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A Azália singela

O baby dog, como gostava de lhe chamar, ainda é o meu guia. Pensar nele dá-me paz e torna-me melhor pessoa

Ontem um verdadeiro amigo da natureza cumpriu a minha vontade de plantar um arbusto, no jardim perto de casa, para me aconchegar a vontade de ter o Sparky pertinho de nós. O meu amigo é jardineiro e cuida das plantas, das flores, dos animais, das crianças e dos crescidos. É um amante da natureza, um cuidador da vida, na sua preciosa essência.

O Sparky foi um privilégio de vida. Mais do que um companheiro ele era uma parte de mim. Entendia-me ao pormenor, respeitava os meus tempos, empenhava-se em me alegrar e mimar, acompanhando a minha vida de uma forma atenta e serena. Era assim para mim e para todos os que ele amava. Gostava tanto de nós que o afeto que nos transmitia cobria os lugares que partilhávamos. A vida com ele era muito mais bonita.

Quem o conhecia sentia que ele era um cão especial. Conhecia as nossas rotinas, as práticas e as afetivas. Em permanente estado de empatia oferecia o que sabia que cada um precisava e valorizava. Era sábio.

Desde bebé que foi assim, emocionalmente inteligente. Aprendia com facilidade a lidar com as pessoas e com os outros animais, observando e analisando, sem criar ou alimentar conflitos. Era um pacificador.

Adorava a vida. Muito maduro no entendimento da vida, e eternamente jovem na relação com o mundo. Brincava com os outros cães como se fosse um cachorro. Já com onze anos tantas vezes assim era considerado. Felizmente não conhecia a maldade, nem os maus vícios da humanidade.

O baby dog, como gostava de lhe chamar, ainda é o meu guia. Pensar nele dá-me paz e torna-me melhor pessoa.

Ontem, quando o meu amigo jardineiro nos acompanhou e possibilitou que plantasse um símbolo de vida em homenagem a alguém tão especial, permitiu que eu e o meu filho tivéssemos, mais uma vez, a oportunidade de sentir a comunicação entre tudo o que representa a natureza, a nossa essência. No centro estava o Sparky, a sua memória, que continua a espalhar o que de melhor a vida tem para nos dar.

Estamos tristes porque ele já não nos leva a passear, não nos pede mimos sem fim, nem nos olha por trás da cadeira à espera do mimo, no final da refeição. Saudades de nos deixar pôr os pés por cima, quando estamos no sofá a ler, no telemóvel, ou a ver televisão. Saudades dos passeios, corridas para o mar e mergulhos na água. Saudades de o ouvir ladrar, quando nos via nadar ou ouvia o ruído do motor do carro, e pensava que ia ficar. Saudades da alegria de nos ver chegar a casa e de ficar sentado à porta do quarto do Guilherme à espera que ele o levasse a passear. Saudades de tanto e de tudo. Saudades de sermos incondicionalmente amados. Saudades de gostar tanto de partilhar a vida com alegria e tanto, tanto carinho. Saudades da cumplicidade.

Mas a vida continua em ciclos, e temos que continuar a guardar as boas memórias e as histórias que nos enchem o coração. Já passei por outros momentos de luto difíceis e muito dolorosos, e fui aprendendo a pensa-los e senti-los nesta relação de presença e continuidade.

A Azália está aqui connosco e agora vou poder olhar para ela, todos os dias, e sentir-me grata por tudo o que ela significa.