Autonomia e pimenta na boca
A Madeira retornou formalmente ao eixo da “estabilidade política”, com um orçamento e programa aprovados no principal órgão de governo próprio que é a ALRAM, mas, se espremermos aquilo que de lá passou, restam os impropérios do secretário nomeado Eduardo Jesus, dirigidos a alguns deputados, alvos do seu “refinado” sentido institucional cujo polido verniz foi estalado, precisamente no órgão que lhe confere posse. Não isolo este infeliz e sublinhado episódio, de todo o lastro de impunidade e indecência, protagonizado por vários sujeitos políticos, que ao longo de décadas, despejaram em fecunda jactância a sua boçalidade “urbi et orbi”, perante a cavernícola saudação entusiástica em frenesim, da sua acéfala claque tribal.
Contudo, esta alegada firmeza alcançada, não se coaduna com os atilhos frágeis das listas às próximas eleições autárquicas, que tanta celeuma tem sido exposta em várias geografias concelhias do PSD-Madeira. Só no Funchal, que é a maior autarquia do arquipélago, entre convites negados e ruidosos arrependimentos subtis, saltou um candidato em jeito daquelas consultas de recurso, sem qualquer espessura local, que a esta hora nem saberá que equipa alguém escolherá para si. Será que não há “gaja” ou “bardamerda” disponíveis, excetuando a franja de iluminados daquele Monte Olimpo alaranjado, que satisfaçam tão fracos requisitos? Nem que seja no Instituto de Emprego?
Passado o dia da RAM no primeiro dia deste mês, observei o habitual brado generalizado a esbracejar por mais Autonomia, e o choradinho sobre a perda de alguma emancipação da RTP-Madeira, que a maioria dos partidos têm carpido na última semana. O posicionamento reverencial deste canal em relação ao poder político regional, soma décadas. Já em 1992 quando o PS-Madeira tinha nervo, solicitou à ALRAM um inquérito à direção da RTP-Madeira por alegada assimetria na cobertura das ações políticas. Lisboa paga a festa destes comensais, mas não “risca” nada. Será que finalmente acordaram, aproveitando a recente sangria de recursos humanos? Aliás, sinalizei mais indignação dos vários partidos por esta questão, do que pelo assunto adiado do subsídio social de mobilidade, que entre pequenas cosméticas vão mantendo os madeirenses de mão-estendida aos balcões dos CTT, para depois serem ressarcidos do empréstimo que adiantaram ao Estado. Será que as nossas prioridades residem na autonomia de algumas elites serventuárias da Levada do Cavalo, ou, na vida real desta população ultraperiférica? Será mesmo que só o mérito, constância, competência, dedicação e trabalho, apontados pelo discurso de atribuição das insígnias honoríficas madeirenses, são os valores que norteiam, por exemplo, as nomeações da monstruosa máquina de bajuladores do Governo Regional?
Quem pugna por mais autonomia, deve antes, mesmo com pimenta na boca, respeitar a que dispõe.