O poder mais próximo
A Madeira, assim como o resto do país, está à beira de um novo ciclo político.
Ainda a vivermos o rescaldo das eleições legislativas nacionais, e com uma grande mediatização das eleições presidenciais do próximo ano, as eleições autárquicas começam a adquirir protagonismo, mais do que justificado e talvez até algo tardio.
Efetivamente, as eleições autárquicas de 2025 não são apenas mais uma volta do calendário democrático, são, isso sim, mais uma oportunidade de se colocar em prática uma nova forma de fazer política. Uma política com proximidade, com transparência, com sentido de missão e, sobretudo, com respostas reais a problemas reais. E se é verdade que os autarcas não têm todas as respostas e soluções, também é verdade que são o primeiro elo de ligação entre o poder e os cidadãos.
Num caminho de proximidade, elemento primordial no processo autárquico, as pessoas querem que lhes batam à porta, mas não só na campanha, em vésperas das eleições, mas em muitos outros dias do ano. Porque o dia a dia das pessoas, mais do que feito de grandes investimentos ou eventos, faz-se, entre muitos outros, do passeio reparado, da recolha atempada do lixo, do apoio a idosos isolados, da aposta no comércio local.
Os eleitores reveem-se em pessoas com raízes na comunidade. Velhas ou novas vozes que se sentam nos cafés não para pedir votos, mas para escutar e entender os problemas. E quando os eleitores depositam o seu voto nas urnas, para a sua freguesia, para o seu concelho, estão a dar um sinal inequívoco de confiança e de esperança de que os seus problemas serão resolvidos e os seus pedidos atendidos. Estão a devolver às autarquias o seu papel transformador, mas que só se alcança se os projetos apresentados tiverem a sua raiz nas necessidades e aspirações das pessoas. Não se compadece com políticas e políticos distantes ou soluções padronizadas.
Governar localmente exige conhecer, escutar e agir. É um trabalho diário, extenuante, mas imprescindível, de contacto com todas as forças vivas da comunidade, em que é premente sair dos gabinetes e ir ao encontro de quem sustenta a vida comunitária com o seu trabalho, muitas vezes invisível, mas que tece a rede que ampara tanta e tanta gente.
Não nos podemos esquecer: o poder local é onde tudo começa. É ali que se decide, muitas vezes, se uma família resiste ou desiste. Se uma freguesia cresce ou morre. Se o futuro é construído, ou se ficamos reféns do passado.
Contudo, o poder local na nossa Região muitas vezes é tratado como um prolongamento do poder regional, com as autarquias subjugadas às lógicas partidárias e dependentes de vontades com origem, muitas vezes, de fora do concelho. Essa subordinação, subtil ou explícita, põe em causa e limita a capacidade transformadora e mobilizadora dos municípios e das freguesias.
A política local não pode continuar a ser refém do favor, do medo ou da resignação. Tem de ser espaço de criatividade, justiça, progresso e renovação. E quando se fala de renovação, não é só em termos geracionais. É, essencialmente, uma mudança estrutural, com uma outra e melhor ética, verdade e postura perante a população.
A Autonomia, que tão orgulhosamente proclamamos, não pode ser apenas uma bandeira agitada nas festas ou uma proclamação retórica em dia de sessão solene. O poder local é, ou deve ser, um ato de emancipação, de construção coletiva, com rosto humano e voz própria. Que deve ser valorizado e acarinhado.
Neste campo, destaco a declaração do Presidente do Governo Regional, Miguel Albuquerque, na semana passada, em que, referindo-se a um autarca em fim de mandato, assegurou, e passo a citar: “Há uma coisa que eu não faço: as pessoas que trabalharam bem para a Região e para o partido não são descartáveis”. Uma frase que, estou certa, deixará mais do que um a pensar… eu, confesso que fiquei surpreendida.
Este é o tempo de devolver ao poder local a sua nobreza original, pelo que a escolha dos presidentes e respetivas equipas deve ser bem ponderada, alicerçada em características como conhecimento da realidade local, proximidade e boa imagem junto da população, capacidade de liderança, cooperação e gestão, e, num mundo cada vez mais dominado pela rapidez de transmissão de informação, revela-se também fulcral ter competências em termos da capacidade de comunicar de forma clara, empática e acessível.
Para além das competências pessoais, profissionais e políticas, os autarcas devem também apostar em políticas públicas feitas com rigor, proximidade e ambição. Que pensem o território como um bem comum, e não como um mapa de influências. Que apostem na sustentabilidade, na economia local, na inclusão social. Que devolvam aos munícipes a palavra e o poder.
Em Portugal, já no tempo da democracia, as primeiras eleições autárquicas realizaram-se a 12 de dezembro de 1976. Quase 50 anos depois, não podem ser encaradas como uma eleição menor. Muito pelo contrário, representam a mais próxima de todas as eleições e, por isso, a mais significativa.
Mais do que nunca, a mudança tem de começar no sítio onde vivemos. No nosso lugar. No nosso concelho. Será, se assim o quisermos, o início de um novo tempo.