Crónicas

Livre de Sexismo

Eu quero viver numa sociedade respeitadora, justa, livre e igualitária. Mas humana. Sempre humana. Não quero para mim viver dentro de um jogo de computador

Multiplicam-se os movimentos e os estudos com o objectivo de mecanizar e robotizar a sociedade. De espalhar a confusão. Criar a dúvida e de misturar conceitos puxando para a praça pública discussões que nada têm a ver com o nobre objectivo de certas lutas e reivindicações. Que a luta contra a xenofobia e o racismo deve ser transversal a toda a sociedade? Claro que sim. Que todos nós devemos trabalhar para combater e erradicar de vez a homofobia e a misoginia? Acho que qualquer pessoa hoje em dia no pleno das suas capacidades deveria ter isso como premissa na sua construção pessoal. Que devemos combater o extremismo os preconceitos e os desequilíbrios do Mundo com mais extremismo, com condicionantes e espartilhos? Sou frontalmente contra.

Cristiana Vale Pires, investigadora de pós-doutoramento na Universidade Católica do Porto e colaboradora da Kosmicare (organização empenhada na “boa governança” da vida noturna) é uma das impulsionadoras da ideia de colocar nos bares e discotecas a sintética “Livre de Sexismo - Por um prazer nocturno igualitário”. Quando vir esta imagem num estabelecimento significa que o mesmo “adoptou um conjunto de procedimentos para minimizar o risco dos seus clientes serem importunados sexualmente”. Ou seja os toques indesejados, as músicas hipersexualizadas e os comentários sexistas não serão tidos como normais naquele espaço e os próprios funcionários estarão formados para saberem reagir a esse tipo de situações. Segundo o mesmo estudo baseado num inquérito feito a 12 mulheres entre os 16 e os 42 anos os promotores de eventos, festas e espectáculos devem ser co-responsabilizados caso alguém prevarique.

Na verdade o que este tipo de gente quer , não é verdadeiramente proteger as mulheres porque esse é um caminho natural, o de uma sociedade que se desenvolva através da equidade e essa só pode ser atingida com a vontade das pessoas em mudar, mudando mentalidades e responsabilizando os prevaricadores, fazendo-os assumir as responsabilidades perante a lei mudam-se obrigatoriamente atitudes. O que estas pessoas querem é transformar-nos em robots, alterando a dinâmica das relações e dos sentimentos para algo mecânico, contratual, predefinido e isto é um problema que se alastra. Pessoas que defendem o boicote aos clássicos animados da Disney por transmitirem mensagens homofónicas, misóginas e racistas, que defendem que obrigar as crianças a cumprimentar os avós com um beijinho estará no limiar do abuso sexual e que acham que uma abordagem numa discoteca deve ser previamente contratualizada ou mesmo extinta é transformar o Mundo num manual de normas onde o medo e a opressão imperam.

Eu quero viver numa sociedade respeitadora, justa, livre e igualitária. Mas humana. Sempre humana. Não quero para mim viver dentro de um jogo de computador onde as pessoas são manipuladas por um comando. Não aceito que nos imponham a dúvida, o receio e onde as regras do próprio jogo permitem várias interpretações que nos põem permanentemente no limbo e nos deixem à mercê de juízes que nos avaliam as intenções ou premeditações. Estamos cada vez mais próximos de termos que assinar um contrato antes de abordarmos alguém e de passarmos do lado de uma certa impunidade para o outro oposto em que facilmente se conseguirá retirar aproveitamento intencional de um simples toque. Está tudo louco, a falta de bom senso é gritante e não sei onde isto vai parar. Com a democracia conseguimos ganhar liberdades que temos vindo a estrangular de uma forma camuflada. Qualquer dia não se pode fazer nada. Aquele chip no braço que vemos nos filmes futuristas está cada vez mais aí à porta. E para isso não contem comigo.