas não vale a pena discutir se há ou não responsabilidade política porque essa há, não quer dizer demissão necessariamente, muito menos a esta distância de eleições, não quer dizer que o eleitorado reaja de uma forma ou de outra, reage apreciando um conjunto de circunstâncias no momento em que decide”, referiu Marcelo Rebelo de Sousa. A justiça do “juízo dos eleitores sobre a responsabilidade política” depende, pois, muito da consistência da informação que chega à sociedade, daí a importância de todos continuarmos a combater todas as plataformas de desinformação. Quanto mais esclarecida estiver a sociedade, mais justo e assertivo será o juízo do eleitorado “sobre a responsabilidade política”.