Crónicas

As roxas sextas-feiras

Muito se discute na Madeira sobre o que poderia ou deveria ser o posicionamento da ilha em relação ao Turismo. Um dos temas sempre presentes é dos públicos alvos, para quem se comunica, a quem dirigimos a nossa oferta, os mercados emissores tradicionais ou comunicar e explorar novos. E é um bocadinho como no futebol, todos somos um bocadinho treinadores de bancada, todos temos uma opinião e algo a dizer ou a acrescentar. Do que vemos, da nossa experiência e do que vamos lendo ou ouvindo, das experiências que alguns têm a sorte de ter quando viajam, do que veem lá fora. Temos sempre a tendência para querer plasmar o que vemos lá fora no nosso mercado, especialmente quando gostamos e vemos potencial. Na verdade a nossa ilha é perfeita para o turismo, quer pela segurança, pelas condições meteorológicas, ou pela gastronomia, as pessoas que parecem nascidas para receber e vocacionadas para o tratamento dos outros, a arquitetura dos espaços e a oferta hoteleira de excelência. Funciona para todo o tipo de turistas, agrada aos mais novos e aos mais velhos mas como todos sabemos o nosso mercado atual é composto sobretudo por faixas etárias mais elevadas, pessoas que procuram essencialmente descanso e qualidade, natureza e qualidade de vida, comida e bebida boa, poucas ou nenhumas chatices e um clima ameno que permita a quem vem do frio andar de calções e t-shirt praticamente todo o ano.

Há quem diga que atrair um público mais jovem acaba por descaracterizar o modelo atual e obriga a uma reformulação das condições existentes. Nem sempre tem de ser assim, comunicar para um público mais jovem também pode e deve ser selecionado para um tipo de público que naturalmente quererá mais entretenimento mas que nem sempre tem que trazer consigo confusão, problemas ou fracos gastos no destino. O conceito encontrado pela Estalagem da Ponta do Sol é disso reflexo. Não preciso de descrever aqui a qualidade do espaço, que é do conhecimento de todos, o bom gosto e a localização única com uma vista absolutamente deslumbrante. Falo de uma programação cultural que quem não se limitou a vender quartos e a dormir à sombra disso mesmo. De quem ousa arriscar e ir mais longe, que não se contenta com o habitual e sai da sua zona de conforto. As “Purple Friday´s”, festas da comunidade dos nómadas digitais são disso exemplo máximo. Festas que começam cedo e acabam cedo a mostrar que nem sempre temos que chegar a casa de manhã para nos podermos divertir e ouvir boa música, onde se sente uma liberdade de ser sem os constrangimentos habituais de um hotel mas que não implica que o mesmo vire uma bagunça, onde gente de diversas nacionalidades se encontra para partilhar experiências e dançar com vista para o mar. Sim é para uma comunidade de jovens que aproveitaram as condições únicas da Madeira para montar os seus projectos, mescladas com alguns locais mas é acima de tudo o assumir de uma cultura de diversão que pode ser respeitadora dos valores do sítio “invadido” e em perfeita sintonia com a comunidade local. Mas a determinação em querer diferente não se fica por aqui, os ecléticos concertos de verão fazem deste um espaço bem especial.

Nem tudo tem que ser quadrado ou fechado e não devemos dar por adquiridos certos preconceitos que podemos ter realizado por algumas experiências mal conseguidas. Podem e devem haver regras, podem ser escolhidos os públicos e criadas condições para que também pessoas mais jovens se sintam atraídas pela ilha. Nesse particular existem dois espaços no Funchal que muito têm feito pela música eletrónica da Madeira. O mini Eco que já leva uns bons anos sempre na crista da onda, com uma programação de qualidade dando espaço aos djs da terra e a oportunidade a um público refinado, de beber um copo ao som de boa música, com excelente ambiente, que podia bem ser um sítio enquadrado em qualquer outras cidade europeia que seria sempre bom. Espaços como este não são só importantes como são necessários preservar porque nos permitem oferecer qualidade a quem nos visita e a quem por cá vive. Eu sei que às vezes a noite não se coaduna com o dia e que são difíceis de conciliar mas a noite também existe e o entretenimento é essencial como escape para dias de trabalho cansativos e o stress psicológico. O Marginal, um dos espaços da discoteca Vespas é outro que muito tem feito pela cultura musical diversa e que nos aproxima de outras latitudes. Talvez mais mainstream, com um ambiente mais jovem mas que se procura atualizar em termos musicais com uma belíssima curadoria de um dos melhores djs portugueses ( Hernandez ) e com um sistema de som e equalização raro de ver por estas bandas.

Isto para dizer que é importante conseguirmos dar espaço aos que trabalham em bom em vez de querer extinguir a noite por trazer uma série de problemas atrás com os quais não queremos ser confrontados. Não queria deixar de chamar a atenção para essa droga que por aí anda a circular ( Bloom ). Isso sim deve ser combatido e fiscalizado. A forma como está a alastrar por cá, é um problema muito preocupante ao qual devemos prestar muita atenção, pelas vidas que estraga e pelo desequilibro social que traz às costas. Não o devemos limpar para baixo do tapete mas sim encara-lo de frente.