O laboratório da vida
Jovens ou não, muitos de nós chegámos a experimentar um desporto ou uma atividade através de um simulador, seja isso a voar, jogar golfe, conduzir um bólide de Fórmula 1, ou pisar o solo num mundo alienígena. Hoje em dia, com o desenvolvimento rápido da Inteligência Artificial e do poder de processamento, estas experiências tornam-se cada vez mais imersivas e personalizadas. Os simuladores e as simulações já são imprescindíveis na ciência, indústria, meteorologia e, no fundo, úteis para um sem número de atividades humanas.
Os benefícios das simulações, para além de mero entretenimento, são inegáveis: proporcionam a oportunidade de testar as nossas respostas em diversas circunstâncias em tempo real; através da repetição, oferecem a oportunidade de treinar, aprimorar e preparar as reações; desenvolvem a capacidade para responder discriminadamente perante as mais variadas situações; e promovem o uso do raciocínio crítico e avaliativo.
Este tipo da preparação psicofisiológica ajuda em muitas atividades nas quais o imperativo do “êxito” contribui para o stress e mal-estar do praticante. Uma destas áreas é, certamente, a área das artes performativas e, entre elas, a música. Os músicos normalmente ensaiam e estudam longe do seu público e em condições que diferem significativamente das salas de concerto nas quais se pretendem apresentar. Devido a custos altos e a inacessibilidade geral dos palcos, o treino de muitos músicos está isento de exposição repetida às condições reais da atuação. Assim, acabam por aprender tarde (ou nunca) como lidar com o stress da atuação e com as expectativas dos seus públicos.
Uma iniciativa pioneira neste sentido foi empreendida em 2011 pelo Royal College of Music em Londres, que trabalhou em conjunto com o Conservatório dela Svizzera Italiana, em Lugano, a empresa de design criativo Studiohead de Londres e Skyline Whitespace, uma empresa especializada em estrados modulares. O simulador desenvolvido inclui tudo, desde os espaços “back-stage” (camarins etc.) até ao palco e um público virtual interativo. Recentemente atualizado para o “Performance Laboratory”, que pretende ser o líder mundial na área, foi e está a ser utilizado por milhares de músicos e outros intérpretes, mas também por atletas, empreendedores, executivos de tecnologia e funcionários públicos, desde as Nações Unidas e departamentos governamentais aos CEOs que preparam os seus discursos, para desenvolver e aprimorar as suas competências profissionais.
O laboratório tem dois ecrãs que se estendem do chão até ao teto e dezenas de altifalantes do sistema Meyer Sound Constellation. Colocando o intérprete numa das salas que constam da sua coleção crescente, seja isso Carnegie Hall ou Royal Albert Hall, o programa coloca públicos variáveis, com tosse, barulhos, telemóveis, acolhimento hostil, introduzindo as disrupções que podem acontecer durante o evento, incluindo as alterações da luz no palco e na sala ou introduzindo júris e comissões intimidadores, para treinar para as audições – tudo de modo virtual.
Já o projeto do Imperial College em Londres, em colaboração com o laboratório, serve para aprofundar a pesquisa dos desafios psicofisiológicos da atuação em público. Fazem medições de respostas fisiológicas sob stress e o tempo de recuperação, tal como apontam para comportamentos indicados para melhorar as respostas. Desde a preparação antes da atuação no camarim, a entrada para o palco, a atuação em si e as interações do público – tudo pode ser experienciado e treinado através deste programa holístico.
Efetivamente, a preparação para o “palco” é crucial para qualquer situação de exposição pública e a qualquer nível ou idade – veja-se apenas quanto é que se preparam os políticos para os debates públicos antes das eleições, a não falar das entrevistas de emprego e exames de toda a espécie. E quanto mais crescemos, maiores e mais desafiadores os palcos, mas, proporcionalmente, tanto mais se torna fácil começando essa preparação já em criança. Um exemplo disso são as audições escolares para os alunos de música (e não só) e concertos/eventos promovidos pelas escolas – palcos nos quais os mecanismos de autoconsciência e autocontrole estão a ser aprendidos sob orientação dos pedagogos experientes.
E essas experiências são uma mais-valia para toda a vida e todas as suas situações imprevisíveis, pois permitem encarar esses momentos com mais autoconfiança e preparação, diminuindo o stress e contribuindo para o equilíbrio mental.
Houvesse um “Performance Laboratory” para todos nós…!