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O bom, o mau e os pequeninos

Em Portugal, a saúde virou palco para a hipocrisia ideológica. O mesmo governo que tudo fez para acabar com as parcerias público-privadas no Serviço Nacional de Saúde, decidiu contratar 300 médicos cubanos para trabalhar em Portugal.

A questão não se prende, como é óbvio, com a nacionalidade dos profissionais de saúde, mas sim com os termos negociados pelo governo português. Da última vez que Portugal ensaiou um outsourcing da saúde, os médicos cubanos custavam mais de 4 mil euros por mês, mas só recebiam cerca de 20% do salário total. A maioria do valor era entregue a uma empresa pública cubana que faz dos médicos mercadoria para exportação por todo o mundo. A ideologia permite negociar com ditaduras, mas com os privados nem pensar!

O bom: As Navegadoras

Esta crónica não é sobre futebol. Não é sobre igualdade de género, linguagem inclusiva ou sobre como a participação num Mundial de futebol abriu novas fronteiras para as mulheres portuguesas. Estou certo que teremos, como tivemos nas últimas semanas, quem encontre avanços civilizacionais extraordinários na caminhada das jogadoras portuguesas até à Nova Zelândia. Terão, não tenho dúvida, toda a razão e as jogadoras todo o mérito dentro de campo. Mas a ânsia de fazer da seleção nacional feminina a porta-estandarte de todas as batalhas, sonhos e conquistas das mulheres portuguesas é torná-las em coqueluches de quem continua a olhar para o futebol feminino como uma curiosidade. Uma caricatura do futebol a sério. O que esta qualificação prova, e o que este Mundial confirma, é que não é. Por isso, quem quer tornar o triunfo das navegadoras numa conquista de género esquece-se da principal vitória de cada uma delas. À distância de um hemisfério, Portugal deu-lhes a mão. À Telma, à Jéssica, à Kika, à Ana e a todas as jogadoras. Sem condescendência. Sem paternalismo futebolístico. Não porque eram mulheres, mas simplesmente porque nos representavam. Não como bibelôs a adornar a relva, mas sim verdadeiras atletas de alta competição. Pediram-lhes uma vitória frente à Holanda e, de seguida, um milagre perante os Estados Unidos. Não foi preciso. Afinal, o milagre foram elas.

O mau: Pedro Sánchez

Após a noite eleitoral espanhola, todos os partidos cantaram vitória. Curiosamente, nenhum conseguiu formar governo. A dissonância entre quem se diz vencedor mas não reúne uma maioria de governo, impõe um ponto de ordem. O PP, de Alberto Feijóo, conquistou o maior número de votos nas urnas. No entanto, nem com o apoio do Vox, atinge os 176 deputados necessários para aprovar um governo à primeira volta. É aqui que a política ultrapassa a aritmética dos votos. Pedro Sánchez, atual primeiro-ministro e presidente do PSOE, perante a derrota – menor do que se esperava, é certo – proclama a existência de uma maioria social, alicerçada nos partidos à sua esquerda, para formar governo. Ora, sendo os partidos do centro incapazes de reunir sozinhos 176 deputados, a governabilidade espanhola parece invariavelmente entregue a partidos regionais e a extremismos de esquerda e de direita. Será assim mesmo? Creio que não. Primeiro, embora a eleição seja de deputados e não de um primeiro-ministro, isso não permite a terraplanagem dos resultados eleitorais, muito menos a sua reformulação num lamentável exercício de contas de mercearia parlamentar. Segundo, quem passa a vida a diabolizar os extremos partidários tem a obrigação política de impedir que a governabilidade fique refém dos extremismos que tanto criticou. O acordo partidário nestes dois princípios levaria ao compromisso de que o partido vencedor teria, sempre, a formação de governo assegurada. O problema é que para Sánchez a cadeira de primeiro-ministro permite tudo. Desde reinventar resultados eleitorais até negociar com os herdeiros políticos da ETA.

Os pequeninos: Juntos Pelo Povo - JPP

Dizem que os pequenos gostam de se fazer grandes, mas por mais que tentem não conseguem fugir à sua verdadeira dimensão. Parece ser esse o destino do partido Juntos Pelo Povo, depois da pública zanga familiar – o regresso à pequena política. A trama fratricida tem todos os ingredientes de uma tragicomédia de qualidade duvidosa. O irmão matreiro que prepara, na sombra dos bastidores partidários, uma cilada ao irmão ufano. O grupo de conspiradores interesseiros que facilitam pelo voto, e em claro benefício próprio, a traição entre irmãos. A mulher do irmão traído que distribui acusações de ingratidão em praça pública. O fiel espadachim que jura lealdade ao chefe traído. A assessora que está solidária com o irmão traído mas, como beneficiária direta da traição, encontra justiça na conspiração. Até não faltou a eliminação apressada do nome do irmão traído da história do partido que o próprio fundou. É sempre chocante a crueza dos diretórios partidários. Especialmente quando os seus membros se afirmam como especialmente impolutos, alérgicos a qualquer cargo político, que apenas ocupam por sacrifício democrático. Todos homens e mulheres numa missão totalmente abnegada em prol da população. Afinal, está visto que se juntaram, não pelo povo, mas por eles. Só por eles. É assim a pequena política e são assim os políticos que a praticam. Pequeninos.