Crónicas

Porto Santo, estratégia contra a sazonalidade

Não fiquem sentados, assobiando para o lado, esperando invenção ocupacional que não existe. Ou há mais golfe ou não haverá mais turistas no inverno

600 anos depois da redescoberta pelos portugueses e 50 anos depois da Autonomia regional, o Porto Santo ganhou um estatuto que importa analisar.

Desde logo, reivindicativo e exigente no que concerne a dispor de tudo o que se afigura importante. O investimento público foi massivo e procurou corresponder ao solicitado pela população residente e pelos “influencers” da Madeira. Para além de justo correspondeu a objectivos políticos eleitorais.

O pecado original foi tudo ser feito na esfera do que agradava aos porto-santenses e não o que ajudava o Porto Santo em termos de sustentabilidade futura.

Visto de forma resumida, os seus cinco mil residentes vivem muito melhor que antes e a Ilha mantém a preferência como praia de férias dos madeirenses, 60.000 que pernoitam pelo menos uma noite nos três meses de verão.

O Porto Santo nunca será igual no verão e no inverno. Os madeirenses, que não ocupam camas turísticas, farão a diferença.

Actualmente, tem 4.311 camas (hoteleiras e alojamento local) que proporcionam 520.000 dormidas todo ano, das quais metade nos três meses de verão. Resulta uma ocupação anual de 33 por cento. 64 por cento no verão.

Em três meses de verão tem tanto como em nove meses de “inverno”, já beneficiando de grande ocupação no único campo de golfe existente. Isto é a sazonalidade tanto criticada, agravada se adicionarmos todos os madeirenses que vão a Porto Santo no verão e instalam-se em casa própria, alugada ou em uso diverso.

Acabar com a sazonalidade é, assim, dar ocupação, igual todo o ano, às camas turísticas (hoteleiras e AL), admitindo-se que haverá algum crescimento.

É natural que sejam construídos novos hotéis. O Grupo Savoy, mais cedo que tarde, fará a sua expansão para a Ilha Dourada. O Grupo Pestana já está edificando um novo hotel e pode ocorrer outro qualquer investimento de terceiros.

Suponhamos que o total de camas turísticas atinge um número à volta das seis mil. Para uma ocupação de 64 por cento nos nove meses de “não-verão” precisamos um milhão de dormidas, para o que já temos as actuais 250 mil. Ou seja, o fim da sazonalidade implica mais 750 mil dormidas.

O Porto Santo já debateu este tema em múltiplas ocasiões, sem qualquer consequência. Muitas opiniões mas pouco ou nada foi feito. Continua a ser visto como um destino de praia, sol e água temperada quando, na verdade, assim é apenas no verão e … tem dias. No inverno tem mais turistas no golfe que na praia. Só com um campo. Os turistas estrangeiros, de todo o ano, preferem a piscina á praia. Querer eliminar a sazonalidade “enganando” o visitante não é solução. Promover o sol e praia só enche o verão. O Porto Santo só ocupará os nove meses de “inverno” quando tiver um produto estruturado, apetecível e rentável.

Fazer como os outros fazem. Copiar o que é possível reproduzir.

O Algarve é só praia no verão e consegue grande ocupação nos demais meses do ano com quarenta campos de golfe. A costa alentejana (Tróia, Comporta e Sines) já tem meia dúzia de campos de golfe já que, todo o ano, o mar é sempre frio. Canárias já tem vinte campos de golfe, mesmo com clima de sol todo o ano. Marrocos tem trinta e cinco campos de golfe. O sul de Espanha tem dezenas. O que é comum a todos estes destinos ? Inverno com clima agradável e ameno para a prática do golfe em excelentes campos. Ainda assim, têm dias impraticáveis no Algarve, sul de Espanha, Baleares, Marrocos e Alentejo.

O Porto Santo é privilegiado para a prática do golfe. É o único local em toda a Europa onde se pode garantir golfe todos os dias do ano. Nem no verão é demasiado quente nem muito frio no inverno. As três regras que impedem a prática do golfe nunca acontecem em Porto Santo: nevoeiro, trovoada e “greens” alagados. Permite promover o destino assegurando que, se tiver reservado, se não jogar golfe não paga estadia nessa noite. Um privilégio promocional. Ninguém mais pode oferecer igual.

Foi a pensar nisto que, em 1995, fiz um campo de treino de golfe em Porto Santo, ali levei Severiano Ballesteros e Cabell Robinson (Palheiro) e, incentivei Alberto João Jardim a incluir no PDM o plano que criei com o Arq. José Paradela. Onde hoje está o campo e que substituiu a “loucura” anterior de o projectar para junto da praia e das dunas, entre o Hotel do Porto Santo e a ponta da Calheta.

