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Não é possível fugir

Não é possível fugir, completamente, ao tema do momento. É possível, talvez, adoptar uma postura, o mais equidistante possível das posições dominantes, sem perder a capacidade de análise e de crítica construtiva.

Começo por fazer uma declaração de interesses: sou ateu, agnóstico, não tenho, nem nunca tive, filiação em nenhum partido político, nem sequer tenho clube de futebol. Também não votei em Marcelo Rebelo de Sousa. É público e foi publicado que fiz parte da candidatura de Sampaio da Nóvoa.

A situação política e social a que chegou o nosso país, não pode deixar ninguém indiferente. A um cidadão que não tenha informação privilegiada, como é o meu caso (não me chamo Marques Mendes…), é lícito aventar qualquer conjuntura, porque é um assunto que, de um modo ou de outro, toca a todos.

O que parece é que o Presidente da República (PR) e o primeiro-ministro (PM), no fim de anos de convivência forçada, resolveram que era a altura própria para se afastarem e autonomizarem posições. Esta situação terá sido espoletada pelo desatino que tem reinado em diversos ministérios e outras instâncias do governo. O resultado é o que parece ao cidadão comum: um jogo de poder que não beneficia os próprios nem os portugueses em geral.

António Costa, numa atitude de aparente birra (que, certamente, terá razões que não expõe) tem gerido a situação, como hábil político que é. Capaz de dizer qualquer coisa e o seu contrário com o mesmo ar, tomou a decisão – que já se esperava – de defender intransigentemente o seu governo, mesmo os ministros que o senso comum mandaria substituir.

Aparentemente, AC ganhou um primeiro “round”, com o PR, mas não se livrou de se tornar alvo preferencial de toda a oposição e da opinião pública e publicada.

O PR, obviamente, ressentiu-se da situação e, como muito inteligente que é, tem estado resguardado (com raras e significativas aparições públicas), aparentemente, a aguardar a oportunidade e a ocasião própria para mostrar que não engoliu, de boa vontade, o sapo que lhe foi “servido” por António Costa.

Este, por sua vez, colocou-se numa situação de grande vulnerabilidade política hipotecando a sua posição e, por arrasto, a do governo, a uma situação anedótica acontecida em um ministério de um ministro que tem demonstrado não ter perfil para o cargo.

O que os protagonistas dizem ter acontecido, no ministério das Infraestruturas, na tal noite fatídica, seria ridículo, absurdo, surreal, risível, não fora a dimensão que o assunto tomou, pondo em causa o normal funcionamento das instituições do Estado Português e o próprio Estado.

O episódio e os muitos ecos que tem criado, desde a Assembleia da República (onde António Costa já foi ouvido, estoicamente, durante mais de 6 horas) à rua.

Haja ou não haja alternativa a este governo, como quase toda a gente parece acreditar, a situação que se vive agora com a paralisação do governo, o descrédito dos governantes, a propagação despudorada de mentiras e cenários irreais, a fuga do primeiro-ministro e de outras figuras do governo às perguntas incómodas que lhe são feitas, não pode continuar.

De tal modo que, até Cavaco Silva, saiu debaixo da pedra onde tem estado para instilar um pouco do seu veneno.

Não advogo, como muitos requerem, a dissolução da Assembleia da República ou a demissão do governo.

O que eu gostaria era que o governo governasse, que os ministros que já deram provas de não saber como lá foram parar, fossem substituídos por gente séria e competente que se preocupasse em resolver os muitos problemas que afectam a Nação.