DNOTICIAS.PT
Artigos

Gestão de expectativas nas redes sociais

Lembram-se de quando sabíamos muito pouco sobre a vida dos outros? Quando não víamos fotografias de todas as refeições, nem sabíamos, em tempo real, se alguém estava de férias, a trabalhar ou a descansar? Existia um certo encanto nessa distância. As novidades chegavam com tempo, num café ou numa conversa ao vivo. Sabíamos apenas o essencial, e, muitas vezes, isso bastava. Hoje, basta abrir uma rede social para sabermos quase tudo sobre quase todos.

As redes aproximam-nos, permitem partilhar momentos, manter ligações com quem está longe e criar oportunidades de trabalho. Mas essa exposição constante traz consigo novos desafios que se tornam ainda mais evidentes para quem utiliza as redes sociais como parte da sua atividade profissional. A forma como se comunica online pode reforçar a confiança dos outros, mas também pode enfraquecê-la.

Quando o perfil pessoal se mistura com o profissional, tudo o que se publica passa a ter um peso diferente. Um momento de lazer partilhado numa altura em que há um trabalho por entregar pode ser mal interpretado. E, muitas vezes, é mesmo. Não por malícia, mas porque quem espera começa a procurar sinais. No online, os sinais estão por todo o lado, mesmo quando não os damos de forma consciente.

Partilhar o dia-a-dia pode ser uma forma legítima e até boa de mostrar autenticidade. Humaniza, aproxima, cria empatia. Mostra que, por trás do serviço ou produto, está uma pessoa real, com vida própria, alegrias e rotinas. Mas quando alguém está à espera de uma resposta, de uma entrega, ver esse lado mais pessoal pode gerar desconforto. Porque há uma expectativa por cumprir. E, quando o silêncio é digital, mas a atividade é visível, instala-se facilmente a dúvida: será que se esqueceram de mim?

Curiosamente, quem sente esse desconforto raramente o expressa de forma direta. Não comenta, não questiona, não expõe a sua frustração nas redes sociais. Mantém-se em silêncio, com receio de comprometer a entrega do trabalho ou de prejudicar a relação profissional. É um silêncio estratégico, mais comum do que se pensa, e que tem sido estudado há décadas. A Teoria da Espiral do Silêncio ajuda a explicar este comportamento. Segundo esta teoria, quando as pessoas sentem que a sua opinião pode ser mal recebida ou causar tensão, tendem a calar-se para não se sentirem prejudicadas, especialmente em espaços públicos. E nas redes sociais, onde tudo fica guardado, visível e partilhável, esse efeito intensifica-se.

É verdade que há quem critique abertamente, que exponha insatisfações em comentários. Mas há também quem prefira uma forma mais subtil de comunicação. Um “gosto” deixado com intenção, um emoji num story... Pequenos gestos que, para quem os faz, são formas de lembrar: “estou aqui e continuo à espera”.

Gerir uma presença digital vai muito além de publicar boas fotografias e legendas apelativas. Implica sensibilidade e consciência de que, do outro lado do ecrã, há pessoas com expectativas. Separar ou equilibrar o que é pessoal e o que é profissional ajuda a evitar mal-entendidos. Não se trata de esconder a vida pessoal, mas de comunicar com responsabilidade. Às vezes, basta adiar uma publicação ou responder a tempo para demonstrar respeito. Porque, mesmo em silêncio, as pessoas estão atentas. E, por vezes, é precisamente esse silêncio que fala mais alto.