Obrigado e desculpa, Marco Lira
Foi com tristeza que soube do teu abandono do desporto de alta competição. Mas conhecendo-te, sei que continuarás a treinar de forma “lúdica” e a colaborar com o clube, agora como licenciado em Educação Física. Tenho um enorme orgulho em ti, pois lutaste até ao fim pelos teus sonhos. Obrigado por seres uma inspiração, e desculpa pelo sistema não ter estado à altura do teu talento.
Para quem não conhece o Marco, ele é um dos mais talentosos desportistas da Madeira. Ex-atleta de patinagem de velocidade do Clube Desportivo e Recreativo dos Prazeres e membro da seleção nacional, foi o único sénior medalhado num Campeonato da Europa:
• 2023: Prata no Campeonato da Europa
• 2021: Vice-campeão do Mundo
• 2019: Ouro no Europeu, a primeira para Portugal
• 2018: Duas medalhas de bronze
• Múltiplos títulos nacionais e regionais
O Marco sonhava com os Jogos Olímpicos de Inverno. Com o treinador Alípio Silva, acredito que teria conseguido. Mas, como tantos desportistas madeirenses, teve de escolher entre o sonho e pagar as contas.
Por que tantos jovens abandonam o desporto de alta competição?
O abandono de jovens como o Marco reflete problemas sistémicos que precisam de soluções urgentes:
1. Pressão Académica: A carga horária intensa, aliada aos treinos, gera stress e falta de tempo.
2. Apoio Financeiro Insuficiente: Modalidades menos mediáticas têm poucos apoios.
3. Infraestruturas Limitadas: No geral, faltam condições e técnicos especializados.
4. Falta de Planeamento: Associações, clubes e entidades governamentais falham no apoio técnico e estratégico.
5. Educação e Sociedade: O sistema educativo desvaloriza o desporto, e a sociedade privilegia o futebol.
6. Falta de Profissionalização: Ser desportista e treinador continua a ser visto como passatempo.
O que podemos fazer?
Reverter esta realidade exige mudanças estruturais:
• Educação: Horários flexíveis e tutores para desportistas.
• Desporto Escolar: Mais modalidades e técnicos qualificados.
• Financiamento: Apoios reforçados e patrocínios do sector privado incentivados.
• Profissionalização: Contratos dignos e reconhecimento do estatuto profissional para desportistas e treinadores.
• Infraestruturas: Centros especializados e apoio logístico.
• Cultura Desportiva: Campanhas que valorizem todas as modalidades desportivas de forma equilibrada e justa.
Para os treinadores: Resiliência. Vocês moldam não apenas desportistas, mas pessoas mais fortes e determinadas. Merecem mais reconhecimento e melhores condições.
Para os pais: Inspiração. Vocês seguram os sonhos dos filhos, mesmo com sacrifícios imensos. O vosso amor constrói vidas e sonhos realizados.
Este texto fala do Marco, mas ecoa a história de muitos talentos madeirenses: Nuno Pereira, Solange Nunes, Cristina Neves, Francisca Henriques, Jéssica Rodrigues, Tiago Berenguer, João Dinis, Martim Menezes e tantos outros. Que nenhum tenha de abandonar os seus sonhos por falta de apoio.
Sei que serei criticado, mas não posso ficar calado. Como amante de desporto e profissional do exercício físico, sonho com um futuro onde os nossos jovens desportistas e treinadores sejam respeitados e os seus esforços vistos como trajetórias de valor. Que os sonhos de serem profissionais e olímpicos deixem de ser ilusões e se tornem conquistas reais.
O futuro do desporto depende de nós — todos nós.