SN(S)S – Serviço Nacional do Seguro... de Saúde
No passado dia 4 de agosto, o jornal Público noticiava que quatro em cada dez portugueses têm seguro de saúde. Sim, leu bem: 40% da população, o que equivale a cerca de quatro milhões de pessoas, decidiu garantir uma porta de saída do labirinto que é, cada vez mais, o Serviço Nacional de Saúde.
Segundo dados do Observatório dos Seguros de Saúde – uma plataforma da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões – entre 2023 e 2024 registou-se um aumento de 3,6% na adesão a seguros de saúde. São mais 360 mil portugueses a somar à lista dos “precavidos”. Parece que o investimento estatal no SNS continua a inspirar… confiança. Mas não exatamente da maneira que seria desejável.
Há cerca de três anos, escrevi nesta mesma coluna um texto sobre o investimento do então Primeiro-Ministro, António Costa, no SNS (“O Futuro do SNS”, de 13 de dezembro de 2022). Na altura, para o orçamento de 2023, estavam previstos quase 15 mil milhões de euros para o sector da saúde. Já este ano, o governo de Luís Montenegro decidiu “reservar” uns quase 17 mil milhões. Um aumento notável, sem dúvida. Só é pena que, por algum estranho fenómeno da física orçamental, quanto mais se investe, menos se nota.
E então, perguntamos: por que motivo os portugueses continuam a fugir para os seguros privados, se temos um SNS tão robusto, tão resiliente, tão cheio de verbas e boas intenções? Será que o investimento não se traduz em capacidade de resposta? Que ideia absurda...
Talvez tenha algo a ver com consultas que demoram mais de um ano a acontecer. Ou com as grávidas que têm de atravessar o país para conseguir parir. Ou com os portugueses que esperam décadas (sim, com “d” grande) por um médico de família, enquanto um estrangeiro recém-chegado o consegue em... duas ou três semanas. Ou talvez seja pela metade das urgências do país estarem fechadas por falta de profissionais. Hmmm… mas não, deve ser só uma coincidência estatística. Ou uma “perceção errada” da realidade, como gostam de dizer os decisores políticos.
Mas vejamos: médicos, não faltam – Portugal tem dos maiores rácios médicos por habitante da Europa. Enfermeiros, também não, apesar de muitos andarem por terras de Sua Majestade, devidamente exportados como se fossem belas garrafas de vinho do “Oporto”. Infraestruturas existem – gastas, velhas, por vezes ao abandono, mas lá estão. E dinheiro? Há! O bolo da saúde engorda ano após ano. Então, o que falha?
Gestão. Falha gestão. E da grossa.
Falta reconhecimento, falta organização, falta visão estratégica. E não falo apenas de salários, falo de valorização real das equipas que fazem o SNS funcionar: médicos, enfermeiros, auxiliares, técnicos, administrativos. Gente que veste branco, azul, verde ou qualquer outra cor, mas que todos os dias carrega a saúde de um país às costas.
Mudam-se as caras, mantêm-se os problemas. O SNS, esse, vai-se arrastando. E os portugueses, já habituados a pagar uma vez com impostos, optam por pagar uma segunda vez, com seguros, para garantir que não ficam abandonados à sorte do “tem que aguardar”.
Estamos, portanto, a assistir a um fenómeno curioso: tapamos o sol com a privada. Enquanto isso, o SNS vai-se eclipsando. E entre listas de espera intermináveis e apólices cada vez mais em conta, os doentes vão fazendo as malas... rumo ao setor privado.
Este é o dilema da saúde em Portugal. Seja este laranja ou rosa!