O bom, o mau e a presidente
Na curiosa coreografia das reações nacionais às eleições regionais, Pedro Nuno Santos foi o primeiro dos derrotados a arriscar sacudir a água do capote. Não se esperava que o líder socialista – ou qualquer outro – assumisse uma derrota em eleições onde nem sequer foi a votos, mas a forma como tentou fazer do resultado do PS Madeira, a derrota de um partido que sempre lhe foi distante e da Madeira um território politicamente à parte, revela uma falta de solidariedade chocante. Se as lideranças se medem na adversidade eleitoral, Pedro Nuno Santos mostrou não estar à altura da derrota que lhe coube.
O bom: Miguel Albuquerque
Desde 2012, o percurso político de Miguel Albuquerque já lhe terá custado algumas das suas sete vidas. Da primeira disputa com Alberto João Jardim pela liderança do PSD, passando pela perda da maioria absoluta e a criação do primeiro governo de coligação, até à sobrevivência a duas operações judiciais que abalaram as fundações do PSD, o fim da carreira política de Albuquerque já foi anunciado várias vezes. E nunca chegou. Mas nem a reconhecida perseverança do presidente do PSD, deixaria antever o resultado das últimas eleições regionais. Por cansaço eleitoral, por falta de alternativas políticas credíveis ou por anseio de uma legislatura completa, o facto é que os madeirenses entregaram ao PSD uma maioria absolutamente clara para governar. Mas não só. Estas eleições também foram sobre a circunstância pessoal de Miguel Albuquerque. Não por iniciativa do próprio, mas por insistência do PS e do Chega, que antes e durante toda a campanha eleitoral quiseram fazer destas eleições um teste à condição individual e ética do candidato do PSD. Se foi esse o pressuposto eleitoral, ainda por cima imposto pelos adversários, não há como não retirar do resultado uma legitimidade política e popular acrescida de Miguel Albuquerque. É óbvio que o voto popular não absolveu Albuquerque (que aliás de nada está acusado), mas ficou claro que a maioria das pessoas não alinha em condenações políticas antecipadas.
O mau: Paulo Cafôfo
Há derrotas que começam a desenhar-se muito antes de acontecerem. No caso de Paulo Cafôfo, basta-nos recuar ao seu regresso à política regional e à presidência do PS. Cafôfo não errou em ter regressado, mas nas razões que apontou para o seu regresso. Referir-se ao seu projeto político como uma causa pessoal, para além de politicamente indigente, revela um egocentrismo que tem pouco de mobilizador. A partir desse erro original, os falhanços políticos sucederam-se em catadupa: a candidatura precipitada à Assembleia da República, o casamento curto e desconchavado com o JPP, o adiamento da moção de censura para salvar o Orçamento, apenas para acabar por o chumbar, e o anúncio de uma coligação pré-eleitoral sem sequer falar previamente com os partidos. Desde 2023, Cafôfo falhou em quase tudo o que fez e o resultado eleitoral do passado domingo limitou-se a traduzir em votos o seu colapso político e partidário. No entanto, o seu maior erro ainda estaria para vir. No final da noite eleitoral, perante uma plateia de socialistas cabisbaixos, aguardando a decisão óbvia de um líder que afundou o partido no 3º lugar e que não ganha uma eleição desde 2017, Cafôfo assumiu a responsabilidade da derrota, mas recusou a única consequência lógica: a demissão. Fê-lo com a abnegação calculada de quem não quer sair do lugar, mas não quer que digam que nada fez. Tentou uma fuga para a frente, para daqui a 6 meses, mas acabou a fugir da sala e da questão inevitável. Afinal, para quem está Cafôfo a guardar a cadeira de presidente do PS?
A presidente: Rubina Leal
Parece uma coincidência cósmica que nas eleições regionais em que a paridade se perdeu nos corredores da Assembleia da República, o resultado eleitoral abra caminho à chegada de uma mulher ao primeiro lugar da autonomia. Com a entrada de José Manuel Rodrigues no Governo e evitada a dupla bizarria da Assembleia ser presidida por um deputado solitário do CDS — que, por isso, estaria condenado ao silêncio parlamentar —, cria-se finalmente a condição necessária para aquilo que a política há muito exige. Desde 2019, o PSD está obrigado a dar a presidência da Assembleia Legislativa de penhor como garantia da constituição de uma maioria parlamentar e de um governo. A cedência do PSD à aritmética do escudo que completa a nota de mil foi necessária e legítima, mas nunca deixou de ser uma pedra no sapato social democrata. Por isso, o regresso à normalidade do maior partido indicar o Presidente da Assembleia merece ser pontuado com peso político. Na lista parlamentar do PSD, não há ninguém com a legitimidade e a experiência política de Rubina Leal. Talvez porque, ao longo dos anos, lhe couberam sempre as eleições mais difíceis. Deixou o Governo para enfrentar Paulo Cafôfo na Câmara do Funchal, concorreu às eleições europeias num lugar quase impossível de eleger e numa lista rejeitada por Albuquerque - desafios para os quais o taticismo político recomendaria distância, mas que Rubina Leal nunca recusou. É dessa fibra que deve ser feita a mais alta figura da nossa autonomia, pois a quem enfrenta as batalhas mais difíceis devem estar reservados os lugares de maior responsabilidade.