O valor do comércio entre os EUA e a União Europeia
Ao longo dos últimos meses muito se tem falado sobre o acordo comercial com os Estados Unidos, desde as motivações da administração Trump à (ténue) reação da União Europeia. Mas afinal o que representa e o que vale o comércio transatlântico entre os EUA e a UE?
Estimam-se que mais de 16 milhões de postos de trabalho, diretos ou indiretos, dependam desta relação, de ambos os lados do Atlântico. Só as empresas europeias empregam 5,3 milhões de trabalhadores nos EUA. As americanas, por sua vez, asseguram 4,6 milhões de empregos na Europa.
A escala desta relação é incomparável. O comércio de bens entre EUA e UE atingiu em 2024 um valor recorde de 976 mil milhões de dólares, muito acima do registado com a China. Em serviços, a balança atingiu 475 mil milhões de dólares. Somando o investimento direto e a integração das cadeias de valor, falamos da maior relação económica bilateral do mundo, que representa cerca de um terço do PIB mundial e metade do consumo global. É a prova de que a prosperidade, europeia e norte-americana, depende de uma relação comercial e estável.
Este equilíbrio foi colocado em causa pelo plano norte-americano de aplicar tarifas “recíprocas”. O sistema multilateral de comércio da Organização Mundial do Comércio assenta no princípio da não discriminação. Ao optar por aplicar tarifas diferentes para cada país, os EUA violam as regras comuns e rompem com o modelo atual, o que gera mais fragmentação e imprevisibilidade. Neste cenário, cadeias de valor inteiras podem ser desestruturadas, com exportadores europeus a serem forçados a renegociar permanentemente perante um processo burocrático em constante mutação que resultará também em custos maiores para os consumidores. É um cenário que ameaça não só o comércio, mas a estabilidade económica mundial, que foi precisamente o que alicerçou a criação da OMC.
O comércio internacional é também uma garantia de estabilidade política, de previsibilidade nas relações entre blocos e de proteção da democracia contra movimentos nacionalistas e isolacionistas. Numa altura em que a Europa enfrenta guerra às suas portas, desinformação massiva e o crescimento de movimentos extremistas que procuram enfraquecer o projeto europeu, a cooperação entre os dois maiores blocos ocidentais é essencial para evitar a queda dos valores democráticos que nos permitiram alcançar os níveis de prosperidade, liberdade e coesão social que hoje damos como adquiridos.
No fim de contas, um acordo comercial justo entre as partes é o mais desejável. Garante estabilidade, protege empregos e reforça os laços que nos unem enquanto blocos ocidentais. Por isso, os termos que à primeira vista podem parecer desvantajosos não são o pior dos cenários. Mais preocupante é a instabilidade e a imprevisibilidade que a política comercial norte-americana pode introduzir, com sérios riscos para a economia europeia. Importa assegurar que a Europa mantém a sua autonomia estratégica e capacidade de decisão, para que esta relação continue a ser um pilar de prosperidade e não uma fonte de incerteza.