Candidato apoiado pelo JPP já foi "bandido"?
A tensão política tem aumentado, nos últimos tempos, no Porto Santo. E prova disso foi o ambiente que se viveu numa das últimas reuniões públicas do Município.
Com eleições autárquicas à porta, um clip de áudio começou a circular pelo Whatsapp a propósito de um momento específico da Reunião de Câmara em que os ânimos se exaltaram entre o presidente da autarquia - o social-democrata Nuno Batista, e o vereador do movimento Uma Nova Esperança (UNE), Luís Bettencourt - com este último a assumir que já foi "bandido". Terá sido mesmo assim?
Primeiro fomos procurar qual teria sido a Reunião de Câmara e, depois, confirmar se Luís Bettencourt terá proferido exactamente a palavra bandido, uma vez que o ficheiro áudio poderia ter sido manipulado.
Com recurso ao YouTube percebemos que se tratou da reunião pública de dia 23 de Março e, posteriormente, tentámos encontrar o momento exacto das alegadas declarações.
Efectivamente, o candidato apoiado pelo Juntos Pelo Povo (JPP) às próximas eleições autárquicas disse-o à passagem da 1 hora, 16 minutos e 45 segundos. "Eu já fui bandido. Qual é o problema? Já fui bandido, já fui!", disse Luís Bettencourt.
Assim sendo, após a verificação da autenticidade da declaração, procurámos saber se Luís Bettencourt tem registo de condenações judiciais que possam contextualizar o uso da palavra “bandido”, mesmo que o termo não tenha valor jurídico. A verdade é que o seu uso neste contexto corresponde a uma identificação informal com um passado criminal. Por isso, fomos analisar.
No decorrer deste fact-check, o DIÁRIO teve acesso a um acórdão judicial de 2007 e o candidato apoiado pelo Juntos Pelo Povo (JPP) foi julgado e condenado por sete crimes de falsificação agravada, praticados entre 2004 e 2005, envolvendo a falsificação de cheques em nome da sua ex-namorada, Cláudia Silva.
À época desse namoro, o actual vereador do UNE encontrava-se impedido de operar com cheques por constar numa lista de utilizadores de risco, entre 2002 e 2004, daí que persuadiu Cláudia Silva a abrir uma conta bancária no Millennium BCP. E acabou por ser aberta no dia 21 de Novembro de 2004.
Posteriormente, Cláudia entregou ao arguido, voluntariamente, o cartão Multibanco e o respectivo código PIN e, posteriormente, Bettencourt requisitou, entre 26 de Novembro e 2 de Dezembro de 2004, vários módulos de cheques através de terminais ATM.
Esses cheques passaram a ser utilizados no circuito comercial da loja de electrónica ‘Tato’s Hi-Fi’ – que era sua propriedade - para pagar mercadorias. E foi aí, por diversas ocasiões, que falsificou a assinatura de Cláudia Silva.
Alguns desses cheques foram entregues à empresa ‘J. Nelson & Abreu’ como pagamento por brinquedos destinados ao comércio do arguido. Dois cheques, com valores de 3.392,92€ cada, datados de 3 e 28 de Dezembro de 2004, foram emitidos com a assinatura falsificada de Cláudia Silva. Um deles foi devolvido com a indicação de ‘cheque revogado’, o que levou a empresa a confrontar o arguido, que acabou por regularizar o pagamento.
Além disso, o arguido emitiu mais dois cheques à ordem de Carlos Ruas, também com assinaturas forjadas da ex-namorada. Esses cheques, datados de 3 e 6 de Dezembro de 2004, foram utilizados como pagamento parcial de uma dívida, no valor de 500€ e 580€, respectivamente.
Outro cheque, no valor de 1.000€, foi entregue à empresa ‘Endorel – Importadora de Electrodomésticos’, também no dia 7 de Dezembro de 2004. Foi igualmente devolvido por falta de provisão, tendo sido mais tarde regularizado com um depósito em numerário feito pelo arguido.
Importa referir que em pelo menos dois cheques houve ainda rasura visível no campo da assinatura e na quantia em extenso, o que agrava o grau de falsificação.
Apreciação jurídica e condenação
O tribunal analisou os elementos, concluindo que o arguido agiu com dolo directo e com intenção clara de obter um benefício ilegítimo, em prejuízo de terceiros, designadamente das empresas fornecedoras e da própria ex-namorada.
No fundo, os actos praticados configuraram falsificação agravada, uma vez que os documentos em causa eram cheques - instrumentos particularmente sensíveis no tráfico jurídico e económico.
Luís Bettencourt sai em defesa de Roberto Silva
Vereador municipal do movimento Uma Nova Esperança é contra a extinção do cargo de representante do Governo Regional no Porto Santo
A juíza do processo salientou que se tratou de um crime doloso, ou seja, cometido com a intenção de lesar outrem ou beneficiar ilegitimamente. Este tipo de ilícito é considerado de perigo abstracto: não é necessário que o prejuízo se efective na totalidade, bastando o risco potencial de violação da confiança no sistema jurídico e financeiro.
O tribunal condenou Luís Bettencourt a uma pena de um ano e seis meses de prisão, com pena suspensa, pela prática de um crime continuado de falsificação de documentos agravado.
A decisão do colectivo de juízes reconheceu que Bettencourt utilizou cheques pertencentes à conta bancária aberta em nome da sua ex-namorada, Cláudia Sofia Santos Silva, falsificando assinaturas e utilizando os cheques em seu benefício pessoal e comercial.
O tribunal considerou provado que Luís Bettencourt, de forma continuada e deliberada, assinou cheques imitando a assinatura de Cláudia Silva, que então era sua companheira, e os usou para pagar fornecedores da sua loja de no Porto Santo, a ‘Tato’s Hi-Fi’. Pelo menos seis cheques foram utilizados desta forma, totalizando milhares de euros, muitos dos quais acabaram devolvidos por revogação ou falta de provisão.