É obrigatório ter curso de nível superior para integrar o executivo do Governo Regional?
A pasta da Economia do novo Governo Regional ficou a cargo do líder do CDS-PP, José Manuel Rodrigues, que foi presidente da Assembleia Legislativa da Madeira desde 2019. ‘Zé Manel’ é o único membro do XVI Governo Regional da Madeira sem licenciatura.
Há quem conteste a inclusão de José Manuel Rodrigues, o ex-presidente da Assembleia Legislativa da Madeira, no elenco do novo Governo Regional. Não por razões partidárias, mas de competência pelo facto de ‘Zé Manel’, como é tratado pelos mais chegados, não ser licenciado, ou seja, não ter curso de graduação do ensino superior.
Esta quarta-feira, na sua primeira intervenção oficial após a tomada de posse do XVI Governo Regional, o novo Secretário Regional da Economia esteve em Santa Cruz, por ocasião da cerimónia de entrega de prémios dos projectos RS4e, no Hotel Vila Galé.
‘José Manuel Rodrigues nega despesismo na sua gestão’ foi o título da notícia com a reacção de Rodrigues, à margem da cerimónia, às recentes acusações de despesismo na Assembleia Legislativa. Não tardaram os comentários na plataforma digital do DIÁRIO.
A leitora Cláudia Abreu reagiu com a seguinte observação crítica dirigida a José Manuel Rodrigues: “Não tem habilitações académicas para o cargo que ocupa. Não entendo como um senhor sem habilitações ocupa uma pasta de tamanha importância”.
Mas será obrigatório ter curso de nível superior para poder integrar o executivo do Governo Regional?
Para tirar a limpo consultados a Constituição da República e o Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, sendo esta última uma lei ordinária com valor reforçado que estrutura a organização e o funcionamento das instituições - órgãos de governo próprio -, neste caso, na Região Autónoma da Madeira.
Feita a análise à Constituição e ao Estatuto Político-Administrativo, que estabelece os princípios e normas que regulam o Governo Regional enquanto órgão superior da administração pública regional, conclui-se que para integrar o executivo do Governo Regional da Madeira, não há habilitações académicas específicas exigidas por lei. Em parte alguma está definido que os membros do Governo Regional devem ter curso de nível superior, nomeadamente, licenciatura.
A formação académica é desejável mas não é exigida por lei. E neste particular, ‘o Sr.’ José Manuel de Sousa Rodrigues é a excepção na composição do XVI Governo Regional. É o único dos governantes ‘sem canudo’. Todos os restantes têm habilitações académicas de nível superior. Nomeadamente licenciatura, sendo por isso designados por ‘Dr.’, à excepção do novo Secretário Regional de Equipamentos e Infraestruturas, o ‘Eng.º’ Pedro Rodrigues.
Fica assim bem patente que embora seja desejável que os membros do Governo Regional tenham uma formação académica relevante para o cargo que vão ocupar, nomeadamente licenciatura em áreas como o Direito, a Economia e as Engenharias, este não é um requisito obrigatório para se ser membro do Governo Regional.
Embora importante, a formação académica não é o único critério para a selecção dos membros do Governo Regional. A experiência política, a capacidade de liderança e a habilidade de trabalho em equipa também são factores importantes/determinantes.
Embora sem curso de nível superior, José Manuel Rodrigues tem um vasto e invejável curriculum.
Nascido a 13 de Julho de 1960 em Santa Maria Maior, no Funchal, ‘Zé Manel’ é jornalista dos quadros da RTP, deputado na Assembleia Legislativa da Madeira, Presidente do CDS/PP-Madeira e do Conselho Económico e Social do partido, e actualmente é o Secretário Regional de Economia. Iniciou a carreira jornalística em 1978 no ‘Jornal da Madeira’, integrou redacções de vários órgãos de comunicação social e foi correspondente na Madeira do ‘Diário de Notícias’ de Lisboa e do ‘Independente’. No início da década de 90 assume a presidência da delegação regional do Sindicato dos Jornalistas e nesse âmbito dinamizou a iniciativa ‘24 horas por Timor’ que teve repercussão nacional, logo a seguir ao massacre no cemitério de Santa Cruz, em Díli.
