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A agressividade anda no ar

Agir sem refletir, sem pensar nas causas e nas consequências é perigoso

A democracia, a solidariedade, o respeito pelo outro, o sentido comunitário e tantos outros valores que eu considerava nossos, integrados numa sociedade que cresceu e amadureceu na empatia e direitos humanos, está a ruir. Compreendo que os movimentos de evolução são cíclicos e que por vezes revisitam modelos de outros tempos. Mas, pensava eu que havia conquistas inabaláveis e que revisitá-las só serviria para analisar a história e continuar a querer mais e melhor para o lugar onde vivemos assim como para toda a humanidade. Enganei-me.

Fui ingénua e desatenta a pequenos grandes movimentos dos sistemas que iam governando o mundo e dos influenciadores de mentalidades que desde há muito mostravam sinais de desvio e desorientação dos princípios básicos de uma sociedade moderna e progressista.

Tudo foi acontecendo de forma rápida e descontrolada com a preciosa ajuda da realidade online que saltita entre o real e o virtual sem tempo nem espaço para critica ou reflexão. Chamar-lhe-ia o “fast food” da realidade – absorver o que se diz sem filtro para perceber o sentido e a fonte da informação – se está lá então é verdade.

Esta lógica dos seguidores de tudo e de todos passou a ser um estilo transversal a todas as gerações, obviamente aproveitado por ambiciosos/gananciosos de poder e liderança que facilmente perceberam e usaram esta tendência a seu favor.

Foi fácil, e aí estão eles espalhados pelo mundo. A palavra inteligência que tantas vezes ouço para os caracterizar é uma inteligência com carácter de manipulação, usando e abusando de informações falsas construídas de acordo com os seus interesses. É uma inteligência dissimulada que só serve alguns. Hoje sabemos que ser inteligente é muito mais do que ser cognitivamente dotado, é também ser emocional, empático, solidário, olhar o mundo de forma abrangente, global, ser critico, mais do que tudo pensar.

Agir sem refletir, sem pensar nas causas e nas consequências é perigoso. “Precisamos de quem pense por nós de quem decida” é uma frase perigosa que coloca quem assim pensa num lugar frágil, onde a ideia de segurança vai progressivamente dar lugar ao controle social.

Há sem dúvida um desconforto, uma desilusão com os líderes que nos trouxeram aqui, e é preciso exigir mudança e ser ativo no processo de reconstrução. Mas a agressividade que anda no ar por todo o mundo, disfarçada de direitos e deveres, destruindo lugares de pertença de outros, matando pessoas indiscriminadamente, semeando ódios, vingança, rebeldia, e continuando a matar com o intuito de assim limpar mentalidades e culturas indesejáveis, não é um princípio, mas o fim.

Esta agressividade que está presente diariamente nas nossas vidas e que para alguns já é banal, está a promover outro tipo de violência. Falo daquela que começa a fazer parte da vida em comunidade. Para alguns jovens, adultos, individualmente ou em grupo, a violência passou a ser uma resposta possível, aceitável e mesmo justa. Este princípio assusta-me e assusta-me ver as novas gerações a crescerem na vulgaridade dos atos violentos, onde ter uma arma e usá-la é uma possibilidade de ataque, de defesa, ou apenas de impulso. A morte à espreita começa a fazer parte da vida comunitária.