Os “influençadores”
É uma moda como outra qualquer esta de qualquer um se definir como “influencer”, assim em língua estrangeira que é para os pacóvios do burgo não entenderem que estão a ser, vá lá, levados, que é para não dizer coisa pior!
Procurei, no dr. Google, algumas definições para moda e influençador.
Moda é o substantivo feminino que significa uma maneira ou costume mais predominante num determinado grupo ou num determinado momento. É também uma forma de autoexpressão e autonomia num determinado período e lugar, num contexto específico de roupas, calçado, estilo de vida, acessórios, penteado e postura corporal, e pode significar ainda o uso passageiro que rege de acordo com o gosto do momento a maneira de viver, de vestir, etc.
Por outro lado, um influençador é um indivíduo que tem o poder de afectar as decisões de compra de outras pessoas por causa da sua autoridade, posição, conhecimento ou relacionamento com o seu público. Nesta definição do dr. Google, é dito também que criam conteúdos, divulgam produtos, orientam como usar, participam em eventos e interagem com os seguidores.
Retirei do Diário de Notícias de Lisboa a notícia que transcrevo: “no dia 27 de março, a Polícia Judiciária (PJ) deteve três jovens suspeitos de violar uma adolescente de 16 anos. O ato terá acontecido numa arrecadação em Loures, perto da residência da jovem, e foi filmado, sendo a gravação divulgada posteriormente nas redes sociais. A adolescente combinou encontrar-se com um dos jovens, que era seu conhecido. Este compareceu ao encontro, mas não sozinho. Segundo a PJ, estava “acompanhado de amigos, desconhecidos da vítima, que em contexto grupal constrangeram a vítima a práticas sexuais e filmaram os atos, contra a sua vontade, divulgando-os nas redes sociais”. Os três jovens, de idades entre os 17 e os 19 anos, “tinham, em termos daquilo que são as redes, as plataformas sociais, uma atividade muitíssimo relevante. Poderão ser considerados “influencers” e, portanto, têm um público já muito significativo”.
Há alguma coisa profundamente errada aqui.
Não na notícia em si, obviamente, mas no facto de poder haver jovens de 17 ou 19 anos a serem considerados influençadores e que por serem influenciadores ter levado a haver mais de três dezenas de milhar de visualizações sem que ninguém dessas cerca de trinta e duas mil (32000) pessoas tenha reportado o caso às autoridades competentes, nomeadamente à Polícia Judiciária. E quando foram detidos, foi porque os médicos que examinaram a vítima de violação (o termo é esse – vítima de violação) reportaram, agora sim, à Polícia Judiciária, como é o seu dever.
Os violadores, ditos influençadores, foram presentes então a um juiz que os libertou com a obrigatoriedade de se apresentarem periodicamente e com a proibição de contactarem a vítima!
É assim, deixem a rapariga em paz e podem voltar a fazer o mesmo!
Mesmo sendo uma moda, que como todas as modas será passageira, espero bem, não consigo entender que raio de autoridade ou conhecimento, como diz a definição, podem ter três imberbes para poderem se arvorar ao direito de criar um conteúdo e o divulgar com o sentido de orientar como fazer, como forma de interagir com os seguidores.
Um conteúdo criminoso, ainda para mais!
A liberdade só pode ser liberdade plena quando a liberdade de um não colide com a liberdade do outro. Não quero nem pensar nos efeitos, nefastos seguramente, que podem advir da proliferação (sabemos como são as modas: um inventa e milhares copiam até à exaustão) de ditos “influencers” que tentam a todo o custo determinar a forma de agir de uns quantos ditos seguidores.
Não me preocupa a existência de “infuencers” cada um pior do que o outro. Preocupa-me que haja milhares de pessoas que preferem não pensar e seguir quase cegamente aquilo que o seu “influencer” da moda dita em cada ocasião, e preocupa-me que haja jovens que se aproveitam da “simplicidade” e inocência de milhares de outros jovens para divulgar comportamentos que sabem não ser correctos mas que atraem “likes” em catadupa, e com isso algum dinheiro que lhes é pago à conta do número de seguidores.
A violação, a sua divulgação, passou a ser um negócio, eventualmente impune, e isso preocupa-me ainda mais!
A impunidade em crimes que deveriam ser punidos não se pode transformar em moda, mas há já muitos “influencers” a trabalharem para que essa seja uma realidade, como tanto temos visto por aí ultimamente!
Estamos na semana da Páscoa, um período que deveria ser também de reflexão e arrependimento. Em jeito de homenagem à jovem que foi vítima de um crime hediondo, deixo a crentes ou não crentes, sem ou com qualquer convicção de cariz mais ou menos religioso, e porque em algum tempo todos têm necessidade de uma oração, mesmo sem qualquer destinatário definido, um poema de Miguel Torga, com os votos de uma Santa e Feliz Páscoa:
“Não tenhas medo, ouve:
É um poema.
Um misto de oração e feitiço...
Sem qualquer compromisso,
ouve-o atentamente,
De coração lavado.
Podes decorá-lo
E rezá-lo
Ao deitar,
Ao levantar,
Ou nas restantes horas de tristeza.
Na segura certeza
De que mal não faz.
E pode acontecer que te dê paz...”