Como fundador da Associação Presença Feminina da Região, desempenhou vários cargos nesta organização de apoio às mulheres entre 1995 e 2006. No plano político tem um longo percurso que começa em 1976 como primeiro presidente da Juventude Centrista da Madeira. Em 1986 foi um dos Mandatários jovens da candidatura de Freitas do Amaral à Presidência da República. Em 1995, encabeçou a lista do CDS/PP pelo círculo eleitoral da Madeira nas eleições legislativas nacionais. Nas regionais de 1996 garante a eleição de deputado à Assembleia Legislativa da Madeira, sendo um ano depois presidente do CDS/PP-Madeira. Foi eleito, sucessivamente, deputado em 2000, 2004, 2007, 2011, 2015 e 2019 para a Assembleia Legislativa da Madeira, várias vezes líder parlamentar, e integrou as mais variadas Comissões Especializadas, tendo sido Vice-Presidente da Comissão para a Reforma do Sistema Político na Legislatura 2015-2019. Em Setembro de 2009 é eleito deputado à Assembleia da República, renovando o mandato nas eleições antecipadas de Junho de 2011. No Parlamento Nacional desempenhou as funções de Vice-Presidente da Direcção do Grupo Parlamentar do CDS, Coordenador do partido nas Comissões de Educação e Assuntos Europeus e membro da Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações e da Comissão de Revisão Constitucional, onde apresentou em 2010 um Projecto de aprofundamento da Autonomia. Ficou conhecido por ter votado contra o Plano de Ajustamento Financeiro para a Madeira em 2012 e contra o aumento de impostos para a Região. Foi, ainda, autor de inúmeras propostas sobre assuntos regionais, donde se destaca a proposta de extensão do subsídio de mobilidade ao transporte marítimo, aprovada por unanimidade.
É autor de um extenso relatório sobre os problemas de mobilidade das Regiões Autónomas, com origem num Grupo de Trabalho a que presidiu na Assembleia da República. Em Outubro de 2012, renunciou ao mandato e assumiu o lugar no Parlamento Regional, por não concordar com o aumento da Taxa Social Única para os trabalhadores, que o então Ministro das Finanças, Vítor Gaspar, queria impor no Orçamento do Estado para 2013, e que veio a ser retirada. Em Outubro de 2013, foi eleito vereador para a Câmara Municipal do Funchal. Em 2024 presidiu à Conferência das Assembleias Legislativas Regionais Europeias – CALRE. De 15 de Outubro de 2019 a 10 Abril de 2025 José Manuel Rodrigues foi Presidente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira.
Estranho seria o agora ex-presidente da Assembleia Legislativa da Madeira, como primeiro órgão de governo próprio, ser agora ‘barrado’ de poder exercer cargo do executivo do Governo Regional da Madeira por insuficiente formação académica.
Sobretudo após assumir o cargo de presidente da Assembleia Legislativa da Madeira a 15 de Outubro de 2019. Em toda a história da democracia madeirense, o cargo de presidente da Assembleia Regional foi sempre ocupado por personalidades do PSD. No entanto, em 2019 e pela primeira vez, o PSD não conseguiu a maioria absoluta e foi forçado a fazer uma coligação com o CDS-PP. Além de ter ficado com duas secretarias-regionais o CDS exigiu ter o líder do hemiciclo, com José Manuel Rodrigues a quebrar a hegemonia dos social-democratas no principal órgão de governo próprio.
Rodrigues é também o actual presidente do CDS-PP Madeira, cargo que reassumiu num passado recente depois de 18 anos consecutivos (entre 1997 e 2015) de liderança do partido na Região.
Exemplos de políticos que ocupam cargos de grande relevo sem serem sequer licenciados, há muitos. Por exemplo, John Major, primeiro-ministro britânico entre 1990-97 não tinha curso superior.
Em Portugal, Armando Vara, Maldonado Gonelha e António José Seguro (agora licenciado) ocuparam pastas ministeriais sem terem qualquer licenciatura.
Na Madeira e durante os governos de Jardim pelo menos dois dos secretários não tinham formação superior: Bazenga Marques e João Carlos Abreu.