Ora, não conheço, e ninguém até agora mencionou, uma única ocupação para os nove meses de “inverno” no Porto Santo. Ninguém fala nem quer saber.

Vou me atrever a sugerir o golfe como solução, documentando o que proponho. Está facilitado por estar provado, pela ocupação do actual campo por dinamarqueses, que é “fácil” ter 250 jogadores diários no inverno. Depois de vinte anos de desconfiança sobre o investimento, como tudo o que advém da ignorância. Um dos poucos investimentos feito a pensar no Porto Santo e não nos votos eleitorais. Talvez tenha tirado alguns.

Ora, se tivermos mais três campos de golfe (um segundo já está projectado por Ballesteros e tem terreno já adquirido pela Sociedade de Desenvolvimento a poente do actual campo, enquanto os outros dois a construir em terreno baldio a nascente do actual, entre a ventoinha eléctrica, o aeroporto e a costa norte) serão mais 750 jogadores diários. Ficando cada jogador uma semana e jogando cinco dias. Cerca de um terço estarão acompanhados no quarto por outro jogador, enquanto a maioria terá um ou mais acompanhantes não praticantes. Resta acrescentar que a utilização pelos actuais dinamarqueses ocupa apenas 35 por cento do campo no inverno. Este período, com mais prática do golfe, proporcionará adicionais 120.000 mil dormidas.

Resumindo: o golfe, excluindo os actuais dinamarqueses, proporcionará, no inverno, mais de 650.000 dormidas.

Ficamos assim, a cem mil dormidas do “milagre” do fim da sazonalidade.

Ou seja, a grande maioria da sazonalidade ficaria resolvida com o golfe sendo que, as cem mil dormidas em falta, seriam/serão angariadas pelos novos hotéis e outros novos alojamentos, nomeadamente loteamentos imobiliários em curso ou em preparação.

O turismo residencial será o dos madeirenses que procuram casa de verão e os estrangeiros para golfe no inverno. Casas em local onde não há ocupação ninguém está interessado em comprar.

São dez voos semanais de jogadores e acompanhantes provenientes do Reino Unido, Alemanha, Escandinávia, Espanha, Portugal, etc.

Teremos uma ocupação turística anual média de 65 %, mantendo o frenesim de Agosto com as férias dos madeirenses. Têm melhor alternativa ? Não se ouve … nem de governos, oposição, população local, madeirenses ou outros curiosos habituais visitantes de Porto Santo. Sempre há a solução de, mais uma vez, cruzar os braços e esperar que a vontade de fazer passe.

Um exemplo: o Grupo Pestana tem no Algarve cinco campos de golfe para preencher hotéis e residências turísticas durante o “inverno”.

Eu não estou inventando nada.

Ballesteros dizia haver dez mil praticantes de golfe em Madrid que não têm campo de golfe ao fim de semana. No verão conduzem a sua viatura durante horas para norte e, no inverno, procuram campo disponível no sul. Bem podiam chegar em duas horas ao Porto Santo.

Os dinamarqueses são tudo menos praticantes de golfe. Andam por ali. Pagam pouco mas mostraram que o Porto Santo é destino prefeito.

A malta do contra fará críticas como de costume. Começarão pela questão da água. Hoje, em todo o mundo civilizado, já é proibido regar campos de golfe com água natural. É preciso dessalinizar, promover a reutilização por “etar” ou outro processo. No Porto Santo já é assim e continuará a ser. Quem tem clima ameno no inverno, em regra, não tem água abundante. Onde esta não escasseia é, normalmente, mau local e clima para jogar golfe no inverno.

Em conclusão: a sazonalidade no Porto Santo combate-se com mais ocupação do existente parque de camas turísticas. Outros investimentos ajudarão, com incentivo para o turismo residencial. Mas o que há já chega para uma dinâmica anual activa.

Mas não fiquem sentados, assobiando para o lado, esperando uma invenção ocupacional que não existe. Ou há mais golfe ou não haverá mais turistas. Ponto.

Um exemplo do que está a ser feito é o investimento desportivo em campos de ténis e “padel”. Para quem? Madeirenses no verão e portosantenses todo o ano. Não resolve nada de novo. Mais uns votos e nenhum novo turista.

O governo regional anunciou a construção de nove buracos de golfe (meio campo). É um investimento para os portosantenses e não para o Porto Santo. Pretende dar espaço aos portosantenses e aos madeirenses quando o campo está cheio com dinamarqueses. Assim se vai gastando dinheiro no Porto Santo. Santo Deus!

O Porto Santo precisa de soluções próprias e adequadas à sua realidade. Com coragem e dinamismo há que justificar os grandes investimentos realizados ou em construção. Admito não ter razão. Mas penso e proponho para que se avance. Nem que seja para que se faça diferente. Ficar tudo na mesma é a História de Porto Santo.