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Tecnofobia

Os recentes avanços tecnológicos e o ritmo de mudança esperado para o futuro, são muito superiores à velocidade normal do desenvolvimento humano. Estamos a criar casas inteligentes, escritórios inteligentes, cidades inteligentes, e somos por isso, confrontados com dilemas que essa mesma tecnologia está a criar. É por isso imprescindível entender como está construída e como funciona, para determinar que problemas pode resolver e dessa forma qual a melhor forma de a usar.

Durante a industrialização, quando as máquinas começaram a substituir parte do trabalho humano, muitos académicos debruçaram-se no estudo da relação entre homem e máquina. Os receios iniciais no aumento no desemprego, vieram abrir caminho a novos empregos, pois as máquinas necessitavam operadores, e esses operadores necessitavam de chefias.

Tal como aconteceu durante a industrialização, a automação aliada à Inteligência Artificial (IA), está destinada a ter um importante impacto nas nossas vidas e na forma como trabalhamos. Contrariamente ao que aconteceu durante a industrialização, são os profissionais de colarinho azul que agora se sentem mais ameaçados.

O pessimismo é natural em todos os processos evolutivos. Nos primeiros momentos de uso generalizado das máquinas calculadoras, por exemplo, surgiu uma tese de como o seu uso iria deteriorar a nossa compreensão dos conceitos matemáticos. Médicos britânicos chegaram a afirmar que a utilização das bicicletas iria sobrecarregar o nosso sistema nervoso e produzir níveis extremamente elevados de ansiedade. Podemos encontrar muitos mais exemplos deste tipo de fobia tecnológica em www.pessimistarchive.org, numa impressionante coleção de artigos sobre “o medo das coisas velhas, quando eram novas”. Neste mesmo arquivo, podemos verificar que muitos dos nossos medos atuais sobre o aparecimento da IA remontam ao século XIX. É por isso extremamente reconfortante percebermos que muitos dos pânicos morais sobre o uso da tecnologia acabaram por se provar errados.

O facto de muitos pessimistas do passado se terem demonstrado equivocados, não significa que os devemos ignorar. Se focarmos a nossa atenção nas partes mais significativas dos mais recentes avanços da IA, perceberemos que alguns dos nossos temores são infundados.

Para ajudar a desmistificar todas as questões sobre a IA, muitos académicos propõem a alteração da designação de IA para probabilidade computorizada, pois os últimos modelos de IA generativa são máquinas puramente probabilísticas treinadas para consultar grandes quantidades de dados segundo um conjunto predeterminado de regras. Com acesso a todo o conhecimento humano disponível na internet, a IA consegue resolver problemas, tomar decisões, entender a linguagem, e aprender com a experiência, de uma forma muito alinhada com a atual cultura humana.

É bem verdade que a IA generativa pode esbater a linha que separa o homem da máquina, mas se tivermos em conta que muitos dos nossos problemas persistem devido à inflexibilidade e carater determinístico das máquinas, podemos facilmente perceber as vantagens de termos máquinas capazes de incorporar elementos qualitativos na resolução de problemas.

Não devemos sobrevalorizar a velocidade de adoção das novas tecnologias nem subvalorizar o âmbito da sua adoção, para contrariar uma tendência pessimista, que nos faz dar mais importância ao que as novas tecnologias podem fazer (em teoria), mas não nos fazem antever como estas podem ser usadas na prática nem que tipo de problemas podem resolver.

Quando pensamos na IA generativa, a tendência é sobrevalorizar o impacto que este tipo de tecnologia pode ter no desemprego. Em 2013, um estudo da Universidade de Oxford previa que 70% de todos os trabalhos seriam perdidos durante as duas décadas seguintes para a IA. Em 2021 um estudo da OCDE previa que só 14% dos trabalhos podiam ser substituídos por estas máquinas. Mais recentemente, um relatório de março de 2023 da Goldman Sachs sugere que só 9% dos trabalhos podem ser substituídos pela IA. As estimativas de erosão no mercado laboral pelo uso da automação e pela IA têm vindo a diminuir na mesma medida em que vamos percebendo melhor esta nova tecnologia e a forma como a iremos usar. Será então justificado este receio que muitos sentem? Porquê recear uma tecnologia que se pode adaptar ao homem, quando até hoje, sempre nos conseguimos adaptar às novas tecnologias?