DNOTICIAS.PT
Crónicas

Clube Único ou Único Clube

O governo é regulador e gestor do dinheiro público. Este tema merece actuação política do governo. E dos partidos.

Percebo parecer estranho escrever sobre este tema quando o meu Nacional está por cima, em grande. Mas é quando estamos fortes e nos julgamos imparáveis que devemos cuidar o futuro. Para que ele não nos surpreenda e retire o controlo da situação.

O sonho é termos um ÚNICO CLUBE com dimensão e, esse, ser o Nacional.

Cada um dorme para o lado que quer, sonha com idiotices e julga-se ‘tarzan’. Mas convém ser realista. Andar com os pés no chão. Perceber que seria necessário ser muito agressivo, mesmo irracional, para matar concorrência e afastá-la definitivamente. Não temos esse ‘adn’, nem os nossos sócios e adeptos se motivariam nessa caminhada louca. Somos muito passivos. Pouco fizemos pelo Clube. Agradecemos ter tido uns quantos que em nosso nome tiveram coragem e assumiram o risco.

Não sendo possível o Clube Único restam duas alternativas: manter tudo como está ou procurar a única solução que nos fortalece, emancipa e proporciona estatuto superior a nível nacional.

É preciso registar que o deixar “tudo como está” inclui a possibilidade de uma Camacha, Machico ou Ribeira Brava, encontrarem investidores sérios e motivados, entrarem nas Ligas nacionais e juntarem-se ao “banquete” orçamental. Já tivemos o União e nada impede que uma outra surpresa não apareça. Seria o fim.

Mesmo que Nacional e Marítimo encontrem investidores credíveis será sempre um orçamento anual de 10 a 12 milhões de euros na melhor das hipóteses. Num cenário ideal pode chegar aos 15 milhões. Valor a cobrir com futuras receitas extraordinárias de negócios de jogadores, já que as demais - bilheteira e quotizações - não se alteram.

É neste patamar que estão quase todos os clubes continentais, de primeira e segunda Liga, que se fortalecem com entrada de empresários, mas sem os apoios públicos das equipas madeirenses.

Hoje, todos os clubes do continente (excluindo os ‘grandes’) ou têm investimento empresarial ou morrerão rapidamente. É ver a segunda Liga, com equipas competitivas e fortes que impediram uma época vitoriosa ao Marítimo. Não foi a equipa da Madeira que falhou. Foi o campeonato que se valorizou de forma imediata e surpreendente. E, agora, é cada vez mais difícil. Nunca foi um problema de treinador. Ter o Nacional de 23/24 como referência foi erro estratégico.

Resta o CLUBE ÚNICO.

É preciso que se diga que o clube único proposto por Alberto João Jardim era para chamar-se Marítimo, ter o equipamento azul e amarelo e o emblema do Nacional. Uma aberração que a direção verde-rubra não quis aceitar. Bem hajam, ainda que tivessem perdido a oportunidade, num breve prazo, de transformar o Clube Único em Único Clube. Deliberavam tirar o emblema e restituíam o equipamento. Até lá, tinham o verde-rubro como alternativo. O nome já estava. Mais fácil que o ultraje do desaparecido Madeira Andebol SAD masculino, já substituído pelo Marítimo Andebol SAD, com o acordo do moribundo Académico. A intenção de Jardim era esta e não foi percebida, pelo que foi rejeitada. Nesse momento, o Nacional estava, em termos financeiros, de cócoras e o União agonizava. Mais uma vez agradeço a nega do Marítimo.

No entanto, é preciso aceitar que o Clube Único não é bem aceite. Mesmo no Nacional o tema não colhe apoios suficientes. Se juntar à concorrência não é aceitável.

Este é o primeiro erro pois o Clube Único deixaria o Nacional e o Marítimo libertos para continuarem o seu caminho e disputarem o Regional. Ninguém se juntava. Era um novo clube, equidistante dos existentes, que nascia.

A segunda vantagem seria reunir um orçamento anual superior a 20 milhões de euros e, com isso ser um clube habitualmente de competições europeias. Seria superior ao Guimarães e do nível do Braga. Num ou outro ano ficaria em terceiro lugar. E ter mais seria sucesso de gestão.

E porque os adeptos do Nacional não querem o Clube Único?

Os nacionalistas, porque nunca foram dominadores a nível regional, na sua ânsia de ganhar qualquer coisa, tiveram sempre um segundo clube. Geralmente o Sporting porque, pelo que sempre me disseram, sendo o Marítimo sócio honorário do Benfica, qualquer nacionalista nunca seria encarnado. Assim, ficaram divididos entre o Benfica para os maritimistas e o Sporting para os adeptos do Nacional. É ver na Choupana as claques de um e de outro quando ali se deslocam.

