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“Pormaiores”

Tinha tudo já pensado para continuar esta minha sanha contra o absurdo inominável que é o processo da taxa turística e, de repente, acontece isto. E como não consigo fingir que não vejo o elefante quando ele está mesmo a meio da sala, lá tive de virar o azimute para outro lado, sendo certo que tornei a gestão de caracteres mais fácil; só a minha lista de outras taxas que já pagamos levava-os todos!

Aceitem por favor, antes de tentar juntar ideias, uma declaração de interesses: - Alguns dos nomes que vi citados como estando envolvidos neste imbróglio são meus amigos e, se calhar, isso condiciona a maneira como olho para o tema.

Não é isso que me impede, no entanto, de convidar a que reflictam comigo sobre o que está a acontecer, sendo que em circunstância nenhuma vos traria aqui libelos acusatórios contra ninguém; o que me move é algo bem diverso da questão da culpa.

A nossa prática de vida em sociedade, que é exponenciada pelo (reduzido) tamanho dos círculos em que nos movemos, dá nesta sensação de legitimidade de um certo de tipo de comportamentos. Eu conheço alguém que exerce alguma função, logo vou pedir-lhe um favor, um jeitinho, uma cunha. E é mesmo muito chato, para não dizer indelicado, se esse alguém não me ajudar, claro está.

Em algum momento das nossas vidas todos fizemos isto, sendo que alguns fazem-no constantemente. A propósito de tudo e de nada. Às vezes até sem necessidade.

A cultura do facilitismo existe! Ela vale para marcar uma consulta num centro de saúde, para arranjar uma escola para um filho, para pedir um papel num instituto qualquer, para tentar fazer andar um processo mais rapidamente.

Isto depois escala. Ou pode escalar… Começam a pedir-se informações privilegiadas, a distorcer regras que só são válidas para alguns, a prejudicar propositadamente outros. E ainda devem existir os tais casos em que os favores são pagos, seja em dinheiro, em férias ou com um apartamento oferecido algures.

O problema para mim está na base e há muitos anos que não consigo relativizar estes comportamentos ditos menores. São os tais “pormaiores”…

Não resolvendo esta lógica de que o jeitinho faz parte e burro é quem não se aproveita do conhecimento que tem, tudo o resto é uma questão de tempo. Porque quem rouba um iogurte também rouba um carro, se tiver essa oportunidade.

O tráfico de influência existe, é comumente aceite, praticado pela grande maioria de quem o pode fazer e normalizado porque nunca se sabe quando não é a nós que vai dar jeito usar o tal conhecimento. Tudo o resto vem por acréscimo.

Alguns acham que isto vai ser o princípio de um novo fim. Eu, descrente excepto em questões de fé e do Benfica, acho que não vai lá nem com um malho! Porque falta consciência e, sobretudo, falta a noção do que é verdadeiramente certo ou errado há séculos…