Do que precisa a Madeira?
Todas as pessoas que trabalham há algum tempo, a certo ponto da carreira, já se sentiram como um bombeiro a correr de um lado para o outro a “apagar fogos”, num fenómeno que eu gosto de chamar de síndrome do gestor bombeiro.
Para quem teve a boa fortuna de nunca passar por esta sensação, eu explico. Neste cenário, o nosso dia é preenchido por interrogações e interrupções sobre, e com, problemas do dia-a-dia.
É o verificar relatórios, gerir conflitos na equipa, reorganizar escalas quando há faltas, responder a emails intermináveis, gerir processos administrativos e das relações com clientes e fornecedores, entre muitos outros processos recorrentes.
Esta corrida a apagar fogos consome os dias de trabalho e deixa pouco espaço para tarefas essenciais à sobrevivência de longo prazo, como antecipar alterações ao mercado, adaptar-se a mudanças tecnológicas e regulatórias ou reavaliar as bases da nossa operação.
Este efeito não ocorre só em indivíduos ou no setor privado. A nível macro, a UE é um bom exemplo de como pode ser travada pela burocracia e incapacidade de preparar e executar mudanças estratégicas. A Rússia iniciou uma guerra brutal quando a Europa ainda dependia fortemente do seu gás natural, e apesar de alguns avanços, os países europeus ainda gastam mais em gás russo do que em apoio à Ucrânia.
Por ser óbvio que este efeito pode ocorrer com qualquer profissional ou organização, importa fazer esta análise para a Madeira e o seu futuro.
A Madeira passou por diversos desenvolvimentos num contexto difícil: pandemia, guerra no continente europeu, anos de inflação elevada, incerteza económica e disrupções comerciais entre a UE e o seu principal parceiro.
No meio disto, a Madeira conseguiu reduzir a sua dívida pública – ponderada pelo PIB – investir num novo hospital, modernizar o porto de carga e baixar o IRS ao mínimo que a autonomia permite nos primeiros escalões. Fê-lo com uma política orçamental contra-cíclica, praticando contenção fiscal em período de crescimento.
Ainda assim, não basta olhar para o saldo de dívida. Há prioridades que deviam ser consenso de base para a próxima década: diversificar a economia para não viver só do turismo, elevar o nível educacional, resolver a habitação, rever o regime de IVA, exigir maior autonomia governativa e fiscal, inverter o envelhecimento demográfico, acompanhar o avanço tecnológico, modernizar a contratação pública tornando-a independente de cores políticas e descentralizar fisicamente a administração regional.
Para atuar eficazmente precisamos não só de visão estratégica e capacidade de execução, mas também de um reforço da nossa autonomia, fiscal e legislativa, que nos permita atuar em todos os vetores estratégicos da Região.