Com a ida do Artur de Sousa “Pinga” para o Porto muitos verde-rubros perfilharam-se, nessa época, o favor dos nortenhos. Mas é agora, com o novo Porto de Pinto da Costa que muitos outros jovens, desconhecendo as raízes das rivalidades e abraçando a glória do momento, se declaram azuis e brancos. Tudo está um pouco dividido mas, mais acérrima está a relação dos nossos com os “grandes” do continente. Quando os “leões” aqui vêm fico corado de vergonha e lamento o carácter dos que nem se dividem por duas paixões e preferem patrocinar, sem escrúpulos, o apoio ao clube forasteiro. Os três pontos fazem mais falta a quem quer ser campeão do que a quem apenas não quer descer. Tristeza humana!

Somos assim. Mais vale um bom lá de fora que um qualquer da terra-mãe.

Por sermos assim, exigindo ser campeões mesmo não podendo ser nada, vendemo-nos a clubes que nada têm a ver connosco. Não sabendo viver com a própria realidade, quais novos-ricos com pobreza escondida, defendemos os nossos pequeninos clubes como forma de justificar o manter a devoção a outro grande clube de Lisboa ou do Porto.

Ter um clube mais forte na Madeira, que disputasse, taco-a-taco, os campeonatos com os “grandes” faria serem adeptos de dois clubes do mesmo nível o que se revelaria incompatível. Assim, há que manter o da Madeira bem pequenino, um sobe e desce, que até já pouco justifica a ida ao estádio. Quanto muito à borla e a espaços. É melhor ficar em casa vendo o Nacional e Marítimo na televisão assim como o Sporting, Benfica e Porto. As únicas subidas à Choupana são para apoiar o clube continental do coração. Nos restantes jogos somos poucos.

O que acontece com o Braga é um bom exemplo. Terra de benfiquistas, tornou-se a terceira maior cidade portuguesa, ultrapassando claramente o Funchal, e tem hoje um clube único fortíssimo que rapidamente monopolizou o apoio dos adeptos bracarenses. Já foi vice-campeão nacional, jogou a “Champions”, foi finalista da Liga Europa em Dublin, ganhou três Taças de Portugal e da Liga, bem como a Taça Intertoto.

O Guimarães procura seguir igual pegada. Curiosa a emancipação do Santa Clara que alterou o seu emblema retirando os elementos da sua filiação no Benfica, substituindo a águia da Luz pelo açor e estampando os Açores e as nove estrelas do arquipélago. Por força da sua divisão por nove ilhas rivais, será sempre um único clube de S. Miguel e nunca clube único dos Açores.

Açoreanos à parte, todos aqueles exemplos realizam-se porque estes centros urbanos acabaram com a sua estéril divisão e rivalidades internas. Os seus adversários estão em Lisboa, Porto, Faro, Braga, Guimarães, etc. Não nas suas cidades. Muitos exemplos estrangeiros dispensam referência. Onde há divisão não há dimensão.

É aqui que entra o CLUBE ÚNICO da Madeira.

Eu percebo que o governo faz política e procura queimar-se no mínimo. Alberto João intervinha no que julgava haver necessidade da sua ação. Por isso tentou o Clube Único. Mesmo querendo, a prazo, agradar ao seu clube de estimação e eliminar os demais. Por isso não vingou e teve grave dissabor político.

Mas o governo é regulador e gestor do dinheiro público. Tem responsabilidades. Nos dois estádios não se sentam mais de dois a três mil pagantes. Os demais não contribuem, nem para engrandecer o seu clube nem para ver o espectáculo. São financeiramente passivos. Acham que os subsídios públicos lhes dão direitos.

Talvez este tema pudesse merecer actuação política do governo. E dos partidos. Haverá muitos mais madeirenses que teriam orgulho num Clube representativo, pujante, e bem sucedido. Como está não vai a lado algum. Mesmo que reforcem a estrutura financeira será sempre insuficiente para sermos ALGUÉM.

NOTA: as únicas pessoas que não merecem a conclusão deste artigo de opinião são o Rui Alves e o Carlos Pereira. Fizeram os seus Clubes maiores que a sua realidade. Fizeram acreditar no sonho. No impossível. Mas, mesmo com toda a sua reconhecida competência e imaginação, não foram capazes de anular a certeza de que um Clube Único é a solução que produz um Clube forte, competitivo e do melhor em Portugal.