Os comentadores dos debates eleitorais
Torna-se por demais evidente que quem lá está não consegue despir a camisola que defende
Os resultados das audiências dos primeiros debates televisivos demonstram uma quebra de interesse relativamente a eleições anteriores. A isso não será alheio o facto de as pessoas estarem cansadas de eleições e de conhecerem perfeitamente os protagonistas uma vez que há sensivelmente um ano atrás eram exatamente os mesmos. Não será por isso agora que mudarão as suas opiniões nem que alterarão de forma substancial as suas convicções ou posicionamento (seria estranho se o fizessem). É por isso no fundo uma sequela sem grande interesse, alimentado por casos e casinhos e por uma governação que pouco tempo teve para demonstrar o que vale, ficando sempre um pouco a dúvida se as consequências das medidas mais fraturantes serão positivas ou negativas. A verdade é que fomos novamente enviados para as urnas, contra a vontade da maioria da população (acredito eu).
Para além de já conhecermos as ideias e o que pensam os lideres partidários, o pós-debate, em que diversos comentadores analisam, opinam e dão notas tipo programa de talentos musicais acaba por desacreditar e desvalorizar ainda mais o que se passa no frente a frente. Já sabemos que a televisão é hoje em dia entretenimento puro e tudo é feito em função das audiências mas não deixa de ser estranho que todos os canais escolham os mesmos formatos e não procurem ser criativos ou diferenciadores. Obviamente que os critérios editoriais só dizem respeito aos mesmos mas é tão intensivo e exaustivo que torna-se maçador. Mas há um problema maior no meio de tanto comentário e pontuação. É que torna-se por demais evidente que quem lá está não consegue despir a camisola que defende e isso torna-se irritante para quem está a ver. Quem está a assistir a estas análises está à espera de uma análise independente e construtiva mas o que recebe é uma visão toldada pelas convicções dos comentadores.
Quando assistimos aos programas televisivos noturnos sobre futebol já sabemos que há um que é do Benfica, outro do Sporting e um terceiro do Porto. A maior parte deles até tem grafismos com as próprias cores dos clubes. Por isso é para nós perfeitamente natural dar o desconto a quem está ali a falar. Porque assume que é de uma determinada cor e que por isso terá sempre a tendência para defender os seus interesses. Podemos achar que uns são mais facciosos que outros, que uns não admitem o obvio e chegam a ser ridículos nas análises tal é a distância que os separa da realidade e do que uma pessoa comum é capaz de descortinar. Mas eles não escondem que defendem aquela bandeira e por isso não se pode propriamente levar a mal, a paixão tem destas coisas, muitas vezes faz-nos ver as coisas de forma diferente ou ver aquilo que queríamos ver e não o que se passa e está à vista de todos. No caso dos comentários dos debates não é assim. As pessoas convidadas não assumem a sua ideologia e não nos é passada essa informação. A maior parte nem é de partido algum o que torna a compreensão ainda mais difícil de entender.
É por isso que quando vemos as notas dadas pelos mesmos sentimos que estamos a ser enganados. E ninguém gosta de ser enganado. Seja de direita ou de esquerda não está aqui em causa. Quando nós assistimos a um debate formulamos a nossa própria opinião, percebendo mais ou menos do assunto conseguimos entender quem esteve melhor, quem explanou de forma mais convincente o que defende, quem não esteve nos seus dias. Depois vemos as notas e ficamos estupefactos, de certa forma até revoltados. Essa revolta pela injustiça das pontuações acaba por funcionar ao contrário no espectador. Dá uma espécie de sentimento solidário com quem foi prejudicado de forma evidente. E as pessoas tendem sempre a criar uma certa ligação com quem é “coitadinho” com quem é prejudicado. É tão obvia a narrativa e a falsidade que já é motivo de gozo e isso acaba por tornar o conteúdo pouco sério e apelativo.
P.S. Desejo uma Páscoa feliz a todos os leitores do Diário.