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Novo coronavírus mata mais jovens adultos no Brasil que na Europa

Foto EPA/Fernando Bizerra
Foto EPA/Fernando Bizerra

A proporção de jovens adultos que morrem devido à covid-19 no Brasil é superior à maioria da Europa, principalmente entre a população mais pobre, com maior dificuldade em respeitar o distanciamento social, segundo dados oficiais.

No Brasil, um país com 210 milhões de habitantes cuja idade média da população é muito menor do que na Europa, 69% das pessoas que morreram de covid-19 tinham mais de 60 anos, face a 95% na Espanha ou na Itália, de acordo com os últimos relatórios oficiais.

Essa diferença é explicada, em primeiro lugar, pela pirâmide etária: apenas 13,6% dos brasileiros têm mais de 60 anos, comparado com 25% em Espanha e 28% em Itália. Mas outros fatores entram em jogo.

“Como a nossa população é mais jovem, é normal que a percentagem de mortes seja maior entre os menores de 60 anos, mas isso também se deve ao facto de esses jovens adultos respeitarem menos as medidas de confinamento”, explicou Mauro Sanchez, epidemiologista da Universidade de Brasília (UnB).

A taxa de morte por coronavírus entre pessoas com idade menor do que 60 anos no Brasil, que estava em 19% no início de abril subiu para 31% nesta semana, quando o país atravessou a barreira das mil mortes diárias pela primeira vez.

O Ministério da Saúde brasileiro não fornece informações sobre a faixa etária das pessoas infetadas. Os números oficiais dos casos confirmados poderão estar amplamente subestimados, com especialistas a estimar que são pelo menos 15 vezes inferiores à realidade.

Segundo estimativas do coletivo de investigadores ‘Covid-19 Brasil’, o país tem mais de 3,6 milhões de pessoas infetadas, contra as 310.000 oficialmente diagnisticadas, segundo o último relatório oficial do Ministério da Saúde do país.

De acordo com essas projeções, as duas faixas etárias mais contaminadas têm entre 20 e 29 anos e 30 e 39 anos, com mais de 580.000 casos cada, duas vezes mais do que as pessoas com idade entre 60 até 69 anos.

“Sabemos que existem diferentes formas de coronavírus circulando no mundo, mas nenhum estudo até ao momento demonstrou ser mais virulento em jovens no Brasil”, disse Patricia Canto, pneumologista da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), um instituto de pesquisa de referência.

“Mas os números são preocupantes porque mostram que muitos jovens não tomam as precauções necessárias e estão expostos ao vírus, enquanto também correm o risco de ficar gravemente doentes com a doença”, continuou Canto.

“Mesmo que a maioria dos jovens adultos infetados não precise de ser hospitalizada, os serviços de saúde ficam ainda mais saturados porque não recebem apenas os idosos”, acrescentou Mauro Sánchez, epidemiologista da UnB.

Para este pesquisador, “a maioria dos que não respeitam o confinamento sai de casa porque não tem escolha”, uma alusão aos milhões de trabalhadores pobres cuja renda depende exclusivamente do setor informal.

“Se o Governo adotasse uma política de ajuda em massa para os mais vulneráveis, talvez as pessoas ficassem mais em casa”, avaliou Sanchez.

O Governo brasileiro concedeu um subsídio de 600 reais (cerca de 100 euros) para trabalhadores informais. Mas muitos deles tiveram problemas para se inscrever e registaram-se longas filas fora das agências do banco público Caixa Econômica Federal.

Julio Croda, especialista em doenças infecciosas da Universidade de Mato Grosso do Sul, diz que jovens adultos pobres também têm maior probabilidade de serem seriamente afetados pela doença.

“Muitos deles não têm acesso a uma dieta saudável e têm muitas comorbilidades significativas, como obesidade, hipertensão ou diabetes”, avaliou o pesquisador.

“Isso prejudica o discurso daqueles que defendem o isolamento vertical, que consiste em limitar apenas os idosos”, acrescentou.

O isolamento vertical, uma proposta do Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, que defende que apenas as pessoas com comorbilidades, idosos e outros que se enquadram em grupos de risco deveriam fazer isolamento social, foi criticado pelo especialista.

“A partir do momento em que Bolsonaro defende uma linha sem nenhuma base científica, podemos dizer que ele coloca a população em perigo”, concluiu.

Até esta quinta-feira o Brasil registava 310.087 casos de covid-19 e 20.047 mortes provocadas pela doença.

A nível global, segundo um balanço da agência de notícias AFP, a pandemia de covid-19 já provocou quase 330 mil mortos e infetou mais de cinco milhões de pessoas em 196 países e territórios.

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