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A Esperança que nos dás María Corina Machado/Prémio Nobel da Paz

Em março de 2018, Naiara Galarraga Gortázar escreveu um artigo, no El País, que fazia a “Radiografía del gran éxodo venezolano”. A saída em massa de venezuelanos começa a ser bastante visível em 2015 e tornou-se uma das maiores crises humanitárias do hemisfério ocidental. Dos diversos casos retratados, sobressai a vida de Carlos Raúl Toro. A 27 de julho de 2016, Carlos Raúl Toro tomou uma decisão que mudaria a sua vida para sempre: embarcou, sozinho, num voo direto de Caracas para Madrid. Para trás ficou a sua mãe e as duas irmãs pequenas. Ele não migrou por querer viver uma aventura de juventude, nem por nenhum desejo de busca de riqueza e ascensão social. Migrou porque não havia futuro. Migrou porque tinha fome e medo. Migrou porque não tinha Esperança. A sua voz serve para percebermos a desintegração social da Venezuela.

Estimava-se, em 2018, que aproximadamente 1,6 milhão de venezuelanos deixaram o seu país. 87% da população vivia na pobreza, com a inflação desmesuradamente elevada e insuportável para quem teme não sobreviver. Os destinos mais procurados, naquela altura, eram Colômbia, Peru, Chile, Espanha e EUA. O caminho a ser percorrido era de uma dificuldade inumana. As viagens longas, os obstáculos burocráticos e a exploração destas pessoas faziam antever o preconceito e a exclusão. 2018 foi já há algum tempo. No entanto, a situação não melhorou. O número de migrantes venezuelanos aumentou drasticamente desde então, e os países de acolhimento tiveram de adaptar as suas políticas públicas, os sistemas de saúde, educação e proteção social para os receber.

Entretanto, em 2020, tivemos de fechar portas. Veio a pandemia. O tormento foi ainda maior para os amigos da Venezuela que tiveram de “Desandar el camino en medio de la pandemia” (ver artigo de Santigo Torrado e Alonso Moleiro de 2020). Os migrantes venezuelanos, devido à COVID-19, viram-se obrigados a voltar para trás, ao país de origem, por conta da vulnerabilidade extrema a que estiveram sujeitos. Milhares de venezuelanos regressaram à Venezuela a pé, sem meios, após perderem os empregos na Colômbia. A título de exemplo, em dois meses, março e abril de 2020, aproximadamente 4.000 pessoas cruzaram a fronteira de volta à Venezuela. O Governo colombiano, apesar dos esforços de acolhimento, enfrentava dificuldades enormes por não ter meios, nem apoio internacional, agravando a crise humanitária.

Ainda que o poder instalado na Venezuela tivesse tentado capitalizar politicamente esses regressos, com slogans como “Bem-vindos à Pátria”, a mordaça política e as condições de vida eram tão iguais ou piores do que quando saíram. O programa “Vuelta a la Patria” promoveu regressos organizados (aproximadamente 10.000 pessoa até 2020), mas nem por isso os venezuelanos quiseram ficar.

Os dados mostram que quase 8 milhões de venezuelanos vivem fora do seu País. A crise tornou-se ainda mais complexa com a chegada de populações vulneráveis e os desafios da integração são visíveis, mas passíveis de solução. O artigo de Naiara permanece atual como retrato do início da tragédia migratória venezuelana. A crise venezuelana tornou-se complexa, exigindo respostas articuladas e sustentáveis. A história desses migrantes não é apenas sobre fuga e sobrevivência, mas é antes uma grande lição sobre resiliência, reconstrução e desejo de retorno — que muitos ainda mantêm, mesmo diante de uma Venezuela que permanece imersa em crise.

Porque escrevo sobre a Venezuela? Porque há, agora, nela um Nobel da Paz: María Corina Machado. María Corina Machado é o orgulho de quem compreende que a democracia não existe sem Liberdade e Justiça. A sua luta pela Paz é a luta de todos os que amam a possibilidade da Esperança. Dentro e fora da Venezuela.