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Crónicas

É por isto que não muda

Num tempo em que a exclusão e a polarização crescem, o que importa é escolher entre o medo e o amor

Fazer as coisas da mesma maneira e esperar resultados diferentes é o principio da loucura. A citação é atribuída a Albert Einstein e ouvi-a pela primeira vez há muitos anos, quando conversava com o meu Professor Stephen Gilligan, sobre a origem da dificuldade que é transformar estilos parentais. Ao longo dos últimos 15 anos, altura em que comecei a criar a parentalidade generativa, tenho escutado, de muitas mães, muitos pais, sobretudo de famílias que praticam uma educação autoritária e gostavam de experimentar a parentalidade generativa, frases como: “gostava muito, mas tenho medo de não conseguir, Rita!”; “tenho medo que piore!”; “tenho medo de falhar.” Enquanto jornalista ouço também, noutros contextos. 

É o medo de falhar, que nos impede de tentar fazer diferente. A neurociência já revelou há muito, que o nosso cérebro está desenhado para a sobrevivência. Ora, para sobreviver, o cérebro precisa de duas coisas: evitar as ameaças e procurar recompensas.

O desejo do cérebro é prever as coisas. Ele gosta muito de informação e de certezas. Por isso, todas as mudanças que envolvem incerteza, que impedem os nossos cérebros de fazer aquilo que gostam de fazer – previsões – são, naturalmente, e com a intenção positiva de nos proteger, evitadas. Os estudos sugerem que vivemos mais confortavelmente com a certeza sobre um resultado negativo do que com a incerteza.

E a mudança é ainda mais difícil quando levamos a parentalidade muito a sério (fala de muitas necessidades nossas, submersas). E há mais, segundo a neurolinguística, a forma como fazemos uma coisa, fazemos todas as outras. E a educação tradicional ainda insiste em focar no erro. Basta observarmos: a que cor são corrigidos os testes? A encarnado. Em 10 perguntas, erramos 3, esquecem-se as 7 que estão certas e dão-nos uma avaliação formada a partir daquelas que não acertámos, emitindo, rapidamente, um atestado de incapacidade. O foco apenas no resultado, não está atento ao processo, à dedicação, ao que fizemos realmente bem, ao que ainda pode ser melhorado, e como. 

Se é verdade que estamos mais conscientes, também não é menos verdade que ainda estamos longe de guiar as nossas crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos numa perspetiva de autoconhecimento e de encontrar respostas em nós. A mensagem que é continuamente emitida é a de que o outro precisa de mudar para caber, para ser. Isto é como continuar a dar alface à voz crítica que nos habita.

Quem cresce a ser notado pelo erro, cria uma imagem distorcida de quem é e das suas capacidades e: desiste. Porque acredita que não é suficiente, que não faz nada que preste, que é sempre a mesma coisa, que não merece, que não vale a pena. E deixa de tentar. Confunde-se com o próprio erro. A sua autoestima fica frágil e altamente permeável. Torna-se um eterno insatisfeito, na busca insaciável de validação. Sim, procura constantemente validação externa, porque não a encontra dentro de si próprio.

São muitos os estudos (e é fácil notar pela nossa experiência pessoal!) que propõe que o que se torna um problema não é tanto a criança fazer ou não fazer determinada coisa, é sim nós nos focarmo-nos nisso.

Outro problema com que muitos pais se deparam é o facto de viverem um conjunto de crenças e valores que os levam a esforçar-se para educar de uma forma diferente. E, por vezes, essa obsessão com a educação vem do facto de não conseguirem ser aquilo que estão a tentar que os filhos sejam. 
Tudo isto torna as mentalidades rígidas. Sem flexibilidade. Ou seja, mais resistentes às mudanças, quando necessárias. Mais próximas do medo de falhar.

Crescemos a acreditar que a principal missão dos pais é ensinar, corrigir e moldar os nossos filhos. Ao longo do caminho, percebemos que a parentalidade também é uma oportunidade poderosa de autodescoberta e crescimento pessoal. E essa, implica errar para então, acertar. É assim que entendemos, de uma vez por todas, que a parentalidade (a base de tudo na vida) é sobre reeducarmo-nos, é sobre conexão. É sobre conectar antes de corrigir.

Quando percebemos que só errando é que se acerta, que só desmontando o processo do erro e inserindo passos da fórmula de quando acertamos é que avançamos, que o erro é um detalhe particular e generativo do crescimento, é que tiramos o peso de cima das nossas crianças (de todos, na verdade!). Um peso que limita (desumanamente) o seu (nosso) potencial de desenvolvimento.

Transformar a mentalidade fixa, rígida, numa de expansão e crescimento, é perceber internamente que somos seres em evolução constante, e quanto mais treinarmos, mais expandimos. Mais longe vamos. Depende das nossas intenções e dedicação.

É urgente mudar a relação com o erro. Errar é aprender! Thomas Edison falhou mais de mil vezes antes de finalmente, inventar a lâmpada elétrica. Edison encarou essas tentativas como etapas essenciais para o sucesso. Cada erro e cada tentativa, traz lições importantes. 

A persistência consciente, aplicada com a estratégia e com os recursos certos, pode transformar erros repetidos, em leveza, sem competição e numa bonita história de sucesso.

Quando olhamos pela lente da parentalidade generativa, quando tentamos e falhamos, até acertar, caminhamos num trilho que, aos poucos, sem pressas, nos vai oferecendo maior clareza em relação aquilo que está a ser difícil na parentalidade, que é como quem diz: nós! Difícil somos nós, a nossa forma de agir perante certas situações, a dualidade em que mergulhamos, as nossas ideias pré-concebidas (preconceitos) sobre o certo e o errado, a nossa autoestima (por vezes frágil) que gera comportamentos como a dificuldade em lidar com a vergonha, em lidar com a opinião dos outros… Agora, quando praticamos parentalidade generativa, vivemos conscientes dos lamaçais e areias movediças - emocionais ou mentais. E mesmo que tudo corra mal, não faz mal. Tentámos! Voltaremos a tentar, até conseguirmos. E celebraremos muito. Cresceremos muito. Não no final, mas em todo o processo. Com amor.