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O sono e o governo

Certa vez fui a uma consulta para saber porque não dormia, ou melhor, porque dormia mal e pouco. Com tudo o que isso significava de negativo para a saúde física e mental de um indivíduo.

Fui aconselhado a fazer um teste. Disfarcei-me com adequado equipamento na cabeça e fui para casa conduzindo. Quem me dizia adeus, sobretudo nos semáforos, era mais por medo do que por me terem reconhecido.

Como o prognóstico “só depois do jogo” como diria o célebre defesa direito, esperei pelo dia seguinte, regressei para que me tirassem a máscara e fiquei uns dias a aguardar os resultados.

Piores não podiam ser. O sono tem três fases, fiquei a saber. E eu, pobre coitado, nunca chego à terceira. Logo, nunca atinjo o sono profundo. Não sonho, nem tenho pesadelos. Ou são raros. Depois de muitas tentativas falhadas finalmente (ou até ver) encontrei a fórmula que me ajuda a dormir. Mas continuo sem sonhar. Também já não tenho idade para isso. Só sonho acordado, o que não deve ser a mesma coisa.

Ora, creio que este perturbante transtorno tem início no extenso período que pertenci ao governo. Sempre foram 15 longos anos. No exercício daquelas funções executivas temos um dia que acontece uma alegria para trinta que são só chatices. Umas atrás das outras. Que se transformam num turbilhão de dificuldades, tornam mais penosos alguns dias e, consequentemente, mexem com a nossa vida, saúde e futuro.

Estranho aqueles que, depois de passarem pelo desempenho de tais responsabilidades, se por muito tempo, sintam amargura na hora da saída ou vontade de voltar a fazê-lo. Não alcanço. Há coisas que não se devem repetir e se há “lugares” para onde, pura e simplesmente, não se deve voltar são esses.