Porto Santo: longe da vista, longe da execução
Esta semana, uma notícia no DN-Madeira dava conta da habitual “deslocação política” para o Porto Santo durante as férias de verão. A ilha dourada, com a sua paisagem única e atmosfera serena, convida naturalmente ao descanso. Mas também exige responsabilidade política e memória das promessas feitas.
Não sei se os madeirenses ficaram com boas memórias das férias do Presidente do Governo Regional, em 2024. Enquanto a Madeira ardia, Miguel Albuquerque queimava-se (ao sol) no Porto Santo. Foram mais de 5.000 hectares de território destruídos pelas chamas, incluindo 139 hectares de Laurissilva, património mundial. Cerca de 200 agricultores e 41 produtores de gado foram afetados, 120 pessoas tiveram de ser realojadas.
Esperemos que em 2025, a prevenção e a ação nas linhas corta-fogo tenham sido as suficientes para um verão mais tranquilo, apesar do “amarelo-fogo” continuar a cobrir as serras na Madeira. Não por beleza, mas por risco. Representam uma ameaça de incêndio, por falha de intervenção nas serras. A negligência que arde.Por outro lado, acreditemos que esta renovação de férias na Ilha Dourada seja oportunidade para refletir sobre os compromissos com os porto-santenses. A população, ano após ano, solicita o mesmo: combate à sazonalidade, acesso digno a serviços públicos e respeito pela dupla insularidade.
Este último ano ficou marcado com falhas gritantes na saúde, os sinais de abandono são chocantes. Em pleno inverno, o Centro de Saúde esteve meses sem água quente, por avaria nos painéis solares — uma falha básica, que revela desleixo estrutural, falta de investimento e de manutenção. Pior: a nova Unidade Local de Saúde, financiada em 85% por fundos europeus, deveria estar pronta em setembro. Estamos em julho, e a obra permanece parada. Não há desculpas.
Entretanto, com estas falhas, esvanece-se a imagem do Porto Santo como destino de saúde e bem-estar. Palavras como talassoterapia e psamoterapia também perderam força na promoção da ilha.
A história, infelizmente, repete-se.
Projetos estruturantes falham ou ficam pela metade: o “Porto Santo Sustentável”, anunciado em 2018 como ilha 100% livre de fósseis, não chegou a metade. Falhas técnicas e económicas foram apontadas. Aliado à produção de biocombustível a partir de algas — o “primeiro campo bio-petrolífero do mundo” — consumiu 45 milhões de euros e foi cancelado em 2022, por falta de viabilidade. Tornou-se num “elefante branco” a dar boas-vindas a quem visita a Ilha Dourada.
Na agricultura, o apoio à viticultura ficou por meia dúzia de ações pontuais. Não há registo de grandes investimentos públicos específicos, apenas apoio técnico do Instituto do Vinho. A expectativa pública era recuperar vinhas tradicionais e gerar rendimento extra para os agricultores porto-santenses. Não se investiu em infraestruturas e em irrigação – sendo a escassez hídrica uma forte barreira aos agricultores que vivem nesta região. Atualmente, a vinha ativa cobre menos de 16 hectares. Enquanto isso, os Açores apoiam financeiramente de forma robusta os viticultores do Pico com programas específicos, conscientes do valor económico e cultural das vinhas, atraindo já dezenas de milhares de turistas.
Até a recuperação das dunas, com o projeto Life Dunas (2019–2025), avança lentamente. Os alertas sobre erosão costeira datam dos anos 2000. Ainda assim, as intervenções chegam tarde e a conta-gotas.
Porto Santo continua a ser o lugar onde se anunciam intenções e se esquecem execuções. Mas uma Região que se quer coesa não pode aceitar que, por estar longe da vista, Porto Santo continue a ser tratado como destino de verão… e esquecido no resto do ano, longe da ação.