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Pensando no stress

Frequentei recentemente uma formação sobre a gestão de stress. Esta formação voltou a lembrar-me daquilo que, regularmente, acaba por ser ignorado, suprimido e até esquecido durante os períodos longos da nossa vida diária. Isso é: a necessidade de parar. Parar para nos ouvirmos a nós próprios, parar para respirar, parar para poder pensar e refletir sem pressão e parar para poder controlar e desmanchar as ações e reações já automatizadas, ao nível físico, mental e emocional, que, dum ponto de vista racional, não deveriam acontecer. Só que a vida é tudo menos racional, ela confronta-nos com situações que não nos dão tempo para respirar e recompor, e às vezes assemelha-se a um comboio rápido que nos deixa com duas opções só: agarrar-se a ele e aguentar custe o que custar ou abrir a mão e vê-lo desaparecer na distância.

A velocidade com que tudo se passa na vida de hoje é incomparável com a velocidade de até há 50 anos atrás e seria já inconcebível para alguém do século XIX. Mas a evolução do ser humano, do ponto de vista meramente biológico (a evolução do cérebro) parou há cerca de 10 mil anos atrás. As adaptações que aconteceram nos últimos 2 mil anos são muito incrementais e difíceis de observar, porque a evolução é um processo muito lento (do nosso ponto de vista) e gradual, e depende muito de variáveis circundantes. Por isso, encontramo-nos severamente mal-adaptados para lidar com uma panóplia de situações desafiantes que o nosso subconsciente identifica e interpreta de mesma maneira como o fazia centenas de milhares de anos atrás.

Uma vez que a vida em si não vai parar, as fontes de stress só se vão intensificar, e o desafio e a nossa má equiparação só vão aumentar, é óbvio que não podemos ficar à espera dum milagre ou serendipidade externa para nos proporcionar qualquer alívio. A única esperança de sobrevivermos com a saúde psicofísica ainda tolerável é de pensar e agir de dentro para fora. Temos de trabalhar a nossa calma interior para a poder projetar para fora. No entanto, não é fácil ter a força de vontade e a tenacidade para gerar a calma e ainda mais difícil é de mantê-la e projetá-la. Para isso, precisamos de disciplina, talvez através dum regime de atividade física que nos ajude a dar atenção ao nosso corpo e a sintonizar a ação do corpo com a atividade mental e emocional. É recorrendo a essa atividade que nos podemos recompor, recarregar e trabalhar numa resposta mais adequada e proporcional aos estímulos externos e internos.

Não é fácil ter a capacidade e manter a força de vontade para implementar e seguir um regime destes – é mais ou menos como as decisões às quais nos vinculamos com muita convicção no dia 1 de janeiro e que acabam por não serem seguidas por muito tempo. Muitas vezes também se afigura impossível eliminar as fontes externas do stress que não dependem de nós. Mas, desde que consigamos ter presente na consciência a complexidade do assunto e os caminhos possíveis para a ação, isso já representa um pequeno passo no caminho para a preservação do bem-estar psicofísico.

E, sem querer puxar a proverbial brasa para a minha sardinha, a música (escolhida a gosto pessoal, claro), vivida em qualquer uma das maneiras possíveis – tocada, ouvida, sentida na cabeça – tem também o poder de suavizar o nosso stress e a ansiedade, de reencaminhar os nossos pensamentos, tal como de nos presentear com momentos de alívio e nos dar fôlego das inúmeras pressões que tendem controlar as nossas vidas.