>
Artigos

A mensagem falhou

Os especialistas, sobretudo os da OMS, fazem (ou fizeram) mal em fingir ter certezas e em sugerir recomendações que se vêm a constatar serem contraproducentes passados poucos dias

É desesperante e exasperaste a forma como ao longo destes últimos meses temos ouvido alguns dos peritos sobre a covid-19. Como já fiz questão de frisar, por diversas vezes, acredito que Portugal conseguiu ter um bom desempenho no combate à pandemia, resultando, acima de tudo, da responsabilidade e sentido cívico da grande maioria dos portugueses. A duas velocidades é certo, melhor por exemplo na Madeira do que em certas regiões do continente, ainda assim foram vencidos os obstáculos e ultrapassados os maiores receios, que eram no essencial não deixar escalar esta doença ao ponto de atingir uma sobrelotação do nosso Serviço Nacional de Saúde. O que não era à partida assim tão simples, uma vez que ao nosso lado temos a vizinha Espanha, um dos países mais atingidos, mas também pelo facto de termos uma das populações mais envelhecidas da Europa e uma alta percentagem de comorbilidades, que para quem não sabe, é quando alguém tem mais do que uma doença relacionada ou quando certo tipo de doenças deixam o nosso corpo mais susceptível para soçobrar perante outras que possam surgir.

O problema é que, olhando para o início e para as declarações de quem entende e decide, como a Organização Mundial da Saúde, a nossa DGS (embora esta um pouco a reboque da primeira) ou os Estados, vemos uma confusão permanente e contradições a mais em tão curto espaço de tempo. Bem sei que estávamos perante um vírus desconhecido, mas assim sendo, não teria sido mais prudente evitar tantas certezas e e constantes desmentidos? É que quem juntar todas as declarações parece estar perante um filme de comédia. Não contagia facilmente de pessoa para pessoa para, altamente contagiante entre seres humanos. Tira a máscara, mete a máscara. Permanece em superfícies e objectos 7 dias, 15 dias e afinal são só 7 minutos. Usa Ibuprofeno, não usa, que faz pior. Ventiladores salvam mas também matam. Não saiam de casa mas para certas comemorações o vírus não importa. Não fecha fronteiras, afinal fecha tudo. É uma gripezinha, não, não, é altamente mortal, não, não, é mais ligeiro. Preparem-se para uma segunda vaga, provavelmente mais forte que esta, não, afinal não vai haver, espera, vai, vai, mas não tem data marcada.

Enquanto isto, as pessoas andam preocupadas e perdidas porque já não sabem em quem acreditar. Os próprios virologistas, epidemiologistas, médicos de saúde pública, e tantos outros cientistas que apareceram na televisão a comentar o assunto nunca se conseguiram entender sobre a matéria. Não deve por isso surpreender que as pessoas tenham tomado decisões extremadas e que ninguém se entenda. Momentos em que parece que isto não passou de uma gripezinha e andámos aqui todos enganados, a outros em que era um salve-se quem puder que fez esgotar o papel higiénico dos supermercados. Diante da ignorância em relação ao comportamento inicial deste vírus, eu acredito que fosse melhor e até mais racional pecar por excesso de precaução (a saúde das pessoas sempre primeiro).

Os especialistas, sobretudo os da OMS, fazem (ou fizeram) por isso mal em fingir ter certezas e em sugerir recomendações que se vêm a constatar serem contraproducentes passados poucos dias.

Se passámos à segunda fase é tempo de nos transmitirem a confiança necessária para recuperarmos rapidamente a normalidade. O Mundo precisa de perder o medo. De mensagens claras. Este desconfinamento tem-se revelado uma verdadeira trapalhada, com incoerências absolutas que vão ao cúmulo de estabelecer a abertura total dos lugares num voo, mas continuam a limitar a 50% os lugares nos restaurantes. Com o desenvolvimento da nossa sociedade teria sido expectável que a evidência da ciência servisse para nos transmitir respostas mais concretas e assertivas sobre as medidas a tomar. Uma noção mais correcta e credível da realidade. Talvez daqui a umas gerações se olhe para a forma como o Mundo tratou do problema com gozo e estupefacção. Por agora o importante é não termos receio uns dos outros, cumprir aquilo que deveria já ser cumprido há muito, como lavar as mãos e não espirrar e tossir para cima dos outros. Quem faz parte dos grupos de risco resguardar-se mais, os restantes, é tempo de voltar à rua, de viver a vida.

Fechar Menu