Alertas para uma Europa em Crise
As análises de Mario Draghi, no relatório de 2024 sobre o futuro da competitividade europeia e no recente artigo no Financial Times, assim como os discursos de JD Vance, em Munique, e de Meloni, em Washington, apontam, em diferentes dimensões, para desafios estruturais que a UE enfrenta.
Em 2024, Draghi apontou fatores negativos que travam a economia europeia, como o crescimento lento e a perda de competitividade, a excessiva burocracia e a falta de incentivos à inovação em comparação com empresas americanas e chinesas. Sinalizou a fragmentação do mercado europeu como um aspeto que dificulta a expansão de empresas inovadoras, e o baixo investimento em tecnologia e inovação, incluindo inteligência artificial, semicondutores e biotecnologia. Outro problema crítico referido foi a dependência excessiva de fornecedores externos para matérias primas, alertando também para os custos elevados da transição energética europeia, defendendo um modelo mais equilibrado que combine energias renováveis com nuclear e hidrogénio. Como soluções, propôs mecanismos para reduzir barreiras regulatórias, fortalecer cadeias de abastecimento próprias e incentivar investimentos estratégicos.
Recentemente, no Financial Times, Draghi reforçou estas preocupações recordando que o FMI estimou que as barreiras internas na Europa equivalem a tarifas de 45% para a indústria e 110% para os serviços. Sublinhou que a regulamentação excessiva tem travado a inovação e a produtividade, caso da redução de 12% nos lucros das pequenas empresas tecnológicas europeias devido aos custos de conformidade com o RGPD. E enquanto a China tem o Deepseek e os EUA o ChatGPT, a UE orgulha-se de ser pioneira na regulação da Inteligência Artificial.
Por sua vez, JD Vance e Meloni argumentam que a Europa enfrenta um desequilíbrio causado por uma imigração desregulada e por uma guerra cultural entre conservadores e progressistas. Salientam que valores fundamentais que estruturaram a Europa e o Ocidente estão a desmoronar-se, e que as opiniões conservadoras são frequentemente marginalizadas, sob avanço do progressismo radical importado dos Estados Unidos, que, segundo Meloni, foi adotado por uma elite europeia desconectada da realidade, enfraquecendo os nossos alicerces culturais. O politicamente correto, a crescente intolerância ao debate de ideias e à coexistência de diferentes perspetivas está a corroer a coesão social, a sufocar o debate público e a confiança nas instituições democráticas. Assim como as barreiras comerciais internas prejudicam a economia, as guerras culturais dificultam o diálogo e a cooperação entre cidadãos, fragmentando ainda mais o tecido europeu, e polarizando o espetro político.
As perspetivas de Vance e Meloni, e a análise de Draghi, servem como um alerta para a Europa. O continente não pode continuar a ignorar os seus impasses internos, sejam eles económicos, identitários ou securitários, pois como diria Maslow, sem esta prioridade básica satisfeita dificilmente será possível aspirar a outros valores ou objetivos mais elevados. A excessiva burocracia e a lentidão estrutural dos processos decisórios de Bruxelas afastam a UE da realidade dos seus cidadãos, marginalizando-a num cenário geopolítico global multipolar vincado por lideranças pragmáticas, perdendo influência em questões que afetam diretamente a sua segurança e estabilidade, e relevância em regiões do globo tradicionalmente sob sua esfera de influência, que se voltam agora para a Rússia e a China em busca de segurança e apoio económico. Depois de “entregar” a indústria à China, a energia à Rússia e a defesa aos Estados Unidos, a UE não pode continuar a pressionar o botão de “snooze” enquanto o mundo avança. Como refere Draghi, a resposta deve ser rápida porque o tempo não está do nosso lado, caso contrário teremos de admitir que não somos capazes de cumprir os valores fundamentais para os quais a UE foi